quarta-feira, 25 de julho de 2012

Os socalcos do cansaço

Cansado desta “merda” toda...
do jantar sobejaram as espinhas de miséria
e a varanda da insónia desdestrói-se sobre os socalcos do cansaço
e cresce em mim a vontade de desistir de todos os sonhos
e de todos os jardins onde me sentei e escrevi com o meu olhar
poemas de “merda” no troco das árvores com inércia e pedacinhos de musgo nos braços
ler
escrever
amar
(foder
nas palavras embriagadas da noite)
e das marés sem luar

(cansei-me das janelas isósceles
e das portas rectângulos sem memória
do seno de trinta graus
ou das tangentes fictícias à meia-noite)

oiço os apitos invisíveis
dos barcos imaginários
que galgam a seara da tristeza
mergulhada no vento da noite escura

cansado
cansado do jantar
cansado
cansado do amor das palavras
cansado
cansado dos livros que adormeço
cansado
cansado dos livros que leio
e dos cachimbos
cansado
cansado da vergonha
de ser um miserável ou um fantasma sem cabeça

quando os barcos de verdade
regressam do banco de jardim frente aos correios (já falecido)
e trazem nos olhos as cerejas da adolescência...

terça-feira, 24 de julho de 2012

Janela triangular

Sobre a almofada do amor
dorme o abandono e a escuridão
voam as palavras de incenso
para a desconhecida mão
em flor
com perfume a silêncio
e vergada nos cortinados triangulares
das tardes de pulsações e desejos
dos lençóis com sabor a haxixe
procura o amor
impregnado de piolhos alquimistas
nos verdejantes lábios do sono

descem as ruas em ruína
com o destino de morrerem afogadas
nas lágrimas da despedida
sobre a almofada do amor
a madrugada com escadas para o sótão da solidão

abro a janela triangular
e arremesso-me de encontro ao vento
e curiosamente
e curiosamente começo a voar

e curiosamente
e curiosamente na almofada do amor
dorme o abandono e a escuridão
da madrugada com escadas para o sótão da solidão...

(voltarei a fumar)

segunda-feira, 23 de julho de 2012

O esqueleto da nuvem de prata

O esqueleto da nuvem de prata
e lágrimas de papel
nos olhos
uns Ray Ban
que lhe davam um certo ar de ajeitado
fazendo-o parecer um esqueleto verdadeiro
de finíssimas famílias
e no entanto
não passava de uma nuvem de prata
com poeira de ossos
e lentes BL...
vivia num mundo inventado

e amava loucamente uma pedra
onde se sentava a olhar o rio
onde passeavam os barcos
e poisavam as gaivotas

e amava loucamente uma árvore
uma árvore de verdade
com coração de verdade
e amor de verdade

e lágrimas de papel.