terça-feira, 18 de agosto de 2020

Uma janela para o mar

 

Uma esplanada de desejo, em verso, suspensa na nuvem teu olhar, ao longe o grito dos pássaros famintos, o vento alicerça-se no teu cabelo, suspiro, abraço-te quando os ponteiros do relógio indicam a próxima tempestade de areia,

E, sinto,

 

Amanhã, meu amor,

As donzelas flores na mão de Creta,

Na ilha do desejo, onde habitam as esplanadas,

Vêem-se as ondas de espuma do teu sorriso.

Amanhã, meu amor,

Os pássaros famintos de que te falei,

Hoje, dormem na tua mão,

E, são felizes, meu amor.

 

O sítio perfeito para adormecer, pego no cobertor de versos, acaricio o lençol de palavras que te escrevo e, envio, todas as manhãs, antes do Inverno acordar. Sinto o teu corpo embrulhado no meu, pareces uma tela nas sombras da espátula que se entranha no teu púbis e, são felizes, meu amor,

 

Todos os pássaros,

E, são felizes, meu amor,

Todas as rosas do jardim das palavras vivas.

Amanhã, meu amor,

Numa cama de espuma nos vamos deitar,

Brincar com as telas imperfeitas, quase mortas, dos meus textos envenenados,

Antes, pela loucura, hoje, pelo amor.

 

Acorrento-me a ti, escrevo na tua pele, as palavras minhas,

Quão sombras, outras coisas suspensas nos teus lábios,

O sábio, o louco,

Descendo a calçada para a morte.

 

Impressionante, este cubículo de areia, os brinquedos todos alinhados, para que as crianças que somos, brinquem como os livres pássaros, que da montanha masturbam as nuvens de azoto e, cantam.se cantigas de embalar, à noite, quando te despes, o silêncio vagueia no teu cabelo, uma lâmina de desejo, avança de encontro à janela e, todas as clarabóias do prédio choram a tua partida,

 

Amanhã, meu amor,

Os doentes caules das plantas de granito,

São rosas, são pão, são beijos…

Na tua boca de silicatos adormecidos.

Hoje, sinto a maré nos teus seios,

Sei que pertencem apenas a ti, mas também as minhas palavras,

São as tuas palavras, são o sumo da uva, o glorioso vinho,

Que brinca na eira de Carvalhais,

E, não tenho mais pássaros para desenhar, meu amor,

No teu corpo nu, obscuro, simples, assim, como as palavras que escrevo.

 

O dia acorda, as sílabas levantam-se como caracóis despedidos sobre a mesa de jantar, uma vela, recheada de desejo, ilumina-nos, como se fossemos pequenas estrelas em papel, dançando na espuma da noite.

Amanhã, meu amor, todos os candeeiros a petróleo, são, talvez, uma janela para o mar.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 18 de Agosto de 2020

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