quinta-feira, 19 de setembro de 2024

e fui ficando a olhar os barcos imaginados

 

todos embarcaram na alvorada

excepto eu

que não quis partir

e fiquei a olhar os vidros vazios

nas árvores despidas

os cinzeiros recheados de teias de aranha

pedaços de tabaco

e asas de abelhas

cansadas do tédio

e avassaladas pelos sons dos livros

que durante a noite

em gritos minúsculos no jardim salpicam as árvores de mel

 

não quis partir

e fui ficando a olhar os barcos imaginados

nos sonhos da infância

num quintal infestado de mangueiras

e papagaios de papel

 

fui ficando

fui

excepto eu

ficando fui

e fui ficando a olhar os barcos imaginados

nos sonhos da infância

 

e nunca conseguir ler

as palavras que alguém escrevia

(durante a noite) nos céus de Luanda

… os barcos imaginados

e vómitos de saudade.

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