quinta-feira, 30 de novembro de 2023

 

Para onde vai esta flor que tropeça no meu caminho

De onde vem esta flor que tropeça no meu caminho

Como se chama esta flor

Que atrapalha o meu caminhar

Para onde vai

Esta flor

Com olhos de chorar

Escritor

 

Quem escreverá tudo isto

Quando escrevo com as minhas mãos

Todas estas palavras

Todas estas canções

Quem escreverá tudo isto

Tudo isto que eu escrevo

Tudo isto que não me pertence

Quem escreverá tudo isto

Tudo isto que me vence

 

 

30/11/2023

Dia

 

Escondo-me do dia

Enquanto o dia

Não é dia

Escondo-me no dia

Quando ao meio-dia

Me dizem

Que amanhã nascerá um novo dia

 

Escondo-me do dia

E de tudo que tem o dia

Depois peço ao dia

Que um dia

Um qualquer dia

Também eu seja dia

 

 

30/11/2023

quarta-feira, 29 de novembro de 2023

O teu rosto

 

No teu rosto, insígnia adormecida dos tempos de cólera, no teu rosto

A sílaba perdida do poema que o poeta escreveu à manhã.

No teu rosto, o sorriso da noite quando traz consigo a lareira da paixão, e o teu rosto, alicerça-se ao primeiro pingo de chuva,

Quando se erguem as margaridas deste jardim.

 

As luzes da rua, acordam do sonâmbulo dia, o teu rosto, esconde-se no

Meu rosto,

E a maré sonolenta, e a maré, enfeitiçada pela Aurora Boreal do teu sorriso, imagina no teu rosto um pedaço de sono,

 

No desejo da insónia,

 

Do teu rosto.

 

No teu rosto, ó meu amor, as sanzalas em brincadeira de criança, do teu rosto, quando penso na escuridão, e dou o triplo salto para o abismo,

Fecho os olhos, pego no teu silêncio, e sinto o teu rosto juntinho ao meu, e sinto a Primavera quando transporta na algibeira, as andorinhas, e do outro lado da rua, fica a casa, a casa onde escondo,

 

O meu rosto,

Do teu rosto.

 

No teu rosto, insígnia adormecida dos tempos de cólera, no teu rosto

A sílaba perdida do poema que o poeta escreveu à manhã.

Do teu rosto me escondo,

No teu rosto, deixo ficar, o meu rosto

 

E finjo dormir.

 

E desenho o teu rosto, no meu rosto, e desenho a tua mão, na minha mão

E depois da ausência, o mergulho no cacimbo, junto ao rio,

Daquele rio de que me escondo,

Do meu rosto,

No teu rosto

Este meu poeta com asas de avião, deste pobre poeta, do teu rosto,

O dia,

Em poesia.

 

No teu rosto.

 

Do teu rosto, a madrugada traz a palete de cores que o poeta vai deixar cair, aos pedacinhos, na tela sem nome, na tela vazia, vazia como a claridade lunar;

Finjo dormir.

Durmo no teu rosto.

 

Do teu rosto,

Mergulho, como descrevi à pouco, mergulho no cacimbo junto ao rio, mas que rio é este, este rio que não conheço, e este rio que também não conhece o teu rosto,

Neste rio de água cinzenta, na frescura paixão quando o pôr-do-sol corre para o mar,

E deixarei de ver o teu rosto.

 

Finjo, finjo dormir.

 

No teu rosto, insígnia adormecida.

 

 

29/11/2023

Papeis

 

Se estes papeis falassem, se estes papeis me dissessem alguma coisas, se alguma coisa há para dizer,

Se estes papeis fossem a chuva miudinha, quando bate ao de leve na vidraça, e quando a vidraça indiferente à minha presença,

Olha a vidraça do outro lado da rua,

Se estes papeis fossem o sono, dormiria todas as noites, não sonhava todas as noites, se estes papeis conseguissem chegar ao céu, eu falava com Deus…

 

Se estes papeis, pelo menos uma vez na vida, me dissessem o que fazem nesta secretária, quem os mandou vir, e quem autoriza a sua permanência.

Se estes papeis me abraçassem, se estes papeis me beijassem, enquanto escrevo neles o último poema da noite.

Se estes papeis, me deixassem ir, com o vento, ao teu encontro, se estes papeis me dissessem alguma coisa,

Outra coisa qualquer,

Porque nunca passarão de papeis,

Qua ardem

Na lareira dos teus lábios.

 

Se estes papeis, um dia, morrerem,

Quero as suas cinzas,

Quero-os; mortos.

 

 

29/11/2023

Se tu morreres

 

E se tu morreres! O que farei com o teu corpo. O que farei com as palavras que em todas as madrugadas brinco, e lhes afago os cabelos,

O que farei com os sonhos, se tu morreres!

O que farei aos meus poemas, o que farei a mim, e a todas estas flores.

 

Se tu morreres!

O que farei ao sono, e aos filhos do sono, o que farei ao silêncio, se tu morreres, o que farei a todos estes livros,

A todos estes papeis,

Se tu morreres.

 

O que faço a estas mãos, se tu morreres! Contempla-las, imaginar que acariciam o teu corpo quando a noite é escura, quando a noite é uma lágrima de sono, e tenho tanto medo de que tu me morras,

E tenho tanto medo ao que possa acontecer ao teu corpo de tronco de árvore…

 

O que farei, se tu morreres!

 

 

 

29/11/2023

Esquecer

 

Esqueci o teu rosto, esqueci a tua boca,

Esqueci o teu cabelo, do loiro amanhecer,

Esqueci as tuas mãos,

E a vontade de te querer.

 

Esqueci o teu sorrir, esqueci o teu olhar,

Esqueci a solidão que a noite abraça,

Que a noite contempla,

Esqueci o mar,

 

E as limitações do meu viver.

Esqueci o teu corpo, dócil tronco de árvore,

Esqueci o luar,

E a razão de escrever.

 

Esqueci a vida.

Esqueci a rua onde vivia, esqueci o silêncio,

Esqueci o que devia esquecer e aquilo que não devia…

Nunca o ser.

 

 

29/11/2023