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quarta-feira, 29 de maio de 2013

As cordas da tristeza correntes de abraços


Pendurava-me nas cordas da tristeza, sentia-me distante das pontes em madeira, algumas já em avançado estado de decomposição, de cheiro nauseabundo, também cansadas, ensonadas, como um esqueleto deformado pelas hélices das vertiginosas flores de Primavera, lá fora caminham pássaros que começam a aprender os primeiros passos, ainda não voam, mas... brevemente... ausentar-se-ão de mim, como se ausentaram milhares de estrelas, como se ausentaram centenas de sonhos, conversa fiada, uma feira de vaidades procurando abrigo debaixo do aquário nocturno da solidão, pendurava-me afinal sem perceber que em vez de cordas, eram correntes de insónia que eu durante o sono prendia ao meu corpo, e sentia-me pesado como rochas em queda livre em direcção ao abismo, abria o postigo e via coisas sem nome, coisas como simples objectos desproporcionais que o tempo encolhe, come, vomita como sendo corpos em aços, em fila, esperando a entrada no auto-forno, e entre cambalhotas e simples anedotas, eu escutava na paciência dos anjos femininos, os pássaros bebés em construções de areia, enquanto os olhava, recordava as aventuras de Fernão Capelo Gaivota, e imaginava-me um dia dentro de uma velha panela com arroz, algum feijão, e de sabor inconfundível a sonho, sonhar quando todas as grandes muralhas que a vergonha deixa das escadas para o patamar do terceiro esquerdo, a varanda cambaleava-se, embriagada pela vodka que os marinheiros Russos tinham deixado sobre os carris dos lençóis depois da ejaculação de palavras, que posteriormente, davam vida a poemas, e dos poemas, crianças, algumas pareciam vampiros com lenços de seda enrolados na cabeça, ouvia-se o desgraçado milagre da chuva de pérolas que todas as noites, sem horário definido, caía desordenadamente em nós
Sabia-te dormindo na cama do quarto encurralado entre a cozinha e a casa de banho, sem janela, e apenas uma porta de pano dividia-nos, quando te deitavas, imaginava-te sobre mim, nua, como um cobertor de lã em noites frias e que tínhamos desistido dos sonhos que esboçávamos conforme a mesma varanda, quando sóbria, deixava que nos sentássemos, com a condição, de, “Proibido Fumar”,
caía desordenadamente em vós os desejos das paralelas linhas azuis que circulavam em redor de um jardim com árvores, e confesso-o, as únicas que até hoje conheci, e que voavam, como os pássaros que eles imaginavam nas pequenas brincadeiras enquanto, os mesmos, tentavam voar com a ajuda dos papás e das mamãs, eles, aqueles que apreciavam o desgraçado milagre da chuva de pérolas que todas as noites, sem horário definido, caíamos diziam eles, caíamos das nuvens incolores que um artista plástico tinha pintado no tecto da cidade dilacerante, uma cidade velha com pessoas vestidas de negro, com pessoas voando como os pássaros, uma cidade...
Há tanto tempo que não sei o significado de cidade, de rio, de mar, de barcos, jangadas e beijos, e abraços, e lanternas mágicas, slides nas paredes encastradas que o velho João tinha deixado por esquecimento numa noite em princípios de Setembro, faziam-se apostas sobre o término do mês, e enquanto uns, os mais optimistas acreditavam que terminaria com flores sobre as mesas de granito, outros, os outros, os não optimistas, apenas que nunca terminaria o desgraçado mês de Setembro, para mim, e se eu mandasse, ainda hoje, ainda hoje
(setembro, o mês dos beijos debaixo das palmeiras)
Era setembro, sem dúvida, alguma, sempre Setembro, sempre... o eterno mês dos beijos debaixo das palmeiras, e a Ilha de Faro parecia um ponto de luz no centro do Oceano,
E de longe, via os aviões estacionados na pista, via o mar, via os barcos, mas esqueci-me da cor dos olhos do Sábado e do nome de cada palmeira junto à marina...
acordou a noite
E voamos entre os lençóis do verdadeiro amor.

(ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha