sexta-feira, 17 de novembro de 2023

Flor em seu tempo

 Flor em seu tempo

Do jardim paradisíaco do silêncio amanhecer

Teu nome escrito na minha mão

Teu nome em mim

Escrito e desenhado no meu coração

Flor do teu viver

Flor só nos braços do vento

Neste paradisíaco jardim,

 

Flor em seu tempo

Do tempo envenenado

Minha flor,

Em flor este verso apaixonado

Flor que é alimento

Do tempo sem dor,

 

Flor em seu tempo

Quando o tempo parece dormir

Do tempo sem tempo de cantar

No tempo madrugada,

Flor em desejo amar

Do teu alegre sorrir…

Quando este sentimento…

É uma é sílaba cansada.

 

 

17/11/2023

Casa

 Regresso a esta casa vazia

Aos teus braços que amparam o meu silenciar

Abro uma garrafa de poesia

E dispenso o jantar

 

A luz está apagada

As tuas mãos sabem a maresia

Regresso a esta casa vazia

A esta casa amordaçada

 

As tuas mãos sabem a mar

E a flores sepultadas

Esta casa parece o teu doce olhar

Esta casa não tem madrugadas

 

Regresso a esta casa vazia

Aos teus braços de amanhecer

Nos teus lábios um novo dia

Do dia de viver.

 

 

17/11/2023

Olhar

 Os dias sem ninguém, nos dias de nada,

Todos os dias em desespero, nos dias sem madrugada,

Os dias inconstantes, dos dias amargurados,

Todos os dias, nos dias cansados,

 

Os dias sem noite, quando o dia é apenas a escuridão,

Nos dias transparentes, dos dias que escondo no meu coração,

São estes os dias, os dias sem ninguém…

À espera dos dias de alguém,

 

Nos dias de um simples olhar.

Os dias sem ninguém, aos dias do mar,

Quando os dias são apenas a imaginação…

Dos dias que escondo na minha mão.

 

 

17/11/2023

quinta-feira, 16 de novembro de 2023

Baleizão

 Este corpo não me pertence.

Utilizo estas mãos,

Que não são minhas,

E que não pertencem ao corpo que não me pertence.

Estes olhos, não me pertencem,

E, no entanto, uso-os

Como se fossem os meus olhos;

Que não são os deste corpo,

Neste corpo onde habito,

Deste corpo amaldiçoado,

Cansado,

Às vezes tão triste,

Que engana a fome com o silêncio.

 

Este corpo não me pertence.

Este corpo emprestado numa noite de neblina,

Reconheço que fui enganado,

Deram-me este corpo a troco de uns míseros poemas…

E como se vê, enganaram-me;

Os poemas eram lindos,

Este corpo…

Este corpo não me pertence,

Não tenho corpo,

E tenho um coração que não é o meu,

Que está dentro deste corpo que não me pertence,

E que às vezes chora, e que às vezes, amua…

 

Este corpo não é o meu.

Não, nunca poderá ser o meu.

Este corpo não tem peso, o meu corpo, pesava saudade,

Este corpo não me pertence,

Não é o meu…

Este corpo é ausência,

Este corpo é vidro disfarçado de xisto,

Esconde-se na montanha,

Olha de soslaio o rio…

E grita,

Grita…

Mas ninguém o apanha.

 

Este corpo não me pertence, este corpo não pode ser o meu,

Este corpo chora, o meu corpo, nunca tinha chorado,

O meu outro corpo, nunca tinha amado,

E, no entanto, deram-me este misero corpo,

Flácido,

Às vezes parece uma bola de papel,

Outras vezes, nem uma coisa nem a outra…

Quando o rio se cansa deste corpo,

E do mar regressam outros corpos,

Outras Nações distantes,

Este corpo ausente, este corpo doente,

Este corpo que não é o meu,

Que fuma os cigarros do meu outro corpo…

Quando se vai embora a Primavera.

 

Este corpo apedrejado pelo medo,

Este corpo não pode ser o corpo, o meu corpo,

Com que passeei junto ao Tejo…

 

Este corpo esconde-se, às vezes,

Este corpo não é o meu, o corpo meu que despi e lancei ao mar,

Este corpo amargurado,

Profundamente enganado quanto ao corpo,

Procura dentro da algibeira, o cartão de embarque

Rumo ao Musseque…

Este corpo não me quer,

Este corpo não me obedece,

Eu quero ir para a esquerda,

O meu corpo, que não pode ser o meu corpo,

Vai para a direita.

 

Eu quero descer as escadas,

E este corpo,

Sobe-as em direcção ao Céu.

 

Este corpo não me pertence,

Este corpo disfarçado de nada,

Que escreve nas paredes de outros corpos,

De outras casas,

Com janelas,

Sem janelas,

Com escadas,

Sem escadas,

Este corpo se perde,

Este corpo se engana,

Este corpo… pára;

No semáforo do Baleizão…

 

Este corpo que eu não quero,

Este corpo que não é o meu,

Este corpo que não me pertence,

Que me ignora,

E me sussurra na madrugada;

Coisas de outros corpos.

Coisas.

Apenas coisas, que este corpo dispensa, que este corpo não quer…

Este corpo só,

Este corpo em dó,

E em ré,

Este corpo que não é o meu,

Este corpo que não tem fé,

E acredita, que um dia, vai ter o corpo que é dele.

 

 

16/11/2023

S. Martinho do Porto



Não te peço,

Imploro-te,

Não te peço, mas imploro-te que me perdoes,

Pedacinho de mar

Que se esconde no poema,

Sílaba do meu saber,

Constante adimensional,

Raiz quadrada da manhã,

Não te peço,

Imploro-te,

Não te peço, mas imploro-te que me perdoes,

Pássaro do meu jardim de cartão,

Fotografia do silêncio,

E este cansaço que não cessa,

E esta fogueira que não acorda…

E me leva.

 

Não te peço,

Imploro-te,

Não te peço, mas imploro-te que me perdoes,

Personagem dos meus textos,

Geometria da paixão,

No quadrado,

Do círculo,

Da equação de Deus,

Que me leve…

Não te peço,

Imploro-te que me perdoes,

Gaivota da manhã,

Junto ao mar de S. Martinho do Porto,

Não te peço,

Imploro-te…

Que perdoes a minha forma estranha de viver,

Das palavras,

Nos rabiscos que só as minhas mãos conseguem perceber…

 

Não te peço,

Imploro-te,

Não te peço, mas imploro-te que me perdoes,

Todas as coisas visíveis

E invisíveis,

Como os teus olhos de mar

E os teus lábios de mel.

 

 

16/11/2023

Manhã em teus lábios

 Manhã em teus lábios de perdição

Canção das estrelas e das insígnias disciplinadas

Manhã do meu coração

E das tristes madrugadas.

Manhã em teus lábios de louvor

Dos cansaços amordaçados

Manhã em flor

Na flor dos teus lábios ensonados.

Manhã em teus lábios de perdição

Que se esconde no amanhecer

Da manhã sem pão

Na manhã de escrever.

 

16/11/2023

quarta-feira, 15 de novembro de 2023

Enterro

 Está frio aqui, pá, e, no entanto, durante aproximadamente trinta e seis horas vou ter de aturar todos estes gajos e toas estas gajas, que sinceramente, detesto-os.

Porque estão eles no meu enterro?

Foda-se, nem um cigarro posso fumar, esqueci-me de os trazer, pá, paciência,

É a vida, pá,

É a vida, amigo Gomes,

Olha, olha… olha aquela cabra que não se cansa de chorar, já viste isto, meu?

Foda-se,

Estou as passar-me da cabeça,

Detesto estas merdas, detesto-os a todos e a todas, e ainda por cima vestiram-me um fato, gravata, sapatos pontiagudos, foda-se, pá,

Eu não queria nada disto, amigo Gomes, nada disto.

Olha, olha... olha aquele cabrão com uma coroa de flores…

Ó meu, devem ser caras?

Tudo está caro, pá, até o haxixe.

Foda-se meu, estou fartinho desta merda. Porque nenhum filho da puta coloca um fardo de palha em cima do caixão, e

Cinzas, meu grande amigo; cinzas.

Ó Gomes, faltava cá este, o padre Jorge. Foda-se, e eu que nem cerimónia religiosa queria…

Porra, pá. Porra.

Ele é muito fixe, mas prefiro apenas tomar café com ele no café do Jorge,

Diz-lhe amigo Gomes, diz-lhe…

Ó Gomes?

Diz, pá,

Quem são estes quatro filhos da puta que carregam o meu caixão até ao carro funerário?

Sei lá, pá,

Vieram de Lisboa…

Só me faltava mais esta…

Olha pá, vou tomar banho e daqui a pouco bebemos um copo.

Já sei, pá, és sempre a mesma merda, apreces às vinte e três e cinquenta e cinco e queres ir embora às zero horas…

Foda-se, és sempre a mesma merda.

Cala-te e não percas o caderninho onde desenhei e cataloguei os teus ossos…

Até já, amigo.

 

 

 

15/11/2023