terça-feira, 1 de outubro de 2024

O regresso sem embarque

 

O peso da dor

no corpo do enforcado

dos silêncios de luz o amanhecer

(uma criança chora docemente)

nos uivos das manhãs sem cortinados

beijos do pequeno-almoço

na distância ao vento

e o enforcado abraçado

ao barco da saudade

 

o regresso sem embarque

 

a miúda com flores na cabeça

pinta as lágrimas do enforcado feliz

no jardim da miséria

 

o peso da dor

em liberdade condicional

 

dentro do corpo

o enforcado no silêncio das tardes de Verão

a praia alimenta-se de bebidas exóticas

e bolachas com chocolate

e cigarros imaginários

nas angustias do medo

do medo de não terminar a viagem

não regressar

 

regressar

à praia onde poisam os barcos de papel

e brincam os papagaios de abelha

no pólen da Baía de Luanda

as palmeiras seguram o enforcado

com os olhos das gaivotas

e as mãos dos imprevisíveis horrores

antes de partir o comboio da tristeza

hoje

hoje sem regresso

hoje

e regressar para quê?

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