domingo, 26 de novembro de 2023

O sono

 

Não consigo matar o sono, o sono não morre, disparo uma bala contra ele, e ele, feliz, ao outro dia, depois da tarde se esconder na tua mão.

Tento outras maneiras e feitios de o matar, mas o gajo é teimoso, mas o gajo não morre,

Parece o tempo.

Parece a chuva, parece a lezíria perdidamente de sono, depois de o vento trazer as ancoradas cinzas do meu corpo,

Os sonhos,

Dos sonhos que sonho, nos sonhos de sonhar.

 

Não consigo matar o sono, não consigo matar este barco que habita dentro de mim, não consigo matar o sono, mesmo que às vezes ele se finja de uma outra coisa e entra em mim como se fosse uma lança…

Tristes, são os teus olhos depois da chuva.

 

Do outro lado da rua, a minha rua, deste lado da rua, nada,

Pensando bem, o sono é imortal, e nunca será um cadáver,

A não ser,

A não ser que o sono tenha sentimentos, como eu, a não ser que o sono tenha manias, como eu, a não ser…

Que este chocolate que como termine, que estes cigarros que fumo, morram nas minhas mãos, e que esta lareira cesse de me amar,

Não morre o sono, mas morro eu,

De sono.

 

Não consigo matar o sono. Que chatice.

Não consigo encomendar um simples livro, porque me apetece e às vezes não me apetece, quando me apetece ouvir-te e pego no tablet…

E embrulho-me nos teus olhos.

 

E embrulho-me nas tuas sílabas.

 

 

26/11/2023

Odeio-me, mas preciso deste corpo para escrever,

 

Odeio-me, mas preciso deste corpo para escrever, odeio-me, mas preciso deste corpo para desenhar, odeio-me,

Mas preciso de mim, para viver.

 

Odeio esta lareira, mas preciso dela para me aquecer,

Odeio as minhas mãos,

Mas preciso delas,

Para acariciar o teu cabelo.

 

Odeio a geada, mas preciso dela para pensar, enquanto fumo cachimbo e caminho…, e penso, que preciso do meu corpo, mesmo odiando-o,

Odeio-me, mas preciso deste corpo para brincar junto ao mar, preciso deste corpo para te amar,

Mesmo me odiando,

Preciso deste corpo para ser,

Para sonhar,

Para cantar a canção do te odeio…

 

Odeio este corpo enquanto como chocolate, e gosto tanto de chocolate, enquanto me aqueço, enquanto penso que este corpo nunca me pertenceu, no entanto, tenho-o e odeio-o, odeio este corpo e mesmo assim, tenho-o de transportar, e vou ter de o odiar.

 

Odeio os livros da minha biblioteca e, no entanto, amo todos os livros da minha biblioteca,

Odeio este corpo, com chocolate, sem chocolate, de manhã, ao acordar, à noitinha, quando dispo este corpo de penduro-o no cabide até ao outro dia,

Odeio este corpo, quando dorme, quando está acordado, quando está luar ou quando está a chover,

Odeio-me, mas preciso deste corpo para escrever, odeio-me, mas preciso deste corpo para desenhar, preciso deste corpo,

Preciso deste corpo para te amar.

 

Mas preciso de mim, para viver.

 

 

26/11/2023

sábado, 25 de novembro de 2023

Milhões de bocas

 

Milhões de bocas na ânsia do pão, milhões de vozes,

Na revolta de um povo,

Que sofre,

Com fome,

Que sofre,

Com o frio da vida,

Milhões de bocas se revoltam,

Milhões de bocas,

Gritam,

E se sufocam.

 

Milhões de bocas aplaudem,

As milhões de bocas que se ajoelham,

Milhões de bocas na ânsia do pão,

Milhões de bocas e de vozes…

Na despedida da Primavera,

Milhões de bocas

Ferozes,

Milhões de bocas falam,

Das outras milhões de bocas,

 

Nas milhões de bocas sem sorte.

Milhões de bocas suplicam às outras milhões de bocas,

Suplicam palavras,

Suplicam pedras,

Aplausos quase à moitinha,

Milhões de bocas se despem

E fodem,

Tantas milhões de bocas,

Tantas alminhas.

 

 

25/11/2023

O universo de Deus

 

O universo é tão complexo, belo, o universo talvez seja infinito, talvez não, e tudo isto apareceu do nada, do quase invisível,

O universo é tão complexo como o primeiro par de sapatos que calcei, ou o primeiro par de botas, que já tinha seis anos,

Ou como o primeiro beijo…

O universo, é belo, é tão belo como os teus olhos,

Sendo os teus olhos ainda mais belos de que o universo.

 

O universo fascina-me, é tão certinho, sempre no seu equilíbrio, imagina se a lua se constipasse, como ficaria a terra?

Imagina uma dor de cabeça no sol, como ficaria a terra?

O que me leva a concluir que a morte de um pode ser a desgraça de todos,

E, no entanto,

O universo não quer saber, não se interessa, pois se ele é a coisa mais bela das belas coisas,

Que existe no universo.

 

O universo é a paixão, é a dor, é a alegria e o sofrimento,

Quando a noite é feia,

Quando a noite é insónia,

Quando a noite é negra,

Quando a noite é vento.

 

O sofrimento é o universo, que se move, que caminha junto à praia, descalço, e com um livro na mão,

O universo às vezes parece uma enxada, descalça, nos socalcos no Douro,

E, no entanto,

As lágrimas de uns

Pode ser a alegria de outros,

Que o universo faz o favor de os deixar andar por aí…

 

Quando deviam andar por aqui.

O universo é Deus, dizem uns, os outros não se manifestam, e vão beber copos,

O universo é a música do teu olhar, o universo é o amor dos teus lábios,

 

Quando o universo poisa docemente a mão no meu peito e me diz,

Estou aqui,

Estou aqui para te assassinar.

 

 

25/11/2023

Como seria a noite, meu amor, nos teus olhos?

 

O teu olhar, o teu olhar é um diamante lapidado, são estrelas que habitam a milhões de anos-luz do nosso planeta,

O teu olhar é a manhã vestida de alegria,

São flores, são poesia,

 

O teu olhar, quando me olha, finge não me ver,

E esconde-se num pedacinho de lua,

É canção que eu te vou escrever,

Do teu olhar,

Quando o mar é sonâmbulo, e a minha mão poisa no teu cabelo.

 

O teu olhar é o teu nome, o teu nome escrito na geada, do teu nome a tarde se despede, e vai simplesmente embora,

E só regressa ao outro dia,

De mãos vazias,

De algibeira vazia,

No entanto,

O teu olhar é o olhar mais feliz do universo…

 

Da galáxia,

Do círculo e do quadrado,

O que te interessa a ti, meu amor, o círculo, o quadrado, integrais e equações diferencias…

Quando o teu olhar é tão lindo, meu amor,

Tão lindo,

 

Que por ele eu era capaz de me matar.

O teu olhar, meu amor, o teu olhar é a equação de Deus,

É a solução para a fome,

Para a tristeza,

Para a pobreza,

Que por ele eu me matava,

Com palavras,

Com poemas;

Imagina meu amor, eu suicidar-me com um poema, disparar uma frase contra o meu olhar e,

Morrer.

 

E escrever.

Imagina meu amor, imagina o sol suspenso no teu cabelo, imagina meu amor, imagina a lua poisada nos teus lábios,

Como seria o dia,

Como seria a noite,

Meu amor,

Nos teus olhos?

Imagina…

 

 

25/11/2023