foto: A&M ART and Photos
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Sou uma acorrentada, entre imagens e letras
penduradas nas árvores em Primavera, sou uma barcaça sem velas,
leme, sem nada para navegar, sou uma prisioneira das tardes de
Sábado, quando o mar selvagem entra no meu coração despedaçado,
como migalhas de trigo, depois do pão recesso que os dias lançam
nos rochedos dos sonhos sem os verdes olhos do calendário da
saudade, sou
Uma virgem encapuçada quando desce o Agosto das
longínquas praias mergulhadas em incenso e em cartas de amor,
devolvidas ao remetente, sou uma feliz prisioneira, à tua mão
acorrentada, sou, uma, sou uma imagem escura, penumbra, fria, hoje,
quando do ontem regressavam as algas dos rios onde dormias, e eu te
esperava, sentada sobre a mesa da sala, de livro na mão, e com o
candeeiro apagado, vivíamos em escuridão para afugentarmos os
fantasmas das asas de papel, quando os Sábados
(ninguém regressou de lá)
As palmeiras diziam-se cansadas de balançar nas
tardes de verão, e um vento ténue abraçava-nos enquanto
escrevíamos poemas sem nexo, que ainda hoje vivem dentro de uma
caixa de cartão,
(ela fugiu)
E o vento cessou de bater nas vidraças endiabradas,
pareciam almas em corpos putrefactos, regressados do abismo,
descíamos a calçada e sentávamos-nos sobre os finos paralelos do
desejo, havia sempre uma flor que te esperava, meu querido, havia
sempre uma
(Clarissa – Érico Veríssimo)
E havia sempre uma claridade no teu olhar, meu
querido, e havia sempre uma nuvem azul com tempestades cinzentas, e
havia sempre, meu querido, sempre, havia, havia sempre uma nuvem azul
na tua boca, e sempre, havia, e havia sempre um silêncio de espuma
nos teus lábios,
E
(the Sea)
E, hoje sei que o mar dormia nos teus bolsos, hoje,
sei, hoje sei que o pôr-do-sol acordava porque os teus cigarros
assim o determinavam, e eu não percebia, e eu, não sabia, que o
mar, que ele e ela era tão importantes para ti, como a corrente que
me prende ao teu peito de areia, e
(começaste a gostar de AL Berto por minha causa)
E hoje, hoje sinto que a corrente de aço que me
aprisiona a ti, meu querido, começa a desmoronar-se, como as
flácidas rugas do teu rosto de barro, e hoje
(the Sea)
Hoje (sou uma acorrentada, entre imagens e letras
penduradas nas árvores em Primavera, sou uma barcaça sem velas,
leme, sem nada para navegar, sou uma prisioneira das tardes de
Sábado, quando o mar selvagem entra no meu coração despedaçado,
como migalhas de trigo, depois do pão recesso que os dias lançam
nos rochedos dos sonhos sem os verdes olhos do calendário da
saudade, sou) sento-me nas clarabóias poisadas sobre os telhados da
cidade, e a cada pássaro que passa, peço-lhe perdão, peço-lhe que
me traga novamente o mar emaranhado de algas, pedras, lodo, e os teus
braços que ficaram apodrecidos como o casco do velho barco de
esferovite, e hoje, hoje penso em ti como uma nuvem azul perdida
sobre o Oceano...
(perdi as tuas cartas)
Como verbos suspensos no céu nocturno da saudade.
(ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha
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