sexta-feira, 12 de janeiro de 2024

Primavera

 

É Primavera nos teus lábios

Florescem as rosas e os crisântemos

Brincam as andorinhas de papel

Corre o rio para o mar

E o mar inventa no teu olhar

 

O poema que a manhã faz acordar

É Primavera nos teus lábios

As crianças dançam à volta da árvore

Os pássaros desenham círculos no final da tarde

Antes que regresse a noite

 

É arte

É Primavera nos teus lábios

É a mulher que chega a casa cansada

Que às vezes é espancada

Que às vezes fazem dela uma bolha de pancada

 

É Primavera nos teus lábios

É o dia

É a noite

É a primeira lágrima do amanhecer

É Primavera nos teus lábios

 

É a Primavera a nascer

É Primavera nos teus lábios

É a ponte para a outra margem

É a seiva da videira

Em viagem.

 

 

12/01/2024

Podia ser

 

Podia ser o trigo

Nas mãos do moleiro

Podia ser aquilo que digo

Escondido no celeiro,

 

Podia ser um rio de espuma

Podia ser a manhã em liberdade

Podia ser a bruma

Podia ser a saudade,

 

Podia ser o teu cabelo abraçado ao vento

Podia ser o pão

Podia ser o alimento,

 

Podia ser o mar

Nas horas de solidão

Podia ser o trigo nos olhos do luar.

 

 

12/01/2024

quinta-feira, 11 de janeiro de 2024

Não sei

 

Não sei se são pássaros

Não sei se são margaridas

Não sei se é o vento a soprar

Ou mãos erguidas

 

Não sei se é deus

Não sei se é o mar

Não sei se é um barquinho em miniatura

De brincar

 

Não sei se são pássaros as tuas mãos entrelaçadas

Não sei se são pedacinhos de luar

As tuas mãos amordaçadas

 

Não sei se é dia

Não sei se é apenas o dia a cantar

E a declamar poesia

 

 

11/01/2024

Em frente ao Douro

 

Arrecado a cânfora manhã que há em ti, pego nas tuas mãos e olho-as como se fossem um pedaço de xisto,

Em frente ao Doro, cada socalco dos teus seios,

É um deslumbre,

É a manhã ao acordar,

 

Em frente ao Douro,

Cada curva deste rio é uma curva do teu corpo, é o diamante dos teus olhos,

Em frente ao Douro, a cânfora manhã que há em ti,

É erguer-se perante Deus,

É a noite a despedir-se dos bêbados,

 

Em frente ao Douro, misera enxada em busca de pão,

Quando o nevoeiro e a geada,

Quando o teu cabelo se entrelaça

Na madrugada,

E o meu coração

Fica refém da cânfora manhã que há em ti.

 

Em frente ao Douro.

 

 

11/01/2024

O vento

 

O vento vai

O vento vem

O vento traz

Outro vento também

 

O vento vai

O vento vem

O vento é capaz

De levar o mar até ao Além

 

E trazer

Outro vento também

 

O vento vai

O vento vem

O vento é perspicaz

Nos olhos de alguém

 

O vento vai

O vento vem

O vento é sacana

E é sínico também.

 

11/01/2024

Incêndio pétala

 

Mordo os teus lábios

Noite incêndio pétala

Mordo os teus lábios

Silêncio infinito que apenas o desejo conhece

Escrevo em ti

Tudo aquilo que me apetece

Que te amo

Que te desejo

E que me aqueces

 

Escrevo em ti o meu desejo

Disfarçado de mendigo

Escrevo tudo aquilo que me apetece

Tudo aquilo que eu digo

Mordo os teus lábios

Seara loira dos ventos emergentes

Trigo do teu sorrir

Morder os teus lábios

E partir

Em busca do mar

E de novas gentes

 

Mordo os teus lábios

Meu amor

Mordo os teus lábios enquanto escrevo enquanto fumo enquanto bebo…

Enquanto me sento em frente à lareira

Enquanto leio

Enquanto te olho

Enquanto me abraço a esta ribeira

Deusa míngua das manhãs de Inverno

Manhãs em que penso

Que a minha vida sem ti era um Inferno

Era um poço fundo e escuro

 

 

Mordo os teus lábios

Gaivota que voa sobre as sílabas da cidade

Flor que dorme neste jardim

Quentinho e perto de mim

Mordo os teus lábios

Madrugada que me acorda

E me pede

Que escreva nela

Que semeie cada palavra

Em cada pedacinho de pele

Como o faço

Quando te deitas nos meus braços

 

Mordo os teus lábios

Meu amor

Abro a janela

E vêm a mim todas as estrelas do céu

Depois

São os planetas são os buracos negros e são os teus lábios

Enquanto os mordo

Mordo os teus lábios

Meu amor

Mordo os teus lábios.

 

 

11/01/2024

Saudade

 

Somos duas crianças

Na noite em brincar

Somos duas pétalas de rosa

Nos lábios de amar

 

Somos o poema e a prosa

Nos olhos do luar

Somos a lua somos o sol

Nas lágrimas de chorar

 

Somos duas crianças nos lábios da paixão

Somos dois pedacinhos de medo e ansiedade

Somos o pão

 

E o vinho de comemorar

Somos duas crianças em saudade

Quando a saudade é o mar.

 

 

11/01/2024