Sinto o teu corpo rasurado
pela minha boca, no planalto hemisfério, à deriva na tua mão,
Sinto a espuma manhã, do
teu cabelo, neste complexo silêncio, nesta sanzala de cadáveres, uns que se
amaram loucamente, outros, loucamente se odeiam.
Sinto a razão de estar
vivo, quando o suicídio é a razão,
Sinto o telintar das
estrelas nos teus olhos,
Que olham o mar.
Sinto o teu corpo
rasurado pela minha boca, sinto que este navio viaja apenas durante a noite, e
em sucessivos círculos,
Sinto que o comandante
deste navio, amanhecer de um metro e setenta e cinco centímetros, e muito belo,
está perdido no oceano capilar quando o vento traz as primeiras lágrimas do
silêncio,
Amanhã, talvez.
Eu me sinta.
Sinto o teu corpo na
fogueira das minhas mãos, onde deixo todos os meus medos e todas as minhas parvoíces,
Que te sinto.
Sinto este cigarro que
arde, e imagino-me a arder, como ele, na tua boca…
Sinto os teus doces
lábios de mel, pergaminho dos meus lábios, em guarida convenção, em traços de
simetria, sobre a mesa, sobre a tua cabeça,
Sinto a música que oiço,
que não queria ouvir, porque às vezes não quero ouvir nada,
Tão pouco sentir o teu
corpo rasurado pela minha mão,
Numa noite de insónia.
Sinto que aos poucos me
despeço das palavras que não quero escrever, sinto que me despeço da poesia, a
cada noite nos teus olhos,
Sinto que o meu primeiro
beijo, foi um fracasso,
Sinto que a minha
espingarda deixou de disparar, e quando dispara, são meia-dúzia de mangas que
morrem num quintal em Luanda,
Onde um menino me espera,
E sente,
Como eu…
O teu corpo rasurado pela
minha boca, no planalto hemisfério, à deriva na tua mão.
07/01/2024