Um dia, pesará mais um
silêncio do que a espada do desejo; esse dia chamar-se-á ontem. Todas as
palavras serão em papel e, todas as flores de carne-e-osso. As marés
pertencerão aos poetas pobres, como pertencem hoje, as latrinas da cidade.
Um dia, acordará a
saudade, um dia, levantar-se-ão todos os tetraplégicos da cidade, que hoje se
fazem transportar em máquinas voadoras, como fazem os pássaros, que um dia,
pertencerão todos ao passado.
Um dia, as árvores
morrerão de tédio, assassinadas pela ganância humana, nesse dia, os poetas
deixarão de ter sombra, nesse dia, as crianças serão apenas bonecos metálicos, comandadas
pela sombra.
Um dia, saberão que o
ontem existiu como existirá a manhã sombreada de silêncios e venenos comestíveis;
esse dia será o cansaço, a eterna despedida da madrugada.
Um dia, aparecerá sobre a
mesa-de-cabeceira a espada da solidão travestida de menina das alianças,
correndo debaixo das mangueiras, há muito extintas na saudade.
Um dia, todos os nomes
serão de cartão, todas as pessoas serão pinceis voando em direcção ao mar; um
dia, também pertencerei à saudade.
Um dia, pesará mais a
lâmina do destino do que pesam hoje as sílabas da infância.
Francisco Luís Fontinha
Alijó, 28/11/2021
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