sábado, 27 de fevereiro de 2016

Os aviões da infância


Sentiria o corpo voar

Se não fossem as tuas mãos,

Chegou o momento de cortar todas as amarras,

Sentir a liberdade das palavras nos meus lábios…

Sentir a vontade dos beijos nos meus poemas,

Zarpar em direcção ao nada,

E com o nada digo tudo

Que com o tudo nada digo,

Inventar em mim os aviões da infância

E as coloridas paredes de uma casa abandonada,

Sentiria o corpo voar…

Se não fossem as tuas mãos,

A tua boca,

O teu perfume disfarçado de noite

Antes de regressar a morte,

Sentiria o corpo

Não sentindo o peso da atmosfera alicerçada nos meus ossos de papel,

Não sentido a madrugada suspensa no cortinado…

E lá fora

Os gemidos nocturnos dos incêndios de veludo,

Ir

Caminhar sobre as pedras esquecidas pela tempestade,

Comer os livros ainda não lidos

Porque estão mortos sobre a minha secretária,

Sentiria

Se não fossem as tuas mãos

O peso da lua,

Sentiria a claridade do sofrimento

A cada dia percorrido,

A momento desperdiçado escrevendo-te…

Sem sucesso,

Amar-te sem amar

Sentir sem sentir o esplendor do amanhecer,

Às vezes, pareço um menino em busca de uma praia

Com areia branca,

Às vezes, pareço um pedaço de aço atracado a um qualquer porto de mar…

E sentiria

As tuas mãos

No meu peito

Ao despedir-se a tarde.

 

Francisco Luís Fontinha

sábado, 27 de Fevereiro de 2016

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Os muros invisíveis da paixão


Deixaste de me ouvir

E destruíste os muros invisíveis da paixão,

A árvore da madrugada silencia-se

Das palavras da enxada que desbasta a montanha do amanhecer,

Deixei de ter corpo,

Deixei de pertencer aos habitantes desta cidade em ruinas…

Onde habitava desconhecendo o sabor do poema,

Os lábios,

Os beijos prisioneiros dos lábios

E todos os alicerces da tarde em construção…

Morreram como morrem todos os bichos que brincam na minha mão,

Deixaste de me ouvir…, e mesmo assim, vives dentro de um pequeno cubo de vidro,

 

Tens no olhar as fotografias da tristeza

E na boca as sombras da noite,

Deixaste de me ouvir

E ficamos apenas com alguns pedacinhos dos muros invisíveis da paixão,

Caminho sobre a estrada do sonho,

Desenho círculos no peito da areia como se fossem cadáveres sem nome,

E nos meus braços

A felugem argamassa do prazer

Sangrando pelas feridas do abismo,

Fiquei sem apeadeiro

Quando a locomotiva da dor zarpou em direcção ao mar…

E tu, deixaste de me ouvir.

 

Francisco Luís Fontinha

sexta-feira, 26 de Fevereiro de 2016