terça-feira, 17 de março de 2015

A poesia habitava num edifício caquéctico, quinto andar esquerdo, António folheava as fotografias de Margarida,
O tempo entranhou-se nas nossas estórias,
Ouvia-a enquanto ela se despia,
Sentia-me uma letra esquecida nas pálpebras do anoitecer, lá fora brincavam crianças, fingiam que eram sombras húmidas abraçadas ao mar, o eterno
Se despia, dançava para mim, enquanto eu, eu nem a olhava, lia um poema de um autor desconhecido, embrulhava-me no poema... e
Se despia, o eterno momento do desejo, dois corpos de luz sós no vazio, nada, ninguém em redor, apenas percebia que o espelho do sexo baloiçava nas mãos de uma andorinha,
Miguel,
A guerra, “a merda da guerra”, a morte anunciada antes de partir
Vais morrer,
Antes de partir, nas mãos de uma andorinha, ele,
Fotografias...
Ele imaginava o pai um herói, e afinal... um covarde, o perfeito covarde das algas em flor...
Migue?
Sim, pai,
Ontem chegaste tarde a casa...!
Eu, pai?
António
Que não,
António defendia o irmão,
Tarde?
Cheguei depois dele...
Que não, que as guerras não deviam existir
Angola,
Amor de “mãe”,
Foi-se,
Morreu, em combate...


(ficção)
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 17 de Março de 2015

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