Sim,
tu, mãe,
Quando
dizias que aos três anos de idade já voava...
Eles
chegaram, o caixão ainda cheirava à tinta fresca da manhã, brincava um silêncio
de olhos verdes no vão de escada,
Foder
num vão escada, como fodem todas as palavras do poema...
Sabíamos
que o corpo não pertencia às nossas vidas,
Clandestino,
eréctil nas disciplinas do abismo, o poema esfomeado esperando o amante
suicidado,
amanhã,
amanhã nascerá um cansaço de medo no afastamento dos círculos das cidades
embriagadas,
Sem
iluminação, sem mulheres ou bares para combater a distracção, uns panfletos
expostos na parede xistosa,
Há
Tripas,
O
caixão dançava no centro da sala de estar,
Confesso,
Nunca
tinha assistido à dança de um caixão...
Já
imaginaram o dançar de um caixão?
Há
tripas e...
Moelas,
A
aldeia padece de claridade, existem fios de escuridão nos telhados cansados das
palhotas de algodão,
Enigmático,
eu?
Nunca
tinha assistido à dança de um caixão...
Já
imaginaram o dançar de um caixão?
Há
tripas e...
Moelas,
E
palavras sem coração, sentia-me embriagado nas mãos do amanhecer, sentia-me um
miúdo encostado à sonolência da idade,
A
aldeia em chamas, os campos esbranquiçados na tela do desejo imaginavam canções
de moluscos e alguns grãos de areia,
O
desenho teu na cidade dos alicerces alienados, os bares em combustão, as miúdas
dançando canções de solidão,
Amas-me?
Que
não,
Que
a arte vive e vai morrer no teu olhar,
Ouves-me?
E
palavras sem coração, avenidas nuas, travestidas de machimbombos reumáticos
voando sobre a cidade, eu... eu... adormecia,
Inventava
beijos nos teus braços, a minha primeira paixão, imaginava-te uma flor triste e
cansada, nos circos ambulantes da saudade,
Os
sete orgasmos do Mussulo, a liberdade sobre as palmeiras invisíveis que me
atormentavam, como campânulas de sofrimento, ao deitar, o caixão que dançava
deixou de o fazer, dificuldades com o cachê, dispensa de artistas e cadáveres
de cera, um altar recheado de almas, tantas almas como os versos do sem-abrigo
quando sentado numa cadeira apodrecida de um circo ambulante,
Quero
ser artista, mãe!
Nem
penses..., nem... penses...
Filho
meu não é artista!
Nunca,
Nunca,
mãe?
Os
sete, juntos, e sós, no Mussulo era mais barato, a saia descaída, o soutien
desenhado no peito
E...
Nunca,
mãe?
Nunca,
Nunca
No
peito uma flecha de sémen rodopiando no gelo do ringue de patinagem... o belo,
a dança... e o corpo em pequenas rotações...
Os
teus lábios acorrentados aos meus beijos embriagados pelo desejo, não o sinto,
o vulcão da tua pele, não vejo o sorriso da tua mão, em vulcão, mergulhada nas
palavras que o silêncio desenha na melancolia,
É
falso,
O
dia disfarçado de lápide, os outros destinos rejeitados pelo cacimbo, há uma
fogueira no corpo da sinfonia do amor,
É
falso,
O
falso prazer, a liberdade to TEXAS e Cais do Sodré gingavam na penumbra salgada
do abismo,
O
querido dança?
Fumo,
É
falso,
São
falsas, os textos a beleza e o amar, quando o amar pertence aos clandestinos
eternos sonos dos Narcisos de prata, o pilar central do orgasmo mergulhada
entre duas árvores,
Amar,
amor,
Ao
fundo os homens calcetando labaredas em poesia adormecida... é falso, que o
amor morra nas planícies salgas do deserto...
Os
outros, o monstro das quatro cabeças brincando dentro de mim, saltava à corda,
subia aos pinheiros pintados em papel cenário..., e havia sempre um pigmentado
sorriso nos seus lábios, era Sexta-feira, daquelas Sextas-feiras que iluminam
as imagens a preto e branco, o sono, a agonia de olhar o mar desenhado numa das
paredes do quarto, escuro, ainda boiava a noite nas veias da adrenalina
constelação do amor, aquele amor inventado apenas para adormecer na poesia,
nada mais do que isso...
Isso
o quê, meu amor!
Os
outros, o monstro
Batem
à porta,
Livros,
livros nas mãos cardume do carteiro, assine aqui se faz favor, assinei, foi-se
embora, escondido no arvoredo comecei a acariciar o envelope, lá dentro
percebia-se que alguém existia para me abraçar, daqueles abraços
trigonométricos, sabes?
Sei,
os outros, o monstro, a perfeita nostalgia, sebes de papel laminado voando
sobre o jardim
O
gajo passou-se, dizem...
Que
sim, livros, Isso o quê, meu amor! Batem à porta, e falou comigo,
Beijou-me
literariamente, sorri, levantei o olhar em direcção às palavras de amar, não
tive coragem de abraçá-la com as vogais e as consoantes do poema, alegremente
imaginava-me um transeunte sem identidade, nos sonhos aparecias vestida de
melancolia, as fotocópias e as fotografias, sem identidade, nome, palavras de
amar
Amanhã?
Não
o sei, percebi que as pálpebras do desejo habitavam nos nossos corpos de cinza,
perdia-me nos teus braços como se perdem as gaivotas nos cacilheiros da
saudade, palavras, palavras enigmáticas em construção, o corpo minguava na
escuridão, o monstro das quatro cabeças dançando nos meus ombros, sentia-me uma
circunferência sem olhar, sem.… sem um corpo para aportar, a saudade
Sentidas,
Os
tristes silêncios da minha infância saltando os muros da Primavera, as
amendoeiras em flor, as andorinhas apaixonadas, e eu
Sentidas,
A
saudade que os meus braços abraçavam,
Saudade?
Caminhei
sobre as pedras sonolentas da literatura, cansei-me dos teus poemas e da
“merda” dos teus desenhos,
Sentidas?
Sem
identidade...
Podíamos
ancorar a estes versos, permanecermos impávidos das celestes lágrimas do
Universo, Saudade? Caminhei, sentei-me sobre as quatro sombras da preguiça,
sofri, sonhei, aprendi que o amor é um cubículo sem janelas,
Junto
ao mar,
É
tão lindo, o mar, mãe...
Os
barcos e as jangadas de silêncio, os embriagados corpos dançando no texto,
encerra-se o livro, e morre o escritor,
Um
poema...
Palavras,
sons, imagens, barcos, marés... sucata amaldiçoada pela fresta do luar, a
astronomia e a matemática, dormem, saciam-se nas metáforas da insónia, corpos,
nus, entre eles... o sexo desenhado em cada esquina, a porta do quarto rangia,
gemia, e sabíamos que ninguém nos ouvia,
Orgia?
De
palavras e de poesia,
Um
poema?
Negro,
opaco, sem corpo nem cabelo, morto, fictício..., mas pouco, pouco, como os dias
à tua espera...
O
fugitivo regressa, aparece disfarçado de pássaro, não voa, deixou de voar,
sonhar, deixou de viver, e de construir castelos de areia junto ao mar, quando
dizias que aos três anos de idade já voava...
Eles
chegaram, o caixão ainda cheirava à tinta fresca da manhã, brincava um silêncio
de olhos verdes no vão de escada,
Foder
num vão escada, como fodem todas as palavras do poema...
Sabíamos
que o corpo não pertencia às nossas vidas, e o fugitivo sem regressar aos
nossos lençóis de sémen foragido, sem pátria, destino
A
porta de entrada encerrada,
Janelas
ainda não tinham acordado,
Destino,
viver dentro de duas folhas brancas com olhos verdes, um círculo, o Sol, a Lua,
o vazio do corpo na alvorada clandestina, fria, fria e amarga,
A
porta
Deus,
criador de tudo e de todos, a porta gaguejando, rangiam os biombos da
literatura quando imaginava o mar na parede da biblioteca,
Apetecia-me
Queimar
todos os livros, meus, desenhos, vozes, corpos de insectos e rosas
embalsamadas, queimar as fotocópias e os fósforos da insónia, beijar-te e
olhar-te
A
mim?
A
porta entranhada entre dois segundos, as lâmpadas lá de casa todas fundidas,
sós, escuras, como a humidade das palavras enquanto pessoas, nenhumas...
monstras, vazio, a astronomia do ciúme suspensa num cabo de aço, Rua da Nossa
Senhora..., Não está, hoje,
O
Doutor, a secretária do Doutor, e a porta, envergonhada como eu, porque hoje
não houve madrugada, porque hoje morrem as palavras...
(cansei-me,
vou deixar de escrever durante uns tempos e de frequentar as redes sociais,
cansei-me e apetece-me ouvir Wordsong... embrulhar-me nos sons das palavras...
e imaginar AL Berto voando junto ao Tejo. Vou ler muito mais e dedicar-me ao
desenho)
Mãe,
como é o mar?
Lençóis
de espuma, meu filho, silêncios de sombras poisadas numa tela virgem, aos
poucos reaparecem as palavras e os riscos, a arte de amar e de navegar num
beijo invisível, sem imagens, sem noite para chorar, as ruas completamente
indiferentes às minhas tristezas, as cintilações dos versos descendo os
socalcos imaginados pelas tuas brincadeiras de menino,
Fui
menino, mãe?
Cansei-me
das palavras,
Escrita...
nunca,
Mais
Amanhã
restará uma única sílaba ao acordar, o espelho
Mais
nada a acrescentar aos teus desejos, meu filho...
Francisco
Luís Fontinha – Alijó
In-
Amargos lábios do Poema
sábado,
23 de Janeiro de 2016
Sem comentários:
Enviar um comentário