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quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Nos braços dos plátanos as torres de cartolina

- Não sei, não sei

diluídas as imagens que das tuas mãos semeavam nas planícies mentais e longínquas dos oceanos de brincar as palavras murchas que o tempo engolia juntamente com o relógio em forma de cuco suspenso na parede velha da sala de jantar, não dormia, alimentava-me de sorrisos e coisas poucas que me traziam da cidade em ruínas, mãe tão feliz se o mundo terminasse dia 21 de Dezembro, sentava-me no ritz club, embebedava-me de luzes e de sombras, e esperava por ti, e esperava até que o último pedacinho de poeira assentasse sobre os meus ombros, esperava por ti, tu dentro da lentidão que parece que não vais regressar, Falta muito?, Estamos quase, dois ou três quilómetros entre o coração do Douro

- e as imagens a preto e branco que

o Outono tecia os cortinados que cobriam os socalcos antes da tarde se extinguir num pequeno gemido de luz, curvas, curvas e carris desencontrados até nos perdermos nos paralelepípedos que a morte tinha reservado para nós,

- não sei, não sei se conseguirei imaginar as crateras dos teus desejos dentro do meu corpo empobrecido, velho, casmurro o raio do homem das barbas brancas com uma cabeça de xisto, enxada na algibeira, dos olhos o fumo circunflexo da paixão que as árvores alicerçam no perfume invisível do rio Douro

estamos quase mãe,

- não sei, não sei,

uma chuva miudinha de pedras começou a diluir-se nas fotografias que das tuas mãos semeavam nas planícies mentais e longínquas dos oceanos de brincar

- não sei, não sei mãe tão feliz se o mundo terminasse dia 21 de Dezembro, sentava-me no ritz club, embebedava-me de luzes e de sombras, e esperava por ti, e esperava até que o último pedacinho de poeira assentasse sobre os meus ombros, esperava por ti, tu dentro da lentidão que parece que não vais regressar, e tu,

nunca regressavas, estamos quase mãe, depois daquela curva lá ao fundo vês? É ali, É ali, E tão longe dizias-me mentalmente quando me olhavas, não sei, não sei,
as torres de cartolina que tardes inteiras desenhavas e cortavas com a tesoura de costura lamentavelmente moribunda, com ferrugem como os barcos que ele me levava aos Domingos em visitas rápidas à enfermaria, coitados, coitados, não sei, não sei, eles tão tristes, com lágrimas nos olhos,

- e tu caminhavas asperamente de cortinado em cortinado, e tu, e tu de janela em janela, chamavas-me, gritavas-me, Falta muito?, Não, não sei, não sei, não sei se conseguirei imaginar as crateras dos teus desejos dentro do meu corpo empobrecido, velho, casmurro o raio do homem das barbas brancas com uma cabeça de xisto, enxada na algibeira, dos olhos o fumo circunflexo da paixão que as árvores alicerçam no perfume invisível do rio Douro

as torres tombavam nos braços dos plátanos,

- o Douro abandonava-nos a cada dia que passava, e as fotografias onde aparecias travestida de sombras com plumas e lantejoulas tremiam na geada solitária das noites que só o inverno consegue imaginar, não tínhamos lareira, e obrigavas-me a aquecer as mãos na velha torradeira que trouxemos de Luanda, nada mais sobrou de nós, não sei, não sei

sentava-me no ritz club, embebedava-me de luzes e de sombras, e esperava por ti, e esperava até que o último pedacinho de poeira assentasse sobre os meus ombros, esperava por ti, tu dentro da lentidão que parece que não vais regressar, Falta muito?

- e respondia

não sei, não sei mãe.

(texto de ficção não revisto)

@Francisco Luís Fontinha