terça-feira, 17 de setembro de 2024

Porquê

 

Despeço-me de mim, despeço-me das coisas simples, despeço-me de todo o silêncio que construí,

Despeço-me deste cansaço, despeço-me deste esqueleto que transporto…

E do último abraço,

Às vezes, às vezes pareço o meu pai…

(no final da doença)

Que me questionava

Se era de dia

Se era de noite,

Depois dizia…

Sabes filho, já nem sei se é dia…

Já nem sei se é noite…

Tanto faz

Dizia-lhe eu,

 

Despeço-me das sílabas que lancei ao mar,

Despeço-me das palavras que escrevo…

Das palavras que escrevi…

Dos rabiscos

Da chuva,

Despeço-me das primeiras luzes da manhã,

Despeço-me da última estrela que me olhou…

E se esconde dentro de um círculo de luz com olhos verdes,

 

Despeço-me da solidão,

Ela despede-se de mim…

Trocamos um abraço,

Gravamos os nossos nomes dentro do nosso coração…

E partimos para esta invisível viagem,

Despeço-me da poesia,

Do dia,

Da noite,

Quando quase sempre a noite despede-se de mim,

 

Despeço-me da geometria,

De Deus,

E novamente,

Da poesia,

Que morra a poesia e este poema de “merda”,

Despeço-me da Terra e do mar,

E do mar e da Terra,

Despeço-me em silêncio,

Dos barcos da minha infância,

Despeço-me…

Sem saber o que é a despedida.

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