segunda-feira, 26 de março de 2012

Ele não sabe chorar

Evaporam-se as estrelas na algibeira da dor, um corpo transparente mergulha na superfície da lua, ouvem-se lágrimas no pavimento ensanguentado de livros e pedacinhos de tela,
- Não sei chorar
Ouvem-se todos os silêncios imaginários e dentro de mim um penhasco de rocha em decomposição, o cheiro intenso a carne embebida nos lençóis de sémen, evaporam-se as estrelas na algibeira da dor,
- Porque fui construído em aço inoxidável numa cidade invisível antes de terminar o dia, oiço as palavras argamassadas de sangue poisadas na ardósia da escola, e sentado debaixo de um pinheiro doente, e sentado debaixo de um pinheiro doente dou-me conta que a primavera não existe, dou-me conta que todas as árvores são parvas, e eu, e eu apenas espero pela chegada da noite,
As flores murcham e uma abelha rouba o sol e a noite ficou eterna, e a noite tem os seus encantos quando todas as luzes se evaporam como as estrelas
- Nunca soube o que é o amor,
Estou longe e todas as estrelas rangem nas mãos do orvalho quando os pedaços de mar entram pela casa e agachados junto ao rodapé, um crucifixo, um crucifixo chora nas fendas da alvenaria,
- Quem sou Pergunta-se ele quando vê uma rocha de xisto no espelho estilhaçado que vive no quarto escuro onde se esconde o mar junto ao rodapé, Não sei chorar, e sei que o AL Berto, Algures…, e sei que o AL Berto algures me olha e aproxima-se dos meus braços,
- Um simples abraço, Pensava eu,
Nunca soube o que é o amor, nunca soube o que é a poesia, e pagava, e pagava para não saber ler, e pagava para não saber escrever,
- Que feliz, Que feliz se todo o alfabeto fosse para mim como as joias de ouro e o dinheiro, Merda amarela…
Um vazio infinitamente azul nas paredes do meu quarto, Quem sou Pergunto-me quando vejo uma rocha de xisto no espelho estilhaçado que vive no quarto escuro onde se esconde o mar junto ao rodapé, Ele não sabe chorar, e o AL Berto, Algures…, e o AL Berto algures olha-o, aproxima-se e abraça-o,
- Evaporam-se as estrelas na algibeira da dor
Antes de terem roubado o sol,
O meu corpo transparente mergulha na superfície da lua, cerro hermeticamente os olhos, e, cerro hermeticamente os olhos e dou-me conta que debaixo do pinheiro doente uma criança brinca com os ponteiros de um rabugento relógio, e a tarde, e as estrelas, e tudo evapora-se na algibeira da dor…
- Não sei chorar porque fui construído em aço inoxidável numa cidade invisível antes de terminar o dia.

(texto de ficção)

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