O
dia vai longo, meu amor,
É
quase noite e vejo-me enrodilhado de palavras órfãs que se masturbam junto à
paragem do eléctrico,
Dos
poucos livros que me restam apena o “fugitivo” ficou a acompanhar-me,
Dizem
todos que sou louco, meu amor,
Porque
gosto mais de brincar com as palavras do que jogar futebol na areia da parai,
onde em criança, esquecia-me das tardes no Mussulo,
O
destino vingou, das minhas mãos deixou de haver areia húmida e pedrinhas… que
deitava escrupulosamente para um balde em plástico e depois enchia os bolsos de
recordações,
O
teu olhar, meu amor, na ausência das pálpebras incendiadas pela escuridão,
Ao
longe um comboio recheado de crianças e palavras,
Barulhentas,
brincalhonas como são as árvores no Outono, diariamente sinto no corpo o dardo
envenenado dos teus lábios, quando sei perfeitamente que o amanhã não existirá
mais…
Hoje
pertenço-te…, hoje pertenço-te e pertenço-me, somos dois catetos galgando as
tristes paredes de xisto da tua boca, vim de longe, segredei-te sem perceberes
que eu te mentia, nem à hipotenusa consegues chegar… quanto mais a cateto…
Ou
a triângulo rectângulo…
O
dia vai longo, meu amor,
É
quase noite nos meus olhos, e lá fora uma velha cancela geme, os pregos
enferrujados, as ripas entrelaçadas num emaranhado de sombras regressadas do
Além…
Roço-me
no teu corpo e morro.
Abraço-te.
Sem
dizer ou escrever que te amo…
Francisco
Luís Fontinha
Alijó,
11 de Abril de 2017
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