sábado, 30 de dezembro de 2023

Abelha

 

Devo sofrer de disfunção

Não do foro eréctil

Mas sim do movimento solidário em silêncio psicológico

Não sei se já sou tio

Mesmo que o fosse interinamente

Ficaria muto orgulhoso contente a gente

Quase a ser avô

Quase a ser nada quando comparado com tudo

É muito pouco.

 

Falando em interinamente

Também o fui

Como pai

Mas fui devolvido à procedência

A maré é de cocó

O triângulo equilátero que me assola

Não assombra

Mas assopra

Sobre o mar qualquer coisa de se comer.

 

Como-te saboreio-te acaricio-te olhar

Não te frito

Porque quando estou aflito

De te olhar

De te acariciar

Não consigo te fritar

Como-te delicadamente

E com o dedo e com a língua

Retiro de ti o açúcar e a canela

E não fosses tu uma “frita de Natal”

Eu diria que eras a nave espacial mais bela da galáxia.

 

Devo sofrer de qualquer coisa real

Isenta de impostos

Qualquer coisa que satisfaça o conselho indisciplinado da ausência…

Dizem que coifou os parafusos

E se coifou ou não coifou…

Só ele é que o sabe.

 

Devo estar louco

Devo estar quente

Sente

Um pouco

Enquanto nada parece cinzento

E a primeira lágrima

É uma albarda de sono.

 

Pinto-me de escuro. Afoito-me nestas camisas pálidas e sem nome

Provando memórias

Escolhendo por entre a fome

Os chifres esqueléticos das cabras

Quando procuram os gémeos das fotografias

E um pedaço de silêncio prateado

Desventra o seu corpo de miúça catanada.

 

Dançam as meninas de além.

Dormem os meninos de cá.

Escrevem os poetas de cima.

Suicidam-se os poetas do andar de baixo.

E mesmo assim

E no entanto

Devo sofrer de disfunção

Não do foro eréctil

Mas sim do movimento solidário em silêncio psicológico

Não sei se já sou tio

Mesmo que o fosse interinamente

Ficaria muto orgulhoso contente a gente

Quase a ser avô

 

De um poema lindo.

 

 

30/12/2023

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