domingo, 11 de dezembro de 2022

Poucos dias um dia

 



Perguntavas-me o que eu queria ser

Um dia.

Olhava-te

Olhava-te e fixava o meu olhar no céu

E nunca tive coragem de te responder;

E tivemos muitos dias

Só eu e tu

Só tu e eu

E mesmo quando te vi a voar

Sobre as nuvens envenenadas da tristeza

Eu

Eu não tive coragem de dizer-te

Apenas

Que não queria ser nada

Ninguém.

 

Mãe

Simplesmente não quero ser nada

Ninguém;

Percebes?

 

Podia ter sido muita coisa

Umas boas

Outras más

Poderia ter sido estilista

Carpinteiro

Pedreiro

Agricultor…

Não

Nunca gostei da agricultura

Poderia ter sido serralheiro

Motorista não

Não

Nunca gostei muito de automóveis

Camiões

Não saí aos meus avós e pai

Eu era mais barcos

Poderia ter sido tanta coisa…

 

E hoje escrevo

E enquanto escrevo

Sei que não sou nada

E enquanto pinto

Nada sei que serei.

 

Também nunca quis ser o que não podia ser

Tão pouco

Se queria ser

E no entanto

Aqui estou

Não sendo nada

Preferindo o nada ao tudo

E mesmo que seja muito

É pouco

É nada.

 

Aquando me olhavas

Eu

O comandante deste navio

Mentia-te;

E enquanto esperavas uma simples resposta minha

Eu

Fintava o olhar

E distraidamente

Respondia-te;

Está tão lindo o céu de Luanda mãe.

 

 

 

 

 

Alijó, 11/12/2022

Francisco Luís Fontinha

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