segunda-feira, 16 de abril de 2012

Cansei-me do windows...

blog Cachimbo de Água em destaque

Oceanos desgovernados

Os sonhos
que desperdicei nas manhãs de inverno
as noites de inferno
junto ao mar
inventando barcos e marés
e oceanos desgovernados
os sonhos
que desperdicei quando na madrugada
um candeeiro a petróleo de cerrava
e desaparecia na neblina
cansada
os sonhos
que desperdicei nas mãos da dor
entre palavras e grãos de poeira
e um pedacinho de alumínio me acenava
e entrava em mim
junto à lareira

os sonhos

os sonhos
que desperdicei em todas as folhas de papel
e em todos os livros que li
e em todos os livros que me recuso a ler
porque estou cansado de sonhar
porque estou cansado de sofrer...

domingo, 15 de abril de 2012

E nunca mais desenhei árvores


Consultei as estrelas e os fios de luz ausentes na manhã de domingo, no pulso emagrece um velhíssimo relógio cansado das horas, dos minutos e dos segundos,
lá fora chove, lá fora as acácias em flor perguntando-me,
  • Porquê hoje,
porque hoje é domingo Respondi-lhes secretamente dentro das árvores alinhadas no jardim perdido no oceano, os ramos desertos, as folhas parecendo lençóis pertencentes à noite dos mendigos passeando avenida abaixo em direcção ao infinito, eu mendigo invisível abraçado a um pedacinho de silêncio que sobejou do meu último cigarro, um livro desespera e esconde-se debaixo da janela sem vidros e sem cortinados, olho-me, olho-me e pareço uma montanha que desce as escadas do amanhecer, escondo-me na sombra do rio, e o rio sou eu,
  • Porquê hoje se amanhã é mais um dia perdido nas sandálias do vento, porquê hoje quando amanhã será outro dia, outro relógio de pulso na minha mão, hoje não,
hoje consultei as estrelas e os fios de luz ausentes na manhã de domingo, hoje caminharei para o dia de ontem até evaporar-me como os grãos de pólen nos lábios das abelhas, olho-me, olho um esqueleto perdido nos dias, olho um esqueleto perguntando às acácias Porquê hoje, e ninguém, e ninguém saberá responder-lhes, nem, nem o dia de amanhã, nem tão pouco o dia de hoje, domingo, lá fora chove, lá fora chove e um homem de sobretudo e cachimbo na boca procura desesperadamente o número de polícia inscrito no olhar, batem à porta, e ninguém, e ninguém para a abrir, uma janela sem vidros e sem cortinados,
  • Solta-se da fachada em ruínas que o meu corpo transporta, os alicerces cambaleiam nas pedras desalinhadas da calçada, uma rua chora a partida do homem do sobretudo e cachimbo na boca, e solta-se da cidade um coração sem dono, um coração construído em titânio que procura sem encontrar um número de polícia inscrito no olhar,
e o desejo de ser domingo acorda em mim,
  • Porquê hoje,
(e tanta porcaria que aprendi, desde trabalhar com um computador sem disco rígido, porque ainda não existiam, passando pelo MS-Dos, dois drivers de cinco polegadas e meia em cartão, uma com o sistema operativo e a outra para guardar textos e pouco mais, e os poemas escritos no WordStar perdidos algures no esgoto da noite, C:\dir *.*, c:\del *.Amor e todos os ficheiros com a extensão amor para a lixeira, Lixeira?, qual lixeira..., para o inferno, C:\format a:, C:\move *.* a:\Noite)
e pergunto-me porquê hoje domingo, e digito tree e vejo no espelho todos os arquivos do meu corpo, alguns protegidos C:\Attrib +R francisco.exe, outros, outros desprotegidos e escondidos na algibeira juntamente com os cigarros, juntamente com os vidros e os cortinados da janela...
  • E caí na asneira de desenhar uma árvore, e ouvi da psicóloga,
Está apaixonado,
e nunca mais desenhei árvores.


(texto de ficção não revisto)

Suspiros do coração

Tanta bravura
nos espelhos silenciosos da noite
tanta ternura
nas flores dispersas pela madrugada
tantos rios selvagens
pelos meandros da longitude
e latitude
tantas belas manhãs em delírio
fingindo orgasmos nos lábios da lua...
e eu aqui sentado
a construir barcos de papel
e pétalas de solidão

Tanta bravura
nos espelhos silenciosos da noite

que me cansam
e encantam
os suspiros do coração.

sábado, 14 de abril de 2012

O marinheiro ausente

Pedacinhos de mim
acordam na alvorada

(oiço a voz invisível da tempestade)

as minhas pétalas suspensas no tecto da solidão
quando todos os barcos dormem docente
nos lábios do marinheiro embriagado
no final da tarde
levantam-se as velas de cetim
e todas as luzes do abrigo se encerram como as portas da muralha

o marinheiro ausente
deita-se nas minhas mãos
como uma criança cansada
antes de adormecer

e desce a noite
e eu
e ele
enlouquecemos abraçados à maré


(escrito no Ubuntu)

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Abraço ao mar abraçado

Abraço
Ao mar abraçado
À noite cansada
No meu corpo deitado
Coitado
Eu… à procura da madrugada
Com tudo e sem nada
Finjo adormecer
Invento manhãs no meu jardim
Coitado
Com tudo e sem nada
Triste triste assim-assim…
Viver
Assim-assim
Encostado às árvores dormentes
Que mastigam nuvens de algodão
Sem dentes
Sem coração
Abraço
Sem braço
Ao mar abraçado
À noite cansada
Num barco embriagado
Abraço
Sem braço
Coitado
Com tudo e sem nada
Em círculos na calçada