domingo, 7 de janeiro de 2024

Poesia do sentir

 

Sinto o teu corpo rasurado pela minha boca, no planalto hemisfério, à deriva na tua mão,

Sinto a espuma manhã, do teu cabelo, neste complexo silêncio, nesta sanzala de cadáveres, uns que se amaram loucamente, outros, loucamente se odeiam.

 

Sinto a razão de estar vivo, quando o suicídio é a razão,

Sinto o telintar das estrelas nos teus olhos,

Que olham o mar.

 

Sinto o teu corpo rasurado pela minha boca, sinto que este navio viaja apenas durante a noite, e em sucessivos círculos,

 

Sinto que o comandante deste navio, amanhecer de um metro e setenta e cinco centímetros, e muito belo, está perdido no oceano capilar quando o vento traz as primeiras lágrimas do silêncio,

 

Amanhã, talvez.

 

Eu me sinta.

Sinto o teu corpo na fogueira das minhas mãos, onde deixo todos os meus medos e todas as minhas parvoíces,

 

Que te sinto.

 

Sinto este cigarro que arde, e imagino-me a arder, como ele, na tua boca…

 

Sinto os teus doces lábios de mel, pergaminho dos meus lábios, em guarida convenção, em traços de simetria, sobre a mesa, sobre a tua cabeça,

Sinto a música que oiço, que não queria ouvir, porque às vezes não quero ouvir nada,

Tão pouco sentir o teu corpo rasurado pela minha mão,

 

Numa noite de insónia.

 

Sinto que aos poucos me despeço das palavras que não quero escrever, sinto que me despeço da poesia, a cada noite nos teus olhos,

Sinto que o meu primeiro beijo, foi um fracasso,

Sinto que a minha espingarda deixou de disparar, e quando dispara, são meia-dúzia de mangas que morrem num quintal em Luanda,

 

Onde um menino me espera,

E sente,

Como eu…

O teu corpo rasurado pela minha boca, no planalto hemisfério, à deriva na tua mão.

 

 

07/01/2024

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