sexta-feira, 9 de fevereiro de 2024

Leite-creme

 

- Irene! Irene!

Sirva o leite-creme!

(Alexandre O'Neill)

 

 

Podíamos comprar o mar

Meu amor.

Podíamos desenhar o vento

Nas planícies lunares,

Podíamos escrever no sono

A tua insónia,

Os teus lamentos.

 

Podíamos correr em vez de te sentares

Podíamos mergulhar nas estrelas

E sermos pedaços de um peixe,

Dentro de um aquário.

 

Podíamos correr na praia

Ou podíamos nos esconder dentro de um armário…

E a troco de um mísero salário,

O poeta sofre

O poeta ama sofrer amando o sol.

 

Podíamos comprar o mar

Meu amor.

Podíamos amarrar as mãos à primavera

Podíamos dançar sobre a estrada,

Ou sobre o rio

Ou sobre a sombra

Ou sobre nada.

 

Podíamos pertencer aos ângulos obtusos

Decifráveis na madrugada,

E um pouco de tolo à nascença.

 

Um tanto eu

Este cigarro

Um tanto pouco de mim

Quando quero comprar-te o mar…

E tão pouco salário para ver o luar.

 Podíamos comprar o mar,

Quando te amo

Quando não te amo

Quando tenho medo de te amar.

 

Podíamos comprar o mar

Meu amor.

Podíamos comprar todas as palavras

Todos os sonhos

E todos os rios.

Podíamos comprar o mar

Meu amor.

Podíamos comprar a aurora boreal

Podíamos comprar a luz

A velocidade

Podíamos comprar um grama de sono

Ou um quilograma de azul.

 

Podíamos comprar o mar

Meu amor.

A justiça

Podíamos comprar a ausência

O nó

Ou a pedra-pomes.

Podíamos comprar uma ribeira

Ou uma montanha,

 

Ou o mar…

Meu amor.

 

 

09/02/2024

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