Come a sopa menino
Come a sopa
Se comeres a sopa em
pequenino
Serás um dia poeta
Ou travesti
Ou puta
Ou outra qualquer coisa,
Serei tudo
Menos puta,
E com muito sacrifício comi
a sopa toda,
Hoje detesto sopa
E detesto ter sido
pequenino.
Sopa de hortaliça
Sopa e sopa e sopa
Com estrelinhas
(estrelinha que te guie e caralhinho que te foda, como dizia um amigo meu
falecido)
Come a sopa meu menino
Come
Come a sopa meu pequenino.
E tive amigos
Amigos que partiram
Amigos que comiam a sopa
Amigos que se perdiam no
caldo
E eu nunca comi caldo.
(felizmente)
Às vezes diziam-me que o
caldo era uma merda
Mais noostan do que
castanha…
E as couves e as batatas
ficavam de ressaca na horta do Alfredo,
Cinco contos de nada
Metade de um grama em
pequenos voos
Uma colher
Um isqueiro
Tanta merda para um caldo
Tanta merda meu Deus…
E às vezes tombavam como
tombam as árvores,
Éramos muitos
Éramos tanto que parecíamos
um exército de zumbis
Uns para cima
Outros para baixo
E outros tantos debaixo
da terra,
Metade de um grama
Um grama e outra metade
Uma noite a olhar as
estrelas
E na outra noite a olhar
o cadáver de um amigo,
(a vida é uma merda,
amigo Fontinha)
Que sim
Que era
Que a vida é uma puta
vestida de negro
Traz um terço nas mãos
E vai à missa ao Domingo…
Ai meu amigo!
Que saudades eu tenho de
ouvir-te a noite toda…
(eras um chato do caralho,
mas eu gostava muito de ti, meu grande amigo)
E sabes meu amigo
Putas não são aquelas que
fodem com todos os gajos…
Putas são aquelas que não
sendo putas
Fodem o juízo e cabeça de
um gajo
E sim
Essas vão à missa ao
Domingo
Confessam-se na sexta-feira
E transportam no peito – Corpo
de Cristo.
Que estejas em paz, meu
amigo.
Em paz, meu grande amigo.
Amém.
Alijó, 18/12/2022
Francisco Luís Fontinha