Um pouco tarde para quem acaba de perder a casa, a
vida, os olhos livres que mergulhavam nos lábios sangrentos dos
telhados de vidro, um pouco ou nada, ou tudo, porquê? Muito perfeito
como os diamantes das cansadas videiras sobre as mesas de xisto com
vista para o rio Douro, cansei-me deste rio tristemente aprisionado
numa fotografia esquecida na parede da cozinha, lá fora, há um
distante silêncio que atravessa as lâmpadas incandescentes dos
braços da água, aos poucos, poucos, quando chegas a casa e eu
tristemente, aos poucos, lá fora, esperando o desespero de uma
sandes de queijo com azeitonas e vinho, um pouco, tarde, perde-se a
vida crescida nas leituras litúrgicas dos candeeiros a petróleo,
gargantas ocas que flutuam no susto meteorológico das dentaduras com
sílabas de prata, e quando percebíamos, ouvíamos um pigmeu
cambaleando nas pedras desordenadas da calçada, um
Hoje vi a mais linda flor dos meus últimos minutos
de silêncio junto a um chafariz, por sua vez, este, junto, a uma
árvore, por sua vez, todos e ela inclusive, no centro de um largo
com cerca de três metros e cinquenta centímetros de Raio, talvez
mais, ou pouco, um
Ou dois, o chafariz e a árvore, esperavam o
autocarro, a flor, provavelmente esperava pela minha passagem, todos
os dias, uma vezes vou como sou, outras disfarçando-me de vento, mas
vou, e passo lá, e vejo-a, com sete pedras em placas finíssimas
como o fios de geada pela madrugada, o telegrama esperava-me, e ela
olhou-o como se ele fosse um pedaço de aço aos tropeções pela
cidade dos anjos caídos, mortos de cansaço como as pessoas de bom
senso, dizem que estou mais mal educado, pudera, um
Não percebi,
Onde estão os sonhos prometidos? Não sou rapazola
para fazer promessas que não posso cumprir, e as cumpridas vontades
do povo encurralado nas compridas camas espalhadas pela montanha do
círculos com árvores e chafarizes no centro, em redor, uma
Flor linda com pétalas de cristal, estava só e
provavelmente esperava o autocarro da carreira, ou, pela passagem do
machimbombo da catorze horas, um rua curva, estreita, como os seios
metafóricos das tuas palavras em ressonâncias magnéticas, oiço-os
quando viro levemente à direita, e sinto, sei que da esquerda, um
Comboio fantasma alerta-me que no final da linha,
quando chegar ao apeadeiro em ruínas, um
Círculo, uma árvore, um chafariz e uma flor, sem
que eu perceba, o que é uma flor linda com pétalas de Cristal, o
que faz ali, porque está ali, de onde é e para onde vai, se se pode
saber, sem o descaramento de o Cristal das pétalas estilhaçarem-se,
e os braços da prata geada solidificarem-se, sós, como todos os
dias quando chego ao final da linha, poiso os carris sobre a mesa, e
da marmita oferecida pelo Excelentíssimo Senhor D. Joaquim Francisco
de Francisco e Fernando Domingos de Solidão com Insónia, os meus
pais diziam-me
Cumprimenta o Senhor,
(e eu comprimentava, e eu fingia-me de morto para
não ouvir as preguiçosas mangas de camisa do dito Cabrão que todos
os dias fazia questão que eu, quando estivesse no alcance do seu
mais secreto círculo, me humilhasse, me
Boa tarde Excelentíssimo Senhor D. Joaquim
Francisco de Francisco e Fernando Domingos de Solidão com Insónia,
e ele umas vezes parecia um pedaço de rocha, outras
Vai com Deus meu rapaz, vai com Deus),
E educadamente cumprimentava o dito Cabrão com
olhos de açúcar e recheados com amendoins importados das
ex-colónias nunca nossas, como aprendíamos na escola, como aprendi
com outro rapazola que a terra de facto é de quem a trabalha, mas o
fruto, esse, pertence a quem o colhe, sempre foi assim, é assim com
os pássaros negros dos finais de tarde, foi assim com os pedaços de
cartolina onde eu desenhava laranjas e limões, e cidades como
petroleiros flutuantes antes de regressarem os loucos ruídos das
noites embebidas em pequeníssimos círculos, curtos, curtos cada vez
mais, até que a árvore e o chafariz e a linda flor com pétalas de
Cristal, apenas um
Ponto,
Final
Sem paragrafo.
(ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha