quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

Cinzento grito das larvas em silêncio


(desenho de Francisco Luís Fontinha)


Do grito cinzento do silêncio
às amarras vocais dos nocturnos desejos de pedra
ama-se um poema
odeia-se uma flor acabada de nascer
fuma-se o último cigarro
inventam-se esconderijos no corpo de uma mulher...
o relógio não cessa de chorar
o barco que transporta a solidão...
ancorado ao meu corpo desprovido de agasalho
do grito cinzento do silêncio
às amarras vocais dos nocturnos desejos de pedra
uma cova... funda... me espera!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 31 de Dezembro de 2014

terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Falsas partidas... (a merda do amor)


Falsas partidas
estas noites enfeitadas de neblina
o composto químico do amor
em construção
o homem desespera pelo regresso das palavras
o falso coração no habitáculo do desejo
esperando que uma das janelas do luar...
se parta
se extinga nas labaredas da tua pele
falsas
partidas
em... em construção.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 30 de Dezembro de 2014

Sombras de mármore e ossos...

(desenho de Francisco Luís Fontinha)


Há um beijo inventado
que habita nos meus lábios
há um corpo adormecido
em mim abraçado
há um poema no teu olhar
que transporta o cheiro do mar...
há uma ponte nos teus cabelos
quase a desmaiar,

o desenho no espelho embriagado,

há um livro nos teus seios
que não me canso de ler
e folhear...
há um desejo dentro desse livro que vive nos teus seios...
um desejo invisível
um desejo embrulhado em capim
e pedaços de cacimbo
há um beijo inventado
… nos meus lábios
em silêncio
a escrita cuneiforme
entre sombras de mármore e ossos...



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 30 de Dezembro de 2014


segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

Dentro de ti


Dentro de ti
a noite desventrada
nas palavras por escrever
o medo de dizer... “Amo-te”
quando amar é planar nos sonhos de uma montanha
onde poisa o teu corpo
onde... onde habitam as tuas mãos
dentro de ti
a noite desventrada
nas imagens imaginadas
por um louco que teima em não dizer...
“Amo-te”...



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 29 de Dezembro de 2014

Só... esta fogueira sem sentido

(desenho de Francisco Luís Fontinha)


O término do sono em constante sonolência,
a cabana do silêncio quase em ruínas,
violentas tempestades de palavras,
gritos e lágrimas,
em revolta...
como se existisse entre nós uma fogueira,
abandonada,
e... e só!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 29 de Dezembro de 2014


domingo, 28 de dezembro de 2014

Não tempo para amar

(desenho de Francisco Luís Fontinha - Alijó) 



Não tenho tempo para amar...
como se para amar fosse necessário tempo,
ser amado,
pertencer ao vulcão das tempestades,
não sentir
sentindo...
o desejo das palavras,
o significado das cidades de gelo,

não tenho tempo para ser amado...
o amor é um rochedo construído de velhos farrapos e alguns pedaços de aço,
o amor são esqueletos de papel...
no coração de uma mulher,

não tenho tempo para amar...
como se para amar fosse necessário tempo,
ser amado,

os sítios proibidos dos rios do teu ventre,
o medo de amar-te...
quando eu sou apenas uma imagem,
tão velha... tão velha como os candeeiros das ruelas viciadas,
tão velha... como as ruas da minha infância,
o triciclo em queda livre,
a sombra das mangueiras poisadas no meu sexo...
e eu, e eu sem tempo para amar...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 28 de Dezembro de 2014


Os poemas ao fim da tarde


Os poemas ao fim da tarde
este mesquinho silêncio
quando entra pela janela
e lá fora
um barco em espera
esquelético
cansado
farto do mar...
os poemas ao fim da tarde
com fome de matar
a voz do teu clitóris em tristes soluços na madrugada
os poemas ao fim da tarde... são poemas de nada,
poemas... poemas de amar
o estranho invisível quadrado com sorriso de vidro
há nas palavras a força da revolta
o corpo em lágrimas
que só a cidade...
que só a cidade consegue absorver
os poemas ao fim da tarde
o vento de sémen contra uma árvore
e os pássaros dos teus cabelos
brincando na seara
entre pedras e enxadas
sempre... sempre, sempre que um relógio acorda... e ninguém sabes onde habitam “os poemas ao fim da tarde”.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 28 de Dezembro de 2014

sábado, 27 de dezembro de 2014

Eros sexo


O Eros sexo mergulhado nos lençóis da solidão,
o corpo em lágrimas de gesso...
a cidade em pedaços de vento,
o Eros sexo mergulhado nas janelas do Tejo,
a caravela do desejo regressando ao teu ventre,
os lábios da Princesa em cardumes beijos,
que só o mar sabe alimentar,
longe... o silêncio orgasmo das palavras não escritas,
longe... o abraço disfarçado de machimbombo...
voando como a gaivota do “Adeus”...
em pecado,
as palavras... o ventre... as coxas misturadas entre desenhos e sombras embriagadas,
e no entanto...
o Eros sexo... não pára de chorar,
o Eros sexo é o grito da noite depois de acordar.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 27 de Dezembro de 2014

Esta terra... que amo


Nunca percebi porque choravam os pássaros da minha terra,
nunca entendi porque em determinados momentos...
se abraçavam as árvores da minha terra,

desenhava o sol na velha parede da casa que me recebeu,
havia frestas de engano e vidros partidos,
lá fora o frio parecia um rochedo intransponível,
tão alto como a montanha da saudade,
nunca percebi porque era tão fria a minha terra,
esta...
que amo,
mas é tão fria... meu amor...!



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 27 de Dezembro de 2014

sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

Vida de marinheiro


Adoro esta vida de marinheiro,
sem porto para aportar...
nem coração para ancorar,
adoro esta noite,
apenas esta,
porque a solidão se entranha em mim como um vicio...
ou uma jangada de saudade,
adoro esta vida de marinheiro,
sem pouso,
sem... sem Oceanos para sonhar,
sem as amarras das palavras,
sem as ruas da cidade,
adoro esta vida de marinheiro,
sem glória,
sem vaidade para oferecer,
adoro
esta
vida
… de marinheiro...
com medo de sofrer,


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 26 de Dezembro de 2014

Lábios em saudade


Partiste sem que o orvalho poisasse em ti,
Levaste no corpo todas as minhas palavras,
E o calor das minhas mãos…

Lisboa estava dentro de nós,
E havia no Tejo um beijo embrulhado em pequenas velharias…
Uma feira,
Beijaste-me e começaste a voar,
Olhei e estavas ao leme de um paquete de papel,
Aquele que anos antes,
Uma criança…
Construiu para ti,

Partiste sem que o orvalho poisasse…
Em silêncio,
… até que a neblina te engoliu,

E todas as minhas palavras morreram
Na saudade dos meus lábios!



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 26 de Dezembro de 2014

quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

Sinto-me


Sinto-me um rouxinol sem voz,
uma árvore camuflada de silêncio
à procura da madrugada,

sinto-me um caixote de vidro
colorido
com mil sorrisos...
que só a noite sabe construir,

Sinto-me a canção abandonada,
a canção de amor,
sinto-me um rouxinol sem voz,
desanimado,
triste,
não amado,

sinto-me a página de um livro rasgado,
a seta que feriu o teu coração,
o arco,
a flecha...
sinto-me... sinto-me um barco sem estória.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
quinta-feira, 25 de Dezembro de 2014

Sombras de aço


Os orgasmos poéticos
quando do chão esfomeado
se levanta
a matriz
ouvem-se as vozes disformes das andorinhas em flor...
ouvem-se... as sombras de aço nos lábios de uma abelha!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 25 de Dezembro de 2014

Amas-me?


Havia um emaranhado de fios eléctricos dentro da sala de jantar, todos eles eram providos de rosto, voz... e esqueleto, sentia a cada desperdício de cerveja o regresso do Oceano meu coração, ouvíamos alguns sons melódicos que o Rui tinha adquirido em cinco suaves prestações, e a Madalena saciava-se com um livro de poemas,
Amo-te sem saber porquê...
Os poemas dançavam no ventre de Madalena, sentia cada palavra como se de um desejo se tratasse, ou de um orgasmo em despedida,
Amanhã vou caminhar depois do jantar, olhar as estrelas amantes da trigonometria, desenhar círculos de papel nas clarabóias da inocência..., e olhar-te, e olhar-te como se existisses, como se fosses um texto de ficção dentro da fogueira,
A lareira sonolenta abraçava-se aos teus seios,
Amo-te sem saber porquê...
E eu sabia que nos teus seios apenas habitavam as minhas mãos de porcelana,
A morte em pequenos assobios,
As horas em agonia num relógio de parede,
E eu sabia que nos teus seios...
Texto de ficção?
Em quadriculas, os números agoniados e agachados junto ao capim do quintal, nunca tinha olhado o Sol depois das cinco da tarde,
E eu sabia que nos teus seios...
Texto de ficção?
E mesmo assim, deitado debaixo das mangueiras... imaginava petroleiros a entrarem dentro de mim,
tive medo, senti o primeiro beijo, a primeira carícia, o primeiro e derradeiro contacto, os lábios deixaram-se apelidar de Amor,
Amas-me?
O amor, os poemas dançavam no ventre de Madalena, sentia cada palavra como se de um desejo se tratasse, um orgasmo em despedida, os gemidos dos poemas inseminados nas páginas abandonadas de uma velha folha de papel, a caneta de tinta permanente... pesadíssima, as correntes do teu olhar acorrentavam-me, deixei de sentir os braços, as pernas, o... o amor,
Amas-me?
Deixaram-se apelidar de Amor,
Havia um emaranhado de fios eléctricos dentro da sala de jantar, os fusíveis dos meus sentimentos... ardiam, e percebi que nunca mais conseguiria perceber o Amor,
Amas-me?
E eu sabia que nos teus seios...
Texto de ficção?
Não revisto, não lido, não...
Não percebo as palavras que escrevi na tua pele de marginal semeada de palmeiras, barcos encalhados e... e gaivotas.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 26 de Dezembro de 2014

quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

Ruelas e calçadas


Come-me noite vadia
dos silêncios torturados,
come-me mar doentio
dos abraços forçados,
das ribeiras apaixonadas,
come-me...
noite vadia
das ruelas e calçadas,
filho da cidade em chamas,
come-me sanzala recheada de sombras,
aranhas,
e...
come-me,
come-me como se eu fosse um pedaço de erva seca
voando na seara do adeus,
come-me,
come-me... feiticeiro das nocturnas avenidas,
dos bares embriagados de meninas...
come-me,
come-me... luar desenhado na alvorada,
come-me noite vadia
dos silêncios torturados,
das tristes palavras em agonia,
come-me... rochedo de vento dançando no teu nome.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 24 de Dezembro de 2014

Tardes de Dezembro


Tínhamos no olhar o silêncio da noite
caminhávamos desordenadamente como dois pontos perdidos no espaço
procurávamos o invisível cansaço
que só as tardes de Dezembro conseguem alimentar
e no entanto
pegando na tua mão...
não havia luar
nem palavras na ardósia dos teus cabelos...



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 24 de Dezembro de 2014

terça-feira, 23 de dezembro de 2014

O que sinto...


O que me diz a morte
quando te entranhas em mim
e me alimentas com o teu calor...!

São as horas em cio
dos teus medos, das tuas recordações,
são as palavras em habitáculos de silêncio...
o que me diz a morte
quando te entranhas em mim
e me alimentas com o teu calor...!

O que penso,
sinto,
aquilo que não quero pensar...
nos meus sonhos em labaredas de nylon.

Prontas para amar...



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 23 de Dezembro de 2014

Os finais de tarde junto ao Tejo


(recordações de 1987/1988)


Deixei de te ouvir,
cessaram os lamentos dos teus lábios
que brincavam nos finais de tarde junto ao Tejo,
desenhávamos barcos no sorriso do pôr-do-sol...
e havia sempre uma bandeira poisada nos nossos ombros de granito,
deixei de te ouvir,
encostei a cabeça ao teu peito...
e juro... e juro que desde então oiço todas as manhãs o mar dentro de mim.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 23 de Dezembro de 2014

segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

Tâmaras


Caminhas sobre as tâmaras apaixonadas do deserto,
inventas-me num sorriso de areia húmida,
alicerças-te ao meu corpo quando o vento invade os teus seios...
e mesmo assim, para ti, sou apenas um desanimado,
um louco passeando no invisível,
o esqueleto que todos fotografam... e ninguém observa a fotografia que há em mim,
a desfocada imagem, sem olhar, com medo da paixão imensurável,
e dos peixes comestíveis,
caminhas sobre os meus ossos pérfidos,
sem inscrições,
apenas alguns algarismos vagueando nos meus lábios,
sem inscrições...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 22 de Dezembro de 2014

Lágrima de fogo

(desenho de Francisco Luís Fontinha)


Um tentáculo de gelo beija os teus lábios
desce do teu olhar a lágrima de fogo
que vai incendiar o meu peito...
há vozes desorganizadas em revolta
há crianças que esperam o regresso do circo
e a cidade se transforma num manicómio com paredes de vidro,

O sino da Igreja grita
chora...
o vento despede-se dos cabelos brancos em desalinho
são horas da cidade adormecer
correr os cortinados do destino...
e talvez amanhã, alguém... consiga destruir o manicómio com paredes de vidro.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 22 de Dezembro de 2014

domingo, 21 de dezembro de 2014

Porta de entrada


(desenho de Francisco Luís Fontinha)


Esta porta
morta
infeliz aquele que deseja entrar
e a sombra o acorrenta
aos velhos telhados de cartão
esta porta
sem acesso ao coração
em vidro
de pedra
o xisto desfeito em lágrimas de papel...
e há sempre um corpo esperando pelo regresso da tempestade
sem vaidade,
sem... sem amizade
esta porta encerrada para obras de restauro
lapidações em trinta e seis prestações...
a vida se perde neste labirinto de palavras
e madeira apodrecida
esta porta
sem entrada para o casebre da mendicidade
e elas em guerra por um punhado de areia
ou... ou por um poema em decomposição
os braços achatados
e sobre os ombros... a fugitivo da madrugada...
de cidade em cidade... de corpo em corpo... de nada em nada.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 21 de Dezembro de 2014

O amor é...


Tínhamos os holofotes do desejo nas nossas coxas,
argamassavam-se nos teus seios os fios de saliva do meu sofrimento,
tinha no peito uma concertina a chorar,
sentia-me liberto das tuas garras,
e palavras que foste coleccionando no meu peito,
tínhamos os holofotes do desejo... sem percebermos que o amor é um milímetro quadrado de nada...



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 21 de Dezembro de 2014

sábado, 20 de dezembro de 2014

Tortura

(desenho de Francisco Luís Fontinha)


O peso do sono quando a noite se suicida no olhar das palavras,
a metáfora inventada
que as imagens alicerçam à construção da fantasia,
regressar... nunca,
o peso do sono suspenso nos oiros plátanos da ínfima melancolia,
o sono morre como morrem as ervas daninhas das minhas veias,
em silêncio,
o peso do sono voando sobre as esplanadas de vidro,
o cansaço das fotografias entre quatro paredes de xisto,
cintilam as calamidades do infinito orgasmo de papel...
e ninguém percebe que na tua mão...
que na tua mão habitam os finíssimos cabelos do poema,
o corpo vacila no pêndulo da saudade como um círculo de luz,
esquecido nas masmorras da infância,
o peso do sono mensurável nas avenidas acabadas de projectar,
sem automóveis para conversar,
pessoas,
sombras...
casas em sonolência despedida,
eu,
transeunte iluminado pelos vapores de iodo,
mergulhado em vulcões de alegria
e... e alguns pedaços de fogo,
e o peso do sono em constante tortura... quando me visto de noite inseminada.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 20 de Dezembro de 2014

Amor


Disseram-me que tinhas o arco-íris na pele
disseram-me que o teu corpo era um poema ilegível
um sonho transformado de noite
abrupta
submersa na paixão dos lírios
que dormem nas minhas veias
disseram-me...
disseram-me que existe no teu olhar uma seara de palavras
um Oceano de incenso
que só o sémen do infinito consegue silenciar
disseram-me que o espelho da tua subtileza
adormeceu... no meu cigarro.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 20 de Dezembro de 2014

sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

Soníferos da vaidade


Vadios soníferos da vaidade
que deambulam nas clandestinas ruas da saudade,
olhares prisioneiros da escuridão,
pincelados tentáculos de gelo descendo o teu corpo pérfido...
e às minhas mãos
o teu cabelo incendiado pelo desejo,
e às minhas mãos o odor censurado do teu coração,
voando sem rumo,
voando... voando embrulhado em lápis de cera que o tempo engole,
e não sabe que em mim habitam os cinzeiros de chita,
os cigarros de papel aromático desenhando lábios de medo na alvorada,
vadios soníferos da vaidade... vadios monstros da madrugada,
vadios meninos de Luanda,
sanzalas encalhadas no cacimbo zincado,
capim em luta pelo sexo,
sem horários como os calendários nocturnos dos mabecos em cio...
o rio se abraça ao barco náufrago que transporta a felicidade,
e a ponte se alicerça aos seios do amanhecer,
vadios os meus poemas
em meninos de Luanda,
a infância lapidada numa avenida sem estória,
como uma fotografia inseminada num estúdio negro,
assombrado,
sem número de polícia... ou paragem de machimbombo.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 19 de Dezembro de 2014

quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

Quem sou?


Como sou quando tu não existes?
Não sei se sou árvore amargurada
folha caduca
ou... ou Primavera envenenada...



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 18 de Dezembro de 2014

quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Cigarros sem alma

(desenho de Francisco Luís Fontinha)


O biombo da saudade
que morre no teu ventre
o pensamento em pequenos voos
lentamente em direcção ao mar
rumo à cidade
do adeus...
o meu corpo sobre os carris do cansaço
tenho medo
tenho pena...
que este pobre poema
não consiga acordar a madrugada
que vive acorrentada,

há nas pálpebras do teu sorriso
fios de luz em decomposição
canções melódicas ensanguentadas pelo silêncio da tua voz...
… amarga
complexa
nesta triste matriz composta
neste triste cubo de vidro
com braços de papel...
o biombo da saudade
que morre no teu ventre
inventa-se
a cada segundo que o tempo come,

a rua incendeia-se
e todos os mendigos... não mendigos
e toda a fome... não fome
apenas as palavras sobrevivem aos teus encantos
e lamentos...
apenas as sombras nocturnas do adeus
conseguem trepar o muro da agonia
e resta este pobre poema
que um dia...
que um dia ressuscitará
das cinzas
como cigarros sem alma.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 17 de Dezembro de 2014

terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Vício


(desenho de Francisco Luís Fontinha)


há versos felizes
versos sem nome
há versos cansados
versos esfomeados quando cai a noite
há versos esqueléticos
que nem o corpo em decomposição sabe ler
versos com fome
versos vestidos de rio
cidade
e paixão
há versos desempregados
versos enlatados
(nesta cidade em combustão)
há versos conservados em papel sibilado
versos rasgados
versos…
(nesta cidade em combustão)
há versos felizes
versos sem nome
há versos cansados
que nem o tempo consegue apagar
versos de amar
revolta
versos travestidos de soldado
de espingarda na mão
à espera que se abra uma porta
às vezes sem saída
às vezes… versos em vão…
que só o vício desembrulha quando nasce a madrugada.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 16 de Dezembro de 2014

segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

O barco da paixão


O cordel em desassossego
no arresto do teu olhar
o barco da paixão em pequenos movimentos
espera o regresso do vento
como os teus olhos desesperam...
enquanto não nasce o dia,

o cordel consegue ludibriar o mar
e todas as canções dos teus lábios,

há uma campainha em desordem
uma planície nos teus seios que grita
e chora
porque hoje não há pássaros
nos teus cabelos cinzentos
e o esquizofrénico sono suspenso na madrugada,

lá fora saltitam as sílabas helicoidais de um poema vazio
triste como as lápides graníticas com finíssimas fotografias a preto e branco,

(o cordel em desassossego
no arresto do teu olhar
o barco da paixão em pequenos movimentos)
soluços avulso...
e rebuçados para esquecer a solidão
que gira... que gira como um canhão.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 15 de Dezembro de 2014

domingo, 14 de dezembro de 2014

A estátua do medo


(desenho de Francisco Luís Fontinha)


Sinto as tuas finíssimas lâminas de agonia
sobre os meus ombros de xisto
tenho nos versos a enxada do silêncio
e no peito a espada do cansaço
sinto as tuas lágrimas de estanho
descendo a calçada
como uma fotografia
morta
rasgada
e a noite constrói-se no teu cabelo
sempre que um relógio engasgado
adormece no pulso da insónia,
não existem imagens nas minhas mãos
tenho medo da cidade depois de se erguer a madrugada
sinto as tuas finíssimas lâminas de agonia
sinto as tuas lágrimas de estanho
nesta triste parede embriagada
pelo medo
pelo tédio...
morta
rasgada
uma algibeira sem nome
perdida na estrada
sem nome... esquecida na perpétua estátua da liberdade.




Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 14 de Dezembro de 2014

Medo


Não tenho medo das tuas garras
não tenho medo das tuas hélices de marfim
que habitam em mim
não tenho medo da tua boca
dos teus lábios
do teu sorriso farsa
não tenho medo das tuas palavras
nem dos teus braços
não tenho medo da forca
da espingarda...
mas tenho medo...
da palavra “amo-te”!



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 14 de Dezembro de 2014

sábado, 13 de dezembro de 2014

A minha rua


Esta rua que me alimenta
esta rua que me corre nas veias
esta rua sem sombras
esta rua sem candeias,
tem plátanos embalsamados
tem gaivotas em papel
esta rua que me alimenta
esta rua dos silêncios embriagados,
das plumas enfeitiçadas
esta rua construída com sorrisos de vento...
a minha rua tem casas
e... e flores em sofrimento,
esta rua das noitadas
e dos cinzentos olhares com odor a poesia
na minha rua habitam canções...
e palavras em agonia,
ai... esta rua dos alentos em evaporação
e das barcaças em melodia
esta rua é vida
... esta é a rua da fantasia,
sinto a sinfonia
das tristezas disfarçadas de madrugada
esta rua nunca está cansada
esta rua... esta é uma rua apaixonada.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 13 de Dezembro de 2014

Sonolência saudade


Sou o carrasco adeus
da sonolência saudade
tenho nas mãos o papiro
e no olhar
uma espada invisível
não percebo porque choram as acácias
e os plátanos da minha terra
não percebo porque gritam os rochedos
que se alicerçaram aos meus braços...
se eu sou frágil
se eu... se eu sou um simples fio de luz
embrulhado numa lápide sombreada,

sou o carrasco adeus
da sonolência saudade,

sou o presente envenenado
que deambula pela cidade
sento-me junto ao rio
e imagino barcos em papel
que não regressam mais...
quem parte
quase sempre não regressa...
como os comboios de areia
esquecidos no mar
sou o carrasco adeus
da sonolência saudade
… sou a madrugada antes de acordar.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 13 de Dezembro de 2014

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Palavras em vão


Estas palavras
são as tuas lágrimas
disfarçadas de anoitecer,
estas palavras
pertencem ao teu corpo
suspenso na escuridão,
estas palavras
são as tuas lágrimas...
entre as palavras... as tuas palavras de viver,
estas palavras
são as raízes do teu coração,
palavras, palavras... palavras em vão.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 12 de Dezembro de 2014

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

A prisão do “Adeus”


Na prisão do “Adeus”
velhas flores são torturadas pelo silêncio da luz,
não existem janelas, não existe uma porta,
frestas,
ou... ou literatura,
lá fora, na rua,
ouvem-se os gritos dos pássaros e das abelhas,
há um subscrito negro onde alguém escreveu...
“para a morte”
as velhas flores não precisam de saber qual é o significado da morte,
elas são velhas flores torturadas...
pelo silêncio da luz,
(e a morte é o anoitecer de cheiros e sons
que só as velhas flores conseguem desenhar
nas húmidas paredes da prisão do “Adeus”)
na prisão do “Adeus”
velhas flores são torturadas pelo silêncio da luz,
não existem janelas, não existe uma porta,
frestas,
ou pedaço de areia com sabor a mar...
e as grades de ferro transformam-se em madrugada vestida de branco.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 11 de Dezembro de 2014

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Sou um estranho… no teu peito


Sou um estranho teclado
dentro do teu peito,
sou a manhã na boca da insónia...
e perco-me nas tuas mãos
como um pássaro em sofrimento,
surpreendo-me com o teu olhar entranhado na escuridão,
pareces um cortinado invisível,
uma espingarda de papel...

sou um estranho teclado
dentro do teu peito,
sou os rochedos incinerados
que escondem as tuas palavras,
e nunca tenho tempo para abrir a janela
do teu coração,
sou um emaranhado de estrelas
sem passado nem canseiras,

Sou um estranho...
… no teu peito,
visto-em de negro
e confundem-me com a noite,
sou o silêncio dos teus cabelos
e a cartilha dos teus medos...
sou a clarabóia do teu sorriso
quando lá fora...

gritam o meu nome em vão,
e eu, e eu nunca tive um nome,
uma pátria,
uma bandeira,

nem... nem paixão...

gritam o meu nome em vão,
e o teclado estranho
que habita no teu peito...
chora... chora como a bala de um canhão.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 10 de Dezembro de 2014

terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Jardim de transeuntes


As manhãs são límpidas tristezas
Que só o vento consegue abraçar,
Parar no semáforo e olhar a rosa mais bela
Do jardim de transeuntes em movimento,
Tem no sorriso a bandeira da paixão
E nos lábios…
A doçura inseminada das palavras,
Do vermelho…
O verde verdade
Da esperança…
As manhãs são límpidas tristezas
Que vergam o frágil esqueleto da cidade,
Não tenho tempo para desenhar
A saudade na mão de quem me espera,
Não tenho vontade de abrir a janela
Deste quatro latas cansado,
As manhãs são límpidas tristezas
Que só o vento consegue abraçar,
São rosas transeuntes suspensas no mar…
São palavras ignoradas,
Sombras deitadas na estrada,
As manhãs
São… límpidas tristezas
Sem tempo para amar…



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 9 de Dezembro de 2014

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

As pálpebras do poema


Não sabia que o teu nome
era apenas um nome
uma solitária palavra
sem alma
sem coração
sem... sem barcos ao anoitecer,

não sabia que o teu nome
era apenas um nome
sem corpo
sem sombra...

não sabia que o teu nome
era apenas um silêncio
sem imagens
sons
ou... ou fotografias
em constante mutação,

não sabia
não sabia que o teu nome
era apenas uma assombração
uma cidade esquelética voando no pôr-do-sol,

(Não sabia que o teu nome
era apenas um nome
uma solitária palavra)

como as pálpebras do poema antes de ser o poema,

não sabia que o teu nome
era apenas um nome
um soluço mastigado nas sílabas do Diabo...
não sabia
que... que o teu nome
é como a areia húmida
e o mar apaga todos os seus desenhos
como a morte... apaga todos os seus corpos...



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 8 de Dezembro de 2014

Sinfonia da paixão


Sou um ignóbil cemitério de cinzas
recheado de falsos amanheceres
e de tristes madrugadas,
sou um pirata
que tem medo da noite,
sou... um pirata
de lata,
que chora e branca
nas sanzalas da infância,
sou uma sombra com odor a insónia
que não se cansa de lutar,
sou um ignóbil cemitério de cinzas,

prateadas
amadas
e cansadas...

arde a cidade do meu corpo
como plumas de sílabas enraivecidas,
tenho um livro na algibeira
sem palavras...
sem... sem brigas, sem... sem vírgulas,
sou um covarde vestido de luar
sou um desalmado com medo...
com medo de amar,

sou um ignóbil cemitério de cinzas
recheado de falsos amanheceres
e de tristes madrugadas,

sou a bailarina do desejo
em busca do sexo barato,
sou rua,
sou... sou lagarto,
sou... sou prostituta,
sou a âncora dos teus abraços
quando emerge em ti a sinfonia da paixão,
e todo o amor morre em tesão...

simplificado
os meus lábios inseminados pelos teus seios,
esta cidade que saltita no meu amor...
e me acolhe nos seus rochedos.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 8 de Dezembro de 2014