sábado, 12 de outubro de 2013

a canção do desejo

foto de: A&M ART and Photos

tenho nas mãos a enxada da solidão
pronta a rasgar o silêncio do corpo embalsamado da insónia
tenho nas mãos o sorriso inocente das palavras adormecidas
tenho o papel de embrulho pronto para afagar as tuas lágrimas
que sobejam das tempestades vínicas do teu olhar em espelhos castanhos
oiço-os desalmadamente gritar contra o tabique dos sonhos em construção
vejo o teu cabelo voar sobre as ardósias invisíveis dos tentáculos da paixão
tenho nas mãos o sabor dos teus lábios

a garganta da tua voz embrulhada em cortinados de areia
o teu púbis mergulha no mosto pergaminho dos beijos embainhados
oiço-os
e vejo-os
tenho dentro de mim os sargaços montes de xisto
onde escrevo as tuas coxas pérfidas dos pássaros sem amanhecer...
tenho nas mãos as nuvens dos teus seios
como lâmpadas fundidas brincando em cada nova madrugada

tenho a canção do desejo
dispo-te desajeitadamente sem perceber os sons melódicos das falsas flores
tenho-as sobre a mesa-de-cabeceira como se elas fossem um livro em despedida
ou
ou uma andorinha vagueando nas tuas nádegas de porcelana
ou
tenho nas mãos os simples rolamentos das cristalinas janelas de zinco
oiço-os e vejo-os e amo-os...


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 12 de Outubro de 2013

sexta-feira, 11 de outubro de 2013

objecto sem nome

foto de: A&M ART and Photos

és construção fictícia
és palavra engasgada na frase da alegria
és foguetão rumo ao luar de Inverno
és o inferno
a saudade
és a infância
a vaidade
és uma canção mergulhada na maré
és o amor
a fé
a saudade
és a infância
a verdade
és a madrugada quando se extinguem as luzes do silêncio
és a calçada com pulmões de naftalina
carvão
és menina
és a paixão...

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 11 de Outubro de 2013

Em destaque . Blogue Cachimbo de Água - Sapo Angola.

quinta-feira, 10 de outubro de 2013

desalmado corpo

foto de: A&M ART and Photos

sou um desalmado corpo suspenso nas madrugadas de adormecer
corro sem saber que dentro do vento
uma árvore morre
e um pássaro
filho do amanhecer
saltita sobre os muros das cidades de xisto

sou estes olhos que te lêem e estas mãos que te folheiam
brincam com as tuas palavras desconexas
sou a enxada que transportas dentro de ti
sou um desalmado corpo
perfumado pelos cansaços dos telhados de chocolate
sou a não vaidade

as sílabas castanhas dos cortinados sem janelas
sou as caricias tuas quando um espelho fica em migalhas
o teu corpo voa e esconde-se na neblina de um quarto alugado
sobes as escadas e bates à porta
… sou um desalmado homem que vive no duzentos e dezasseis
envergonhado de mim quando procuro os cigarros adormecidos nos cinzeiros das montanhas

abraçava-te e sabia-te volátil como serpentes enroladas nos tornozelos da tarde
ouvíamos as canções dos mendigos sentados sobre as lágrimas do silêncio
havia música com bata-frita e amêndoas grelhadas e cheirávamos as réstias sebentas com versos sós e magoados pelos copos vazios da vodka abandonada pelas flores de papel
sou um desalmado corpo suspenso nas madrugadas de adormecer
corro sem saber que dentro do vento

uma mulher vestida de negro
não alegre
não gaivota procurando os montes da paixão esquecida nos tentáculos dos braços de aço
que sobem as calçadas como corredores da morte
sou o milagre escondido que todas as mulheres tentam sobreviver
sou um pedaço de pedra deitado numa cama abandonada


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 10 de Outubro de 2013

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

os vampiros da paixão

foto de: A&M ART and Photos

são intensos
são mórbidos como sílabas de falsa prata
são comestíveis como os peixes do teu lago
no centro do teu jardim
são invisíveis
são caracteres desconhecidos que descem dos teus lábios...
são tristes as noites tua chuva
quando os alicerces de uma canção
caiem na escada de acesso ao sótão da solidão
são tristes
os corredores do teu coração
os olhos sem cor

tristes
de ti e em ti
são intensos
lindos
cansados
castanhos belos
apaixonados
como gargantas volúpias em desgovernados uivos

e beijos loucos nas cavernas dos púbis encarcerados
são intensos
são complicados
distantes noites
manhãs sem literatura
poesia adormecida
sem ternura
vadia
mendiga
são intensos
lamentos
os silêncios da insónia mergulhada na tua mão de cinza depravada

são rios
mares com algas voando entre as rochas
são frias
nocturnas
sexos evaporados nas lanternas de cartão
são destemidos
intensos
os vampiros da paixão

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 9 de Outubro de 2013

terça-feira, 8 de outubro de 2013

letras e letras e uma mão sobre o teu rosto envenenado pela insónia

foto de: A&M ART and Photos

não sei como és
não percebo das tuas sombras a neblina das rosas ao amor
não entendo a tua presença nas andorinhas em flor
não o sei
como és
ou... se o és
também
tu
uma flor
não sei como és
nuvem
ou simples pedaço de xisto

não como és
não percebo o porquê dos teus sete pecados mortais
das avenidas embainhadas
nas madrugadas
como és
ou se... és o que eu acredito que o sejas
uma gaivota disfarçada de veleiro
muitas fotografias esquecidas nos jornais
e no entanto
não sabendo como és...
acredito nos espelhos com abraços em aço Janeiro
não como o és

mas... seres o vento
uma janela mal fechada
um pérfido edifício em ruínas
como tu
eu
o és...
somos esqueletos vagabundos mergulhados no mosto cerâmico da paixão
mas... seres o vento
o amanhecer construído por jangadas de vidro
montanhas encarnadas
ribeiras
feiticeiras

ou... simples palavras
adornadas nas esquinas prateadas
não sei
como
o
és
não percebo as acácias em flor
os julgamentos complexos por aviadores com capacetes de cartão
escrituras
letras e letras e uma mão sobre o teu rosto envenenado pela insónia
não sei como és
não percebo das tuas sombras a neblina das rosas ao amor


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 8 de Outubro de 2013

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Um corpo submerso nas sílabas do desejo

foto de: A&M ART and Photos

Um corpo estaticamente só, um corpo submerso nas sílabas do desejo, um corpo entre montículos de saudade e rochas de insónia, uma luz alimenta este corpo, um espelho alimenta a luz que alimenta este corpo, um corpo... não é um corpo, um corpo vazio, solidificado, um corpo voando sobre a montanha da solidão,
Vens à janela, abres-te e sentes o vento em ti,
Um corpo inocente coberto pela espuma volátil do incenso, um corpo de água, só, um corpo cintilante, um corpo
Ausente?
Dorido, que não sente o corpo em corpo das flores...
Um corpo estaticamente só, um corpo submerso nas sílabas do desejo, um corpo entre montículos de saudade e rochas de insónia, um corpo poisado sobre o peito de um homem...
A imagem emagrece o corpo, a luz que alimenta este corpo, é alimentada por um outro corpo,
E o espelho depois de ser corpo.
Imagem, flutua sobre as vértebras do cansaço, e és transparente como as noites vestidas de negro, e és desejada como os pilares de areia das madrugadas em delírio, despes-te e olhas-te no espelho
(alimento a luz que alimenta o corpo)
O teu,
Quero ser um pedaço de montanha, ou um veleiro agasalhado de lareira acesa, caminhar junto a um rio com dentes em marfim, um corpo belo, desejável, um corpo em decomposição, a parte física sobre a mesa-de-cabeceira e a parte invisível dentro de mim, dentro da trovoada, das nuvens envergonhadas quando a luz ejacula sobre o abajur da tristeza e eu
O teu corpo é teu?
(alimentado pela luz que alimenta o corpo)
Desculpem... morri,
Um corpo de água, só, um corpo cintilante, um corpo
Ausente?
Quero ser o vestíbulo que habita no teu quarto secreto, a cabeça onde poisa o ombro, também ele... secreto, todo o corpo teu não existe, nunca apareceu à janela do meu castelo, o teu corpo é um embuste, falsificado, o ilustre Doutor das clarabóias domésticas que a tua mão abraça,
Quero o ser como são as palavras antes de escritas, aquelas que são pensadas e que por
Vergonha?
Pudor?
Um corpo belo esconde-se no interior de um cobertor, invento marés e mesmo assim
Não o consigo, não sou capaz que te dispas e fiques só corpo, só
Pudor?
Vergonha das palavras que tenho medo de escrever, vergonha dos beijos que tenho medo de desenhar na parede dos teus seios, o teu corpo, meandro sabático das sandálias em couro, os calções parecem perdizes brincando nos patamares no coração do Douro,
Vamos jantar?
Comer o teu corpo, ele, apenas ele... dentro do prato cerâmico, outrora em alumínio, hoje mendigo, o espelho que alimenta a luz ou a luz que alimenta o teu corpo, e uma corda feliz saltita nas mãos de uma criança...

(ficção – não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 7 de Outubro de 2013

Texto de Francisco Luís Fontinha em destaque - Sapo Angola - Blogue Cachimbo de Água.

domingo, 6 de outubro de 2013

O meu “mundo”


Solidificado no vórtice da mentira quando sei que das tuas mãos linhas transversais dividem dois corpos em duas laranjas, solidificado este meu triste olhar quando sinto no espelho teus lábios sofridos, teus molhados lábios, a boca estremece, desce ao mais intimo poço da insónia, no meu “mundo” vive-se sentado sobre uma placa de xisto, no meu “mundo” vives húmida como as árvores depois da neblina, solidificado no meu “mundo”
Nosso “mundo”,
vives húmida como cavernas em sais de prata a preto e branco, a imagem bloqueia, a imagem deseja a tela sobre ela sabendo que do outro lado do abismo, o
Nosso “mundo”?
Vive e diverte-se,
Chora, grita entre uivos e orgasmos doirados, no nosso “mundo” há uma clarabóia com olhos de gaivota e asas em papel, no meu “mundo”, vive-se, chora-se, deseja-se
Desejam-se as fotografias, as minhas e as tuas, as nossas imagens tridimensionais multiplicam-se, dividem-se... e acordam os teus seios depois da madrugada partir, sem deixar rasto ou paixão como fazem os barcos quando abandonam o porto de abrigo e sente-se uma corda esmorecer, coitada, e aos poucos vê-se o corredor na morte o teu púbis comestível nas páginas de um livro,
O meu “mundo”
No nosso “mundo” tudo pertence às fotografias, tudo é sombra, tudo é desejo...
( ….... )


@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 6 de Outubro de 2013

cristais vagabundos

foto de: A&M ART and Photos

porque te alimentas do néon moribundo das portas em ruína
e percebes que os meus olhos são cristais vagabundos
sem número de policia
apenas uma simples janela de porcelana
quando regressa a noite
disfarça-se de gaivota
deixa ficar os poucos vidros sobre a mesa-de-cabeceira
e voa na cidade do medo

leva na algibeira o candeeiro mordomo
que sua senhora adorada lhe ofereceu um dia longínquo
quando ainda existiam lábios de borboleta
nas plantas marginais
do silêncio com algas
e dentro de um velho caderno
o esqueleto de duas ou três integrais
simples duplas triplas... como o teu corpo em despedida

partias no primeiro autocarro da carreira sem rumo definido
entre curvas e lagartos
livros e camaradas apaixonados pela vodka da menina Alice
partias
e eu deixava de ver-te logo a seguir à curva junto à ravina
despedia-me de ti dentro do meu quarto escuro
e chorava
chorava medalhas de prata que me ofereceste e nuca fui capaz de as usar...

(porque te alimentas do néon moribundo das portas em ruína
e percebes que os meus olhos são cristais vagabundos
sem número de policia
apenas uma simples janela de porcelana)

por medo
ou vergonha
nunca encontrei as tuas mãos no meu rosto triangular
e chegava a casa
e a casa parecia-me um cubo em betão armado
com braços em aço
com olhos em cristal
como os meus

(cristais vagabundos)


@Francisco Luís Fontinha – Alijó
(não revisto)
Domingo, 6 de Outubro de 2013