domingo, 8 de setembro de 2024

A ETAR DE ALIJÓ CHEIRA INTENSAMENTE A MERDA

Sentia-me camuflado dentro deste orifício sem nome

Algumas vezes, não muitas, oiço o som de um piano, oiço também

O estilhaçar de um vidro.

E o disparo de uma espingarda de sono; dispara insónias

Contra as flores do jardim.

Fugiram cinco gajos de uma cadeia de alta segurança e imagino

Se a cadeia fosse de baixa segurança,

Adiante, o poeta tem mais que fazer, não fazer comentários a fugitivos.

E ainda bem que falo em fugitivos, porque às vezes,

Eu mesmo, pareço um fugitivo

Que foge,

Sem saber do que foge.

Que se esconde, sem saber porque se esconde,

Quando se ergue a noite sobre a seara do silêncio.

A loira espiga do desejo, faz lembrar-me as minhas antigas sandálias de couro,

O que eu corria debaixo das mangueiras, o triciclo cambaleando de sono, e algures,

O meu melhor amigo, o chapelhudo.

O rio desiste da minha algibeira, e vai para o mar.

 

Fui assistir ao concerto de GNR, com a Cristina, apenas que foi divinal e adoramos,

Encontrei uma colega de liceu que não via há mais de trinta anos, era muito boa a português e que hoje é professora.

Viemos de Favaios, fomos virar à ETAR, e é um cheiro a MERDA que não se aguenta. Senhores do Município de Alijó, resolvam esta situação rapidamente.

Já não bastava a merda que por aqui há, ainda mais

O cheiro intenso a MERDA da ETAR de ALIJÓ.

 

Regresso aos teus braços, e não sinto raiva, ou outra coisa qualquer. Regresso aos teus braços

E pareço aquele menino cinzento, que vestia calções e calçava umas sandálias em couro; parece que estou a ver o sorriso desse menino.

A mãe desse menino parecia ela também uma menina, de vestido curtinho, subia à mangueira para retirar o meu papagaio que tinha ficado preso. Parece que ainda oiço esse sorriso… quando acorda o vento.

 

Talvez ainda faça amor hoje, ou apenas ficar lá

A ouvir os batimentos do outro.

Hoje não li. Há meses que o não fazia, mas não encontro explicação.

Pincelo a noite com as minhas mãos nos teus seios, mergulho no teu cabelo, oiço o som da tua pele, que me deseja,

Tal como eu desejo o poema, escrito na tua boca.

Beijo-te, abraço-te acreditando que pertences às estrelas do solar,

Quando o meu corpo poisa sobre o teu

Explode de sémen num cansaço de prazer,

O escrever,

Na tua nádega,

Amo-te.

 

Podia já ser dia, podia.

E se não fosse a noite, o que seria

Do dia,

Sem poesia.

O que seria de mim,

Sem ti,

Quando sinto na minha mão

O teu seio cansado

Pela distância de um beijo.

Eu juro por deus, e eu que não acredito em deus, juro que eu não queria escrever, não queria, mas dentro de mim à uma explosão de palavras, de imagens,

De cores,

De ruas,

De lábios,

 

De corpos deitados numa cama. Imagino o Al Berto a ser enrabado pelo amante,

E fico aqui sentado à espera de que o rio, volte do mar,

Novamente

Para a minha algibeira.

 

Quase que não sei quem sou. E podia ser tanta coisa,

Novamente o senhor Álvaro de Campo na sua Tabacaria; e eu imagino-o à janela a ver o Esteves, que fuma.

 

Tirando isso, apenas que o gato que detesto que pertence à minha vizinha,

Anda triste. Sinto-o quando o olho como o sinto quando olho um amigo ou uma amiga,

Que quase,

Não tenho. Tive muitos e muitas, mas hoje

Hoje, nada.

 

Uma e cinquenta. Lá fora há estrelas. Olhei-as enquanto fumei um pequeno charro. Lembrei-me do Gomes; era um tipo muito chato, mas eu gostava e gosto muito dele.

Mas a vida é assim. Os meus melhores amigos, morreram.

Morreu o meu pai de cancro. Quatro anos depois

Morreu a minha mãe,

Também ela

De cancro.

E eu vivo no medo,

Do cancro.

Não suporto a palavra. Nada. Tenho medo.

 

É horrível ficar em pedaços… e que voam nos braços da morfina.

 

(se me ouves, mãe, eu estou bem. Acredita.)

mar em fúria

dentro da parede do silêncio

movem-se as persianas da madrugada

uiva a longínqua manhã encalhada nas rochas do desejo

em vulcões incandescentes

 

abraço

ela abraça electricamente a estrela

pendurada no papel de celofane

ela

abraço entre árvores e pássaros

ela mingua bela flor da manhã

 

ela

em rosas

em chamas na fogueira da noite

à janela onde se ouve o mar

em fúria.

sábado, 7 de setembro de 2024

e ao longe o mar de verdade

Procurei-te entre ruas

e ruelas da cidade

fui ao mar

caminhei sobre a areia preguiçosa da tarde

procurei-te

e não encontrei os versos dos teus lábios

 

procurei-te

e ao longe o mar de verdade

hoje nos teus cabelos loiros (loiros com silêncios de castanho)

no vento

em seara de desejo

procurei-te

e encontrei o teu perfume

embrulhado no teu sorriso

 

fui ao mar

hoje

hoje de verdade.

As cordas do amor

As cordas do amor

que sustentam o teu corpo em delírio

das cordas do amor

onde se vertem os pingos de saliva

dos cortinados em desejo

há uma janela mergulhada no prazer

que absorve todos os corpos da noite

há a noite de constantes alicerces nos teus braços

há janelas nos teus olhos

das cordas do amor

 

todos os corpos da noite

vai

vai a noite em ácido

morrer no aço inoxidável da morte

 

e há um rio

suspenso no teu pescoço doirado

verte-se a manhã num copo de uísque

e no entanto

o teu corpo em cio

desaparece entre as cordas do amor

e os cortinados em desejo

e há um rio

 

e há um rio no teu corpo em cio

que a noite constrói em milímetros pedaços de papel

e há

e há palavras em gemidos nos lábios da maré

 

e há um rio

e o teu corpo

mergulhado em cio

ao pequeno-almoço

 

e há

palavras que gemem

e há um rio

com o teu corpo

nas palavras que gemem

das bocas loucas

da madrugada

um pequeno-almoço em pausa no copo de uísque da manhã...

A boca em silêncios de pedras loiras

Uma chuva de pedras loiras

sobre as sombras cansadas dos invisíveis olhares da noite

vais partir em direcção ao nada

manhã desgovernada

cansada triste a paixão das palavras tontas

na tua doce mão,

 

cansada chuva de pedras loiras

em direcção ao nada

madrugada dos pincéis alimentados pelos desenhos dos espelhos coloridos

perdidamente apaixonados

dentro do cubo de vidro

onde adormecem os teus olhos meus,

 

uma chuva

longa

tonta

deserta

na tua doce mão

a boca em silêncios de pedras loiras.

GNR hoje em Favaios - Alijó


 

A câmara escura do medo

Deixar fluir o silêncio

dentro da câmara escura do medo

cerrar as janelas com os cortinados da solidão

e das paredes pendurados corações

sonâmbulos os homens

quando vão para a guerra do amor

moribundas palavras de cansaço

das tardes tuas mãos em cetim

comboios de esperma

as tuas simples palavras de ausência

debaixo do mar

a sandália de infinitos perfumes de rosa purpura

 

deixar de acreditar no velho mar

e fluir o silêncio

das palavras em delírio desejo

 

o medo das sombras

tuas mãos em cetim semeiam na aurora crepuscular

o medo

das paredes prensadas em papel e cartão e carne teu peito

das amoras com açúcar e leite

das paredes prensadas

os cones de cinza com o sabor a incenso

onde ninguém te conhece

ou deseja

ou espera antes de terminar o dia

numa cama de pensão

no sótão da insónia

 

(deixar de acreditar no velho mar

e fluir o silêncio

das palavras em delírio desejo).