foto de: A&M ART and Photos
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O só, o castanho cabelo das árvores inseminadas
nas tardes de literatura, vi-a como só, vestida dentro de uma voz
melódica, poética, dizem que o amor vive dentro de um cubo de
vidro, e que durante a madrugada, ele, só, brinca com o hipercubo da
vizinha do rés-do-chão direito, lá fora não há sol desde que
partiram os cortinados de cerâmica, lá fora há apenas vestígios
de lágrimas, uivos e folhas espalhadas pelo pavimento chão em
madeira tratada, de um cubículo mobilado apressadamente, um vulto de
areia grita por mim, diz-me que o amor
Amo-a, menina, amo-a... sabia?
Claro que não, diz-me que o amor é o amor, que a
noite é a noite, que as viagens à lua são as viagens à lua... e
que no quintal dela habitam roseiras bravias, e nos lábios trazem
pergaminhos de poesia, o só, eu, o castanho cabelo das árvores
Amo-a..., sabia?
E cansei-me do sono, das luzes quando desce sobre ti
a noite, cansei-me das retretes e dos mictórios com o letreiro
“não deitar pontas de cigarro”
E cansei-me das estrelas, e dos cinzeiros com
letreiros...
“não urinar dentro do cinzeiro”
E cansei-me dos letreiros... “hoje há caracóis”
Gritas-me
Já não temos caracóis, amo-a menina, se fosse há
coisa de cinco minutos... e como sempre, cansei-me de andar e chegar
atrasado a todas as ruas da cidade, espero-a na paragem do
autoruas...e vejo-a caminhar rapidamente em direcção ao rio, e
sinto as ruas em pequenas corridas, apinhadas de gente, não param,
seguem, rua acima, rua abaixo
Acima
Abaixo o capitalismo,
Não param, buzinam, gritas-me
Amo-o... menino, sabia?
Acima
Abaixo o capitalismo,
Rua abaixo galgando as gruas enferrujadas dos velhos
guindastes de pano, os sapatos pontiagudos apertavam-lhe os dedos do
pé, raio
Gritava ele,
O casaco e a camisa pareciam papel de engenheiros,
transparentes e embrulhados em tinta da china, e uma triste gravata
Acima
Abaixo o capitalismo,
O pescoço torcia-se, vacilava, e uma andorinha
uivava sobre os teus crisântemos seios de névoa adormecida, Acima
Abaixo o capitalismo,
Não param, buzinam, gritas-me
Amo-o... menino, sabia?
Acima
Abaixo o capitalismo,
E respondo-lhe
Se eu soubesse...
E se também eu soubesse...
Não
Não?
Não, nãos escrevíamos estas parvoíces, sem
sentido, como serpentes de uva embebidas em longas e distantes
prisões com grades de ébano, e do Éden Jardim
Não, não o sabia... menina,
Dormem os anjos das coxas encarnadas, vivos, e
gritam, gritam...
E cansei-me dos letreiros... “hoje há caracóis”.
(Não revisto – Ficção)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 10 de Setembro de 2013