quarta-feira, 25 de janeiro de 2012


59,4 x 84,1 – Francisco Luís Fontinha

59,4 x 84,1 – Francisco Luís Fontinha

Regressar

Toda a minha vida sonhos,
Sonhos e alguns impossíveis de realizar, mas há um sonho que nunca deixei de acreditar, há um sonho que não me deixou morrer,
Não sei se é doença mas a verdade é que sou um inadaptado, e nunca, nunca consegui superar a separação de Luanda e vivi sempre emerso em angustia e dor,
Dentro de mim existiu sempre algo a puxar-me e sempre acreditei em regressar à terra onde nasci, e acredito que vou conseguir,
Ter a nacionalidade angolana e regressar.

Algibeira da morte

Entras-me no sangue
E caminhas nos túneis em plástico que dormem sobre a mesa-de-cabeceira
Entras e extingues-te como uma andorinha
Ao terminar a primavera

Desces cansaço embebido em drageias de néon
E um rio de sémen na algibeira da morte
Agarra-se aos meus braços e leva-os para a montanha
Povoada de ossos

É noite
E entras-me no sangue
E caminhas…

Fumo os últimos cigarros
No corredor longínquo
Onde passeiam petroleiros e plátanos desiludidos com a vida
E o que farei depois de terminarem os cigarros?
E quando a montanha deixar de ser a montanha…
O que farei?

É noite
E entras-me no sangue
E caminhas…
E todos os componentes metálicos do meu corpo
Abraçados à ferrugem
O que farei quando deixar de ter cigarros?

E quando a montanha deixar de ser a montanha?
O que farei dentro da montanha
Com ossos
Sem árvores
Sem cigarros…
Na algibeira da morte

Fumar no interior do automóvel

Proibição de fumar no interior do nosso próprio automóvel, e eu que sou doente (viciado em cigarros) não posso usufruir de um prazer, de outra coisa qualquer para os outros.
Onde está a legitimidade de os outros condicionarem aquilo que faço ou não faço dentro do que é meu? E qualquer dia nem dentro da minha própria casa posso fumar, e se há pessoas que não suportam o cheiro do cigarro, também eu não suporto o aroma de perfumes, porque sou alérgico, e mesmo assim não posso proibir aqueles que os usam de os não usar.
Proibição de quecas dentro do automóvel? Provavelmente qualquer dia um parvalhão qualquer vai dizer que é maléfico para a coluna, ou que sexo dentro de casa só uma vez por mês, e portanto este país está a tornar-se doente mentalmente.
Sou ateu; Qual a minha legitimidade de obrigar aqueles que acreditam em deus em não acreditar, só porque eu não acredito?
Pois eu continuarei a fazer aquilo que sempre fiz, quer seja dentro do meu automóvel ou dentro de casa.
O cigarro provoca o cancro. E o que têm vocês a ver se eu morrer de cancro? Vou dar despesa ao SNS, mas eu em cada maço de cigarros já estou a pagar para o SNS. E os alcoólicos? Não dão despesa ao SNS?
Criminalidade por problemas de álcool tenho conhecimento, por fumar cigarros penso não existirem…

Espelho


59,4 x 84,1 – Francisco Luís Fontinha