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sábado, 7 de setembro de 2024
terça-feira, 20 de agosto de 2013
Os caixotes magoados
foto de: A&M ART and Photos
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Dir-me-ás que a vida é um número de magia,
conheci um ilusionista (confesso que não é ficção, conheci e
conheço e tenho amizade por ele – Didier Ferreira – e quanto
mais olhava os seus números de magia, confesso, confesso que mais
dúvidas ficavam em mim, e menos percebia do que se passava à minha
volta), e a vida não é mais do que um lindo e belo número de
ilusionismo, um espelho gigante, olho-a e percebo que é tudo uma
mentira, a imagens é ma mentira, os olhos, os olhos... são uma
pegada mentira vestida com tecidos verdes, e os braços, e os braços
também eles, eles
Mentiras,
Caixotes vindo de lá, trazíamos o muito que
tínhamos, que era nada,
Mentiras,
(muitas das vezes servi de cobaia dele na preparação
de alguns dos seus números, e parecendo aos olhos que quem nos via,
eu, eu um parvalhão nas mãos de um verdadeiro artista, confesso que
nunca me senti como tal, mas que me irritava o facto de eu não
perceber como aconteciam as coisas... lá isso era verdade)
Os caixotes magoados, desdentados, meio adoentados,
e vertendo um líquido esquisito, que mais tarde fomos informados que
era o líquido da saudade
E coisa eu nunca tinha ouvido na minha curta vida,
“Líquido da saudade?”
És parvalhão, ouvia-o. E hoje percebo que ele
tinha razão,
Eu era mesmo um verdadeiro parvalhão aos olhos do
meu pai, porque como era possível existir um líquido chamado...
“Líquido da Saudade”...
Eu, negro, nasci e cresci negro, eu uma árvore a
que chamavam de mangueira, que às vezes sentia-a chorar, que às
vezes... também eu chorava, quando da sua sombra renasciam os
palhaços do circo, o ilusionista fazia com que as cartas de um
baralho aparecessem na
“Líquido da saudade?”
Os palhaços do circo, o ilusionista fazia com que
as cartas de um baralho aparecessem na minha algibeira, ela sempre,
ou quase sempre, vazia, e lá estava ela, assinada por mim
Pode lá isso ser possível, menino?
Verdade verdadinha... Senhor Anacleto, verdade....
Acredito mesmo, menino Francisco, “Líquido da
Saudade”..., e ainda por cima aparecer na sua algibeira e assinada
por si, consegue prová-lo?
Claro que sim, claro que sim Senhor Anacleto...
ainda a guardo na prateleira juntamente com os meus livros, os
caixotes babavam-se como se fossem caracóis acabados de
confeccionar, e afinal não eram caracóis, e afinal
Quitetas,
E o molho, Senhor Anacleto, Ai nem me fale no
molho... menino Francisco, que saudades..., e um líquido estranho
pingava dos três tristes caixotes que trouxemos, pouca coisa, coisa
nenhuma, e afinal, afinal era mesmo o “Líquido da Saudade”,
Em finas fatias sobre o pão quente de Favaios, e
que coisa, que coisa... Senhor Anacleto, um Líquido verde com sabor
a manga..., talvez pedaços de sombra, talvez... as chuvas quando
adormeciam a terra queimada e ressequida pelo abrasador Sol... e
sabe, sabe Senhor Anacleto?
Não, não o sei menino Francisco, não o sei,
As cartas, as cartas voavam durante a noite e de
manhã apareciam na minha algibeira, vazia, ou... quase vazia, como
sempre, ou com quase nada,
Quitetas.
(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha
Terça-feira, 20 de Agosto de 2013
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