quinta-feira, 11 de agosto de 2016

O infeliz da madrugada


O esplendido silêncio amargo do corpo

Nas frestas cansadas da solidão

O derradeiro sopro

Insignificante

Que abraça este desiludido coração…

Quando amanhece

E finalmente

Os teus braços me lançam na madrugada

E esquecem

Aquele que não conhece

Os sonâmbulos que aquece…

A alma infeliz e rasgada.

 

Francisco Luís Fontinha

quinta-feira, 11 de Agosto de 2016

segunda-feira, 8 de agosto de 2016


Dos murmurados alpendres onde me arrumavas os braços e as pernas depois de me usares,

Acordavas cedo, puxavas as cordas da noite e começava a clarear o dia, inventavas

Descobri tardiamente

Que inventavas os dias só para mim, como o jardineiro quando sente que uma fina pétala se desprende do esqueleto da Cinderela e também ele, inventa as espinhas que sobejaram dos peixes de madeira que a filha fez numa das aulas de Trabalhos Manuais, ele aprendeu a pregar botões e a fazer uma simples instalação eléctrica, e com algumas picadelas nos dedos de areia

Descobri tardiamente que não tinha jeito para invenções,

De areia como as línguas de fogo que começaram a descer dos telhados de vidro das casas dos mais enlouquecidos pasteis de nata, do Rossio até Belém, aproveitando o vento e o sabor a morango do rio, a cidade ia ficando-se

Como tu antes de inventares esse maldito espelho onde te olhas ao acordar, a janela do dia de ontem, onde vês o restaurante encerrado por falta de clientes, as cadeiras vazias onde se sentavam as galdérias noites e candeeiros a petróleo que a cidade rejeitava, ouvíamos um banco de jardim a passear junto à Torre de Belém, fumava cigarros de enrolar, tinha na cabeça um pano vermelho, e era alimentado por painéis lunares, e

Saltitava-lhe da voz

Todos Todas Adivinhos,

A rouquidão do prazer quando os mamilos da Cinderela, colorida com os lápis de cor da miúda, a filha da Rosalinda, chegava da escola, e poisava a mochila no pátio de gelo em frente ao pindérico jardim onde brincava um casebre empobrecido, de lata, e um olho em xisto, E

E

Saltitavam-lhe da voz as laranjas podres e os limões sem as palavras que tu

(Inventas no espelho, e no caixilho onde dorme o espelho, inventas no prego, onde penduras o espelho, e na parede, inventada por ti, inventas na sombra que escurece no espelho, onde te olhas, onde fumas, no cigarro inventado, pela secura do silêncio agachado no pavimento ósseo com ripas de fumo e pedacinhos de suor da tua pele perfumada, na água inventada, inventas com as tuas mãos as calibradas pálpebras (de) (da) madrugada, perdem-se nos sossegados momentos de literatura dentro da esplanada vestida como as roupas por ti, inventadas

Todos Todas Adivinhos).

 

In “Noites de mim”

Francisco Luís Fontinha