foto; A&M ART and Photos
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O escritor não sou eu, os cigarros terminaram
quando ainda pertenciam-me coisas pequenas, pássaros e poemas,
secretárias que vomitavam palavras, cidades que flutuavam entre
manchas de sémen e flores de pétala encarnada, o escritor morreu,
não me pertencem as palavras que escrevo, que ele escrevia para
mima, e eu, amava-o loucamente como quem ama uma árvores, um
pedestal sem estátua, ou... escrevia-me nas costas enquanto eu,
dormia, imaginava-me dormir dentro dos teus braços, hoje partiste
definitivamente de mim, acabaram-se-me palavras e cores e os riscos
desordenados das noites de Sábado, hoje
escrevia-te palavras vãs em teus olhos verdes,
poisava os cotovelos sobre a secretária, mal educado, ouvia eu da
tua triste boca, eu, sem sentido, não me importava que de ti
acordassem glândulas e células onde eu guardava as palavras para
ti, meu amor, e sinceramente, aos poucos fui desistindo dos teus
lábios, ficaste confuso, tu, o homem que veste o meu corpo, me
transportas para as imagens longínquas de uma cidade que ainda hoje,
não Sábado, não consegues pronunciar, e da minha Luanda infinita
com o mar arregaçado até aos tornozelos, tu, desististe de me
transportar, de me amar, e assim, perderam-se-me todas as palavras
que te escrevi...
Odeio-te como odeio as chuvas tempestades sobre os
rios de brincar,
flutuávamos como alicerces de edifícios em ruína,
éramos aço que cobria o esqueleto dorsal de um paquete não
baptizado, levianamente, desaparecias durante a noite, provavelmente,
vestias-te de peixe, e voavas sobre o capim ruidoso que os mabecos
rosnavam antes de adormecerem, esperava-te na cama mergulhada em
livros, papeis velhos e canetas de tinta permanente, perguntavas-me
qual era a minha terra e eu respondia-te que sinceramente, ou
Provavelmente,
ou...
Não tenho terra, aqui não me conformo, não me
revejo, e lá, lá não me querem como cidadão Angolano, portanto,
além de te perder, além de perder as tuas palavras, os teus
abraços, os teus doces lábios, perdi também a Pátria, e
considero-me um apátrida, nem pertenço ao mar, nem pertenço à
terra,
ou,
Odeio-te como sabias que todos os calendários
inventam dias, e que todos os relógios, os pobres, e os ricos,
todos, comem horas, minutos e segundos, e subíamos a um coqueiro com
asas de vidro, e sentia-te em mim, e sabia-te disfarçado de sebenta
com palavras, e palavras, palavras...
a quem pertenço eu? A que corpo pertencem os teus
lábios que saboreiam o meu pescoço? Às palavras não ditas, por
medo, covardia, Qual é a minha Pátria?
Quem diria, que eu, um dia, procurasse nos caixotes
de cartão a tua fotografia, quem me diria, se eu te odeio, desde que
morreste-me nas mãos em palavras,
vãs,
E nunca, pára de mentir-me, porque nunca vivi na
Vila Alice, porque, nunca, vivi no Bairro Madame Berman, e
vãs, sãs, e nunca, nunca te esqueças, meu grande
sacana, que o teu querido corpo, é meu e pertence-me, leva as tuas
palavras, leva-as, mas deixa-me o teu corpo para eu brincar no
espelho do guarda-fato enquanto não regressa o Inverno...
@Francisco Luís Fontinha
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