quarta-feira, 17 de abril de 2024

Um poema no meio da noite

Um poema no meio da noite

Quando tu és a noite

E eu sou a tua insónia

 

O alpendre

Não entende

Que metade de mim é vento

E a outra metade

É água

 

E que uma das metades é o sono

E a outra meia metade

É o mar

E a outra meia metade restante

Um barco nos teus lábios

 

Um poema no meio da noite

Metade da metade

Mais meia metade

Da tua noite

Da minha noite

Um poema no meio da noite

 

(Francisco – 17/04/2024)

O que é o amor, meu amor?

O que é o amor, meu amor

Quando a flor que desenho para ti

Senta-se sobre a secretária, olha-me

E pergunta-me,

Poeta, o que o amor?

 

O poeta sabe

O que é uma flor…

Agora, o amor…?

O poeta não o sabe!

 

O que é o amor, meu amor

Quando o amor são quatro pétalas no meio de um caderno

Quando o amor é os teus olhos, é as tuas lágrimas

Quando o amor são quatro pétalas

No jardim dos teus lábios

 

O que é o amor, meu amor?

 

(Francisco – 17/04/2024)

o teu rosto

parte-se o espelho onde antes tinha o teu rosto, e hoje são mil pedacinhos, do teu rosto

néon sabor na boca da alvorada, mergulha o peixe na salsa, acorda o manjerico

e o espelho quebrado na frigideira, em pequenos loiros, na pele adocicada da tua mão

milhafre, profundamente só, sobre a paisagem

 

o espelho, agora, é uma janela, uma fresta no teu peito

de onde oiço o vento

onde escrevo as lágrimas floridas do amanhecer

sabendo que o teu rosto nunca será o espelho do teu rosto

 

sabendo que o teu rosto nunca mais o vou ver

como o via

no espelho que está no corredor

e parte-se o espelho onde antes havia uma lágrima, onde antes havia um sorriso e uma jangada de silêncio

e hoje

é um vazio na parede

e mais nada

 

 (Francisco – 17/04/2024)

terça-feira, 16 de abril de 2024

Arquitectos da insónia

Aqui pertenço aos arquitectos da insónia, cidades inteiras sem dormir, como eu, escondido dentro de uma pétala de rosa,

Sozinho, o sono não vem, sozinho o vinho do vizinho, só, esta pétala de rosa,

Que toca piano

Escreve prosa

E às vezes

É Ranhosa

 

Aqui pertenço e aqui me sento perante vós, leitores e leitoras cá do burgo, e se amanhã é quarta-feira, tudo indica que um arbusto vai morrer junto à calçada,

Onde também irei morrer, quando tiver de morrer…

Só espero que Deus não se esqueça de mim, e me deixe cá andar por muito tempo,

Não,

Não ia gostar

 

De me sentar e ver o mar

De erguer um braço e pedir ajuda

Não me ausentar

Nem sentar

Numa Calçada,

 

Numa jaula de sémen, as pedras balançam e são fabricadas três mil bolas de queijo a cada noite,

E aqui estou neste ausentado medo de me ausentar e fugir e só parar quando a lua desse à luz

Uma linda menina,

Loira, esperta…

Sabe lá Deus o que é a vida e o que é o sofrimento

 

Não sabe nada

Aqui pertenço, aqui me sento e fumo o meu último cigarro da noite, talvez do dia, talvez o derradeiro e último cigarro

Aqui me sento aqui enlouqueço e, no entanto, temos lulas grelhadas e batatinha da nova

Cozida

As bebidas são por conta da casa

As putas são assim

Acena-se-lhe com uma nota e, caem todos os plátanos da avenida, alguns de tédio, outros devido à idade

Outros estão a ser expulsos

 

Aqui estou, aqui me sento e olho o mar, e pesco qualquer coisa para comer, mesmo que sejam algumas sobras do poema, que ficam sempre algumas palavras, como as manchas de chocolate no rosto das crianças

Aqui me estou sentado que o verso começa a descambar, a descer a montanha e daqui a pouco me vou ou voi

 

Sei lá onde

Se aqui estou, se aqui me sento, me alimento, aqui tenho o desejo sexual e aqui tenho os ventos que me irão trazer o sono

Um dia

Que aqui esteja

 

E QUE ME VÁ OU QUE ME VOI À MERDA

 

(Francisco – 16/04/2024)

Palavras

Se ao menos as tuas mãos me dissessem como se chamam as tuas mãos…

De que cor são os teus olhos…

Se ao menos os teus lábios me dissessem como se chama a tua voz, depois da meia-noite…

Se ao menos as palavras… fossem flores

E não palavras.

 

(Francisco – 17/04/2024)