Desenhaste-me nas
esfinges manhãs de Inverno
procuraste uma tela vazia
construíste-me em mendigo
acrílico com coloridos ombros de porcelana
pintados à mão,
(Fui o que nunca quis ser
sou tudo aquilo que tu
nunca quiseste que eu fosse...)
Desenhaste-me em murais
que ultrapassavam os edifícios em ruína na cidade das gaivotas
sentei-me em ruas onde
tudo se vendia
o corpo flores drogas
álcool e amores
livros e papel de
embrulho
desenhos e merdas sem
sentido
porcarias vãs
vadias entre as pernas
alicerçadas aos tambores de choque
envaidecias-te
eras nobre como uma
donzela puta de adorno...
e os jardins cansavam-se
de ti como velhos sorrisos
sonâmbulos das ínfimas
janelas
e entrava-nos na sala de
jantar o enfeitiçado mar...
Um cheiro horrendo
barcos vomitando saliva
esbranquiçada
lágrimas
e muitas estrelas
todas elas
embriagadas,
Desenhaste-me como se eu
fosse um boneco de palha
um cabrão mal vestido
de fato
gravata
e sapato bicudo afiado
reluzente como um espelho da feira popular...
chorudas mulheres de
açúcar
dormindo em roulottes
como gazelas em sexos murchos que os finos pinheiros de Carvalhais...
lançam
deixam ficar sobre a tua
pele...
todas as palavras de
adeus...
Adeus
Até nunca mais me
desenhares nos murais das montanhas de aço,
Desenhaste-me nas
esfinges manhãs de Inverno
procuraste uma tela vazia
construíste-me em mendigo
acrílico com coloridos ombros de porcelana
pintados à mão,
(Fui o que nunca quis ser
sou tudo aquilo que tu
nunca quiseste que eu fosse...)
Desenhares-me invisível
sem saberes quem sou
como penso
vivo
se tenho sonhos
consegues perceber os
meus lamentos?
Fui tanta porcaria...
cavaleiro
donzela
prostituto
pintor
escritor
abelha tonta tonta como
ela... ela tão bela...
e tudo porque me
desenhaste nos murais das montanhas de aço,
E poeta não o sou
talvez o seja quando se
apercebe em mim um silêncio de loucura
devaneio
os peneirentos pássaros
que as arcadas do desassossego escondem
constroem e inventam
insónias em papel como pobres flores de arremesso...
Desenhares-me em toda a
porcaria livre
nas calçadas
nas ruas e ruelas
cansadas...
desenhas-me como se eu
fosse um esqueleto de amêndoa
suspenso nas três horas
da madrugada...
nas calçadas
ruas
e ruelas
sou
nunca o fui
desejo-o como se ele
fosse um abutre de asas cinzentas,
Sou
fui nunca
poeta pintor escritor
porque nunca deixei de o ser...
malabarista de primeira
classe... diplomado.
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