quarta-feira, 2 de abril de 2014

A banheira do prazer


Enquanto te absorves na banheira do prazer e te libertas das caricias minhas palavras,
eu, um incipiente nocturno das fábulas sem habitação, construo o teu corpo com a espuma imaginaria que poisa nos teus seios de marfim,
de escultor nada tenho,
e imagino-te pintada no poema cansado da madrugada,
enquanto te banhas e te absorves..., nada em ti eu desejo, porque a ténue luz do silêncio te come, e alimentas o olhar das personagens solitárias da cidade do caos...
a paixão embainha-se no cortinado que nos separa, eu de um lado, e tu... tu... mergulhada, molhada, à espera das minhas mãos sem rumo, como a geada quando esconde o sorriso dos loucos pássaros,
e eu, eu um incipiente nocturno das fábulas sem habitação,

Apaixonado?
talvez... talvez não,
porque sou um acorrentado ao cais dos sofridos beijos em noites de tristeza,
eu pregado à insónia?
talvez... talvez não,
porque não estando apaixonado, porque não sendo o perfume dos teus cabelos..., sou, sou um delinquente invisível do amor,
sou uma gaivota que levita quando desapareces do meu olhar e te transformas em rio,
e sei que o teu corpo fundeado na banheira do prazer... é um barco, um barco com nome de mulher...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 2 de Abril de 2014

terça-feira, 1 de abril de 2014

neblina de medo


há uma neblina cinzenta poisada no cansaço dos dias
emagrecem as horas e os minutos e os segundos
há uma imagem prateada com sabor a calendário submerso na solidão
os dias não são dias
e das noites
ouvem-se as tempestades indesejáveis do silêncio

há uma parede mergulhada nas tuas veias de cigarros envenenados
e oiço as tuas palavras ensanguentadas de dor
flores são pedaços de poema com asas de papel
gaivotas mórbidas que invadem as sílabas do sofrimento
há uma neblina de medo
e ele e ele é a tua âncora de xisto em fatias de néon que a cidade absorve


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 1 de Abril de 2014

Gaivota clandestina


Percebo a insónia tua quando abres a janela do desejo, e voas, e evaporas-te como uma gaivota clandestina, sem nome, apenas... só,
percebo nos teus olhos a tristeza das tuas lágrimas, livres como a Primavera, e voas, e só...
sinto em ti o cansaço do corpo que espera o clarear da madrugada,
oiço a tua voz de cristal... e sei, e sei que habitas na minha mão,
escrevo no teu rosto as palavras não escritas, as palavras invisíveis... e só, só...
percebo que na tua voz existe melancolia, amargura, livros, livros em pedaços de lume,
percebo que há pétalas coloridas, e que há outras tão negras, negras... tão negras como a noite,
tão negras como os teus cabelos em silêncio... e só, e só, que tudo percebo.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 1 de Abril de 2014