sábado, 20 de junho de 2020

Hoje


Não tenho pressa de caminhar.
Não tenho na mão a pedra filosofal.
Não. Não percebo este rio a chorar.
Quando o cansaço laminado da manhã, sofre, vomita as palavras de Inverno.
Não tenho nos livros as tuas mãos quando o amanhecer acorda,
Não sei quantas pedras, hoje, tenho para atirar à tua sombra.
Não tenho a madrugada para chorar.
Não tenho as lágrimas para desenhar,
No chão abandonado pelo silêncio.
Não tenho a noite para dormir.
Não tenho o dia para sorrir.
Não. Não sei se hoje é dia para correr,
Chorar,
Ou morrer.
Não tenho as letras do teu sorriso,
Quando o sol ilumina os candeeiros do sofrimento.
Não tenho as imagens do mar,
Salvado pelo amanhecer.
Não tenho as sandálias dos pequenos alicerces da cidade dos Deuses.
Não. Não tenho pressa de caminhar.
Não me digam que hoje posso subir à montanha da despedida.
Não o vou fazer.
Porque hoje,
Hoje não tenho tempo para morrer.
Hoje não é o tempo da partida.



Francisco Luís Fontinha
20/06/2020

domingo, 14 de junho de 2020

A rocha envenenada


Sou uma rocha,

Que dispensa o sono,

Plantam-se rosas no seu sorriso,

Gritam-se silêncios de revolta,

Entre paredes amarelas e sem juízo,

Sentado no trono,

Correndo pela seara,

Sem ninguém à volta,

Sem ninguém no terreno,

Sou uma rocha,

Aquela palavra proibida,

Suspensa no livro sereno.

Sou tudo aquilo que possam imaginar,

Desde pedra a foguetão,

Desde verso a palavra envenenada,

Desde o mar,

À triste canção.

Sou.

Muros de xisto olhando o rio,

Cansaço,

O frio,

Sou socalco maltratado,

Corpo,

Ferro,

Enxada calcinada na sombra do Senhor,

Sou. Sou pedra.

Palavra desejada.

Enxada,

Veneno da madrugada,

Sou rocha,

Sou tudo,

Não sou nada.

 

 

Francisco Luís Fontinha

14/06/2020