quinta-feira, 25 de maio de 2023

O poeta de Deus

 

(feliz dia de África)

 

 

Não sei,

Não sei como será o Inverno

No Inferno,

Não o sei…

Mas… quem o saberá?

Farto-me de escrever poemas a Deus…

E Deus está literalmente a cagar-se para mim,

Não me importo,

Quero lá eu saber de Deus,

Tal como ele,

Quer lá Deus saber de um tal de Fontinha…

 

Não o sei,

Quem o saberá…

Vocês sabem como será o Inverno no Inferno?

E de um tal de Inferno disfarçado de Inverno?

Não, não me interessa…

Em criança, até um determinado período da minha vida…

E que vida,

Meu Deus,

Que rica vida eu tive…

Não sabia o significado de Inverno.

 

E era muito feliz!

Muito mesmo…

Tão feliz que…

No meu Inverno,

Trazia os meus calções e as minhas sandálias de couro…

Que couro, meu Deus,

Que calções…

E quer lá saber Deus dos calções e das sandálias…

Deus,

Deus passa todo o seu tempo a escrever poesia…

Entre calções,

Tão feliz que fui…

Muito feliz,

E do meu Inverno,

Que Inverno,

Aquele meu Inferno,

De aprender o significado de Inverno…

Quando eu…

 

Tudo esqueci,

As sandálias, os malditos dos calções, o Mussulo, tudo,

Tudo mesmo.

Durante muitos anos,

Muitos mesmos,

Queria perguntar ao meu pai porque choravam as acácias da minha infância…

E tudo,

Já não me lembrava de nada…

Apenas…

Machimbombo…

Que coisa, esta, do Inverno ser Inferno…

E Deus, o poeta, ser tudo…

Tudo o que não fui,

Tudo o que não quero ser,

Ser o quê…

Mais um, por aí…?

 

E chorei.

E chorei sem perceber que chorava…

Que apenas me recordava,

De ter chorado,

Não porque me apetecesse chorar…

Mas chorava,

Tinha medo de me perder,

E um dia, perdi-me, por aí…

Um dia, meu Deus…

Um dia…

Chorava porque tinha frio,

Chorava porque tinha medo,

Chorava porque me sentia só…

Qualquer coisa que nasceu comigo, não me pertencia…

Tinha morrido,

E até hoje,

Hoje… nada,

Até hoje não sei a coisa que morreu,

E que até hoje,

Não consigo dizer que coisa é essa…

E se não há coisa,

Não haverá cadáver,

Nem haverá crime…

 

(peço desculpa pela ausência, mas assuntos do foro privado chamavam-me)

 

A minha mãe,

Coitada da minha mãe…

Tal como eu,

Também ela chorou muito…

Muito…

Éramos assim…

Como deslocados,

Ausentes de corpo e alma,

Não,

Nunca acreditei na existência da alma…

Nunca.

A minha mãe,

Coitada da minha mãe…

Eu chorava,

E eu sabia que a minha mãe chorava porque eu chorava…

Éramos ausentados,

Deslocados da terra e do primeiro pigmento de cor…

Abraçava-me a ela,

E ela mentindo-me, dizia-me… um dia, um dia meu filho…

Um dia tudo vai melhorar…

 

Um dia,

Um dia cairá chuva na minha mão,

Um dia,

Um dia…

Não sei,

Não sei como será o Inverno

No Inferno,

Não o sei…

Mas… quem o saberá?

Farto-me de escrever poemas a Deus…

E Deus está literalmente a cagar-se para mim,

Não me importo,

Quero lá eu saber de Deus,

Tal como ele,

Quer lá Deus saber de um tal de Fontinha…

Ou do Inverno no Inferno,

Do Inferno a infernar o Inverno…

Quer lá ele saber…

A não ser…

Que Deus seja accionista do Inverno e credor do Inferno…

Ó pá,

Deus é comunista…!

Deus não é nem nunca será capitalista…

 

Veremos, um dia…

Um dia, um dia veremos.

 

 

 

Francisco

25/05/2023

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