sábado, 4 de janeiro de 2020


Eu sabia que era noite.
Percebia que as lâmpadas da saudade se acendiam pela primeira vez, e, no entanto, dentro de mim, uma simples constipação de palavras brincava num pequeno verso,
Triste, distante, eu sabia que era noite, e que os holofotes da desgraça vinham em minha direcção.
Esqueci-me de olhar o pôr-do-sol, não interessa, amanhã novo pôr-do-sol acordará, sem insónias, sem preguiça, como hoje, dentro dos lençóis iluminados pela tempestade de silêncio que se faz sentir dentro da casa, submersa em pequenos fios de nylon, e às vezes, não muitas, o poeta arrepende-se de ter escrito o poema; acontece quando o amanhecer é tardio, frio, ambíguo…


Francisco Luís Fontinha – Alijó
04/01/2020

sexta-feira, 3 de janeiro de 2020

Espelho do cansaço


Gosto,
Do teu perfume impregnado nas palavras do poema,
Quando o mar me chama,
Quando a maré me leva.
Gosto,
Do silêncio teu corpo,
Em delírio,
Dentro de uma cabana.
Gosto,
Dos livros que leio,
Das mãos que me acariciam,
E a madrugada ainda vem longe.
Gosto,
Do apito do petroleiro,
Fundeado nos teus seios,
Derramando gotículas de saliva…
Gosto,
E adoro,
Do significado transparente da tua sombra,
Quando o mar está bravo,
Quando o mar se veste de tempestade…
E morre com a saudade.
Gosto,
Da solidão das tuas mãos,
Porque, meu amor,
Gostar,
Pertence aos poetas,
Escritores,
Pintores…
Gosto,
De todos aqueles que amam,
Sofrem…
E sorriem,
Em frente ao espelho do cansaço.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
3/01/2020