segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019

Insónia


É tarde,

deixo a tangente perpendicular à noite e parto em direcção à solidão,

visto-me de equação diferencial,

e abraço-me à integral do sofrimento.

É tarde,

Regresso a esta casa difusa, fria, arrogante...

como um marinheiro esfomeado,

o sexo, a morte suspensa no espelho da dor,

é tarde, meu amor.

É tarde, neste quarto desassossegado.

As minhas mãos aleijam o teu rosto, e quando toco no teu cabelo... ele começa a voar,

é um pássaro inanimado, triste, sem vontade de amar...

é tarde, meu amor,

é tão tarde, meu amor....

neste quarto abandonado.

 

Francisco Luís Fontinha

25/02/2019

domingo, 24 de fevereiro de 2019

Junto a ti


Lembro-me de ti.

Juntos ao rio das pedras cinzentas,

A aragem do teu cabelo saltitando entre as gaivotas,

Murmuravas as palavras do destino,

Sentada, junto a mim, uma rosa no peito adormecia,

E os teus olhos cor de amêndoa voavam na paisagem…

Lembro-me de ti.

Sentada.

Presos na minha mão todos os guindastes da insónia,

O medo,

No silêncio…

Sentada,

Junto a mim.

Lembro-me de ti,

E dos teus suspiros velejados pelos livros de poesia,

Unificados sejam todos os fins de tarde,

Quando pegava na tua mão e desenhava nela o sol da madrugada,

Junto ao mar,

A jangada,

O poema embriagado,

Só,

Junto a ti,

Sentada,

Junto ao rio…

Lembro-me de ti.

Todas as ervas daninhas embriagando os teus lábios de seda,

Desenhava o beijo no teu olhar, olhavas-me, criavas um sorriso na tarde, e descobríamos as tempestades da noite,

Tu, sentavas-te, no meu colo,

O medo,

O medo de amar-te sabendo que o amor é o mar enraivecido nos dias ímpares,

A jangada,

Junto a ti,

Sentada.

 

 

Francisco Luís Fontinha

24/02/2019

sábado, 23 de fevereiro de 2019


Francisco Luís Fontinha, Poeta, Nasceu em Luanda, perdido na infância, ainda hoje não foi encontrado.

 

A pedra

 

 

Que me sento.

Folheio a tua boca no silêncio do capim,

As ruas dentadas no sonâmbulo entardecer, desce o beijo, poisa na minha mão e dorme lentamente na fogueira da noite,

Me canso.

Que me sento.

Na pedra emagrecida dos teus lábios, dizem-me em gritos de fumo que não amas…

Nunca saberás o que é o amor.

Amanhã.

As palavras rasuradas dos meus textos incompreendidos, falsas estrelas povoam a madrugada, olhas-me, e foges para as montanhas.

Sou tão feliz, meu amor, por saber que nunca me amarás,

O amor é como o mar, olha-se, toca-se, e desparece na Calçada da Cidade.

Que me sento.

Que beijo loucamente esta pedra, que me sento, e canso…

As bocas da noite.

Os holofotes da miséria correndo até ao rio, ao longe um petroleiro de poemas encalhado no teu cabelo, sinto os teus olhos e perco-me na tua sombra,

Que me sento,

Nesta pedra,

E me canso.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 23/02/2019