sábado, 3 de agosto de 2013

Empastelados corações ofegantes como canções de amar

foto de: A&M ART and Photos

Um corpo de açúcar que se derrete com a luminosidade das palavras, um corpo de estrelas voando sobre a Primavera das gaivotas cansadas, um corpo, belo, esbelto, poético, um corpo de açúcar com um olhar nocturno caminhando junto ao cais das esmeraldas adormecidas, um corpo em açúcar, desejando ancorar às amarras do silêncio...
Saboreavas as amêndoas escritas no chocolate da manhã, lias os poemas inventados e que em pedacinhos de sombreados papeis, apareciam no teu café, mexia-lo, e com a colher de prata, retiravas-los, e colocavas-los na borda do pires com floreados tristes, tristes, tão tristes, como as lâmpadas das árvores sem rosto, quando o olhar se esconde dentro do xisto, galgando socalcos, até caírem no rio,
Trazias contigo um lápis de espuma com que escrevias no teu corpo de açúcar as bolas de sabão que uma alegre criança lançava no vento de pétalas amarelas, brincavas nos olhos das gaivotas cansadas, gritavas sonoros gemidos de sílabas perdidas sobre a mesa-de-cabeceira onde poisava um livro com muitas folhas, sem palavras, muitas folhas desprovidas de vida, sem desenhos, sem gemidos, sem uivos, um livro como o teu corpo de açúcar, por vezes... recheado de incenso, por vezes triste, triste como os floreados teus seios, como tristes, triste as tuas mãos saboreando as uvas embalsamadas pela sombra do Douro, curvilíneo o teu desejo, em pequenos círculos de oiro, ias inventando o prazer da leitura, construías abraços com pequenas lágrimas das velhas videiras, adormecidas, embebidas no suor do teu corpo
De açúcar?
Empastelados corações ofegantes como canções de amar, sítios dispersos, algibeiras envenenadas pelos míseros cêntimos de um dia de trabalho,
Açúcar?
De, pensava eu,
Mas veio o vento, levou-te, misturou-te com a água que batia nas vidraças de pano, cortinados de papel chorando a tua partida, o espelho, esse, deixou de redesenhar o teu corpo em açúcar, e como uma criança, subiste as escadas do castelo de areia, onde habitas e te escondes, e vives... como uma
Não
Como uma pequena esfera do tamanho de uma cereja, os teus lábios saciavam-se com os fluidos das abelhas com asas de borboleta, e diziam-se na tua rua
Ela, tão bela, e de açúcar,
E de areia, onde habitas, no teu castelo junto às rochas dos petroleiros..., e, e ela, tão bela, e de açúcar, ela.

(Não Revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó

Fervíamos como líquidos amargos...

foto de: A&M ART and Photos

Fervíamos como líquidos amargos na imensidão dos botões de rosa, alguns bravios, outros, outros mórbidos, outras..., outros, outros caminhando sobre as gaivotas floridas das noites embriagadas, havíamos combinado não falarmos mais nesta horrível despedida, levantarmos âncoras, recolhendo corrente, motores a diesel a trabalhar, e aos poucos, outros, o rebocador deslizava suavemente sobre a tua pele de seda, começávamos a perder de vista os edifícios alicerçados às tuas coxas rochosas, e aos poucos, os teus mamilos começavam a entrar no esconderijo junto à sanzala da saudade, entrávamos, e no pavimento térreo uma colcha de palha onde nos deitávamos, onde dormíamos, comecei a deixar de ver-te, comecei a escrever no zinco teus cabelos, porque o vento tinha zarpado, outras, outros
Fervíamos,
Outros espiavam-nos juntos às bananeiras com quatro cadeiras e um círculo de sombra, fervíamos um no outro, e outros, e outras, aos poucos apenas o silêncio do teu corpo fervilhando entre os meus dedos, outros, e outras, aos poucos o teu púbis vulcânico descia a montanha do Adeus, e cada vez mais longe
Fervilhando,
Fervíamos,
Deixávamos os meninos em volta de pequenas poças de água, tinha chovido, a terra cheirava a fogo, e o céu começava a clarear como acontecia com as janelas da velha barcaça que nos levava até ao paradisíaco Mussulo, eu, eu amava-o, e tu, tu apenas encolhias as pernas, e sobre ti um lenço de desejo te absorvia, flutuavas como uma abelha dentro da cubata, rodavas em pequenos círculos trigonométricos, e dos teus lábios um líquido amargo com sorriso de cosseno desenhava-te na face esquerda uma parábola, a equação descia-te até enrolar-se nos teus tornozelos de areia branca, palmeiras e outros, e outras
Fervilhando,
Fervíamos,
E outras melodias esperavam no cais pelo desejado embarque, deixei-te para nunca mais poisar-me sobre ti, voando, eu, eu ainda tentei..., mas caí sobre o Oceano, mergulhei acreditando encontrar-te lá muito no fundo, mas
Fervilhando,
Pedras e nada mais,
O pôr-do-sol era triste, fervilhavas nos meus longos dedos, e os teus gemidos alimentavam todo o espaço vazio da cubata, não tínhamos sequer onde poisar uma gotícula de sémen, não tínhamos sequer onde deixar suspenso na madeira misturada com zinco o crucifixo que tínhamos trazido do outro lado da cidade, antes de partirmos, antes de te deixar sobre o cais..., e quando percebi
Fervilhando,
Pedras e nada mais,
Percebi que tinhas desaparecido entre o cacimbo e a saudade, percebi que tinhas zarpado como a nossa velha barcaça, procurei por ti, inventei desculpas, cheguei a descer às profundezas do Tejo, entrei em Cais do Sodré, bebi, embriaguei-me, dancei sobre mesas e cadeiras, cambaleei até Belém, atravessei os carris e sentei-me junto ao rio..., fervíamos como líquidos amargos na imensidão dos botões de rosa, alguns bravios, outros, outros mórbidos, outras..., outros sem vida, e nada, e ninguém, nem sequer um simples peixe... para me informar do teu paradeiro, percebi que a nossa cubata tinha ardido, anos mais tarde, percebi que o teu corpo tinha crescido, mudado de forma, percebi que estávamos velhos, como o espelho da casa de banho, quando hoje me olha e diz-me
Fervilhando,
Fervíamos,
E eu, eu... no cais pelo desejado embarque...

(Ficção – Não Revisto)
@Francisco Luís Fontinha

tens de ti o meu pobre corpo desleixado

foto de: A&M ART and Photos

Tens de ti os sorrisos despedidos pela madrugada
dormes solenemente sobre a calçada
tens de ti os vidros das gaiolas onde brincam as gaivotas de aço
dormes e amas e desejas

tens de ti as algas clandestinas do silêncio mar...
dormes
vives
tens de ti o meu pobre corpo desleixado
sonolento
despenteado
e dormes
e amas como amam as árvores dos jardins imaginários
tens de ti em mim as mãos sem os dedos que poisavam nos teus cabelos cinzentos
amar os beijos quando voam sobre os angustiados braços desalentos...
cobrindo-te e escondendo as tuas lágrimas
que tens em ti de ti os meus pedaços lenços

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

como o mar amar os lábios da paixão

foto de: A&M ART and Photos

dois viajantes vagueando sobre o silêncio da noite
comendo pétalas de chocolate embrulhadas em poemas desejo
como o mar
amar os lábios da paixão
quando estrelas dançam nos teus cabelos de porcelana,

dois viajantes apaixonados nas palavras invisíveis
folheadas pelas mãos tuas em desenhos sonhos amanhecer
comendo-me
comendo-te...
dois simples braços e mãos... entrelaçadas na alvorada,

o corpo arde na tela da insónia como acrílico sombreado das nuvens embriagadas
sobre mesas e cadeiras
sobre ti e sobre mim
o corpo
o teu corpo rodopiando ao som da garganta de um relógio de parede,

sonolento os olhos teus dançando nos versos da manhã
o medo entranha-se-te nos dedos sisudos
e a melancolia absorve-te as pálpebras encarnadas que o Sol esconde
e alimenta comendo-te
comendo-me... sem saber que éramos de brincar...

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó

Desejava-te loucamente como versos brincando numa calçada de Lisboa

foto de: A&M ART and Photos

Embalavas o teu alegre piano como se ele fosse o teu próprio filho, abraçavas-lo e embrulhava-lo com os braços pendentes de caules verdejantes como as lâmpadas que a noite inventa nos teus olhos, ouvíamos-te longamente sentada num pequeno banco alegremente feliz, sentavas-te nele, rodavas o tronco e a cabeça, esticavas os longos dedos de porcelana... e saíam das tuas mãos os mais lindos melódicos sons,
Chamo-te A Pianista, sem o saber, sem sequer perceber se realmente sabes tocar piano, se realmente... algum dia tocaste com os teus dedos em algum, se realmente algum dia acariciaste algum, e sabes? Não o sei, talvez nunca tenhas tocado piano, talvez nunca tenhas adormecido ou acariciado algum piano, mas eu, eu imagino-te sentada num banco simples, feliz, voando dentro da sala de estar,
Ela vagueando como corpo sobre as teclas húmidas do piano em voz poética quando das manhãs ouvíamos-te saltitar entre os ramos cerâmicos dos teus abraços cúbicos nas equações complexas dos sons invisíveis do corpo teu piano..., havíamos inventado as janelas com vista para o mar, embalavas o teu alegre piano como se ele fosse o teu próprio filho, feliz, descendente do Sol, filho da nuvem cinzenta e da gotícula número mil quinhentos e vinte e três, gostava de ti, nua, sobre o teclado em tons de negro, descia sobre ti a tempestade, o ciúme, descia sobre ti o medo, e tu, rosa bravia, caminhas desordenadamente junto ao desejo, olhavas-nos, e sabíamos que nos teus olhos
Chamava-te A Pianista, sem o saber, sem sequer perceber se realmente sabes tocar piano, se realmente..., os teus olhos, vagabundos, escrevias nas pálpebras as notas musicais, deixavas adormecer nas tuas mãos os tão desejados silêncios dos beijos ainda não acordados, dormias, nua, eu, eu fumava desalmadamente cigarros que me cerravam os meus olhos, deixava-te de ver, apenas um sombreado ténue realçada o teu corpo deambulando entre o travesseiro e a cabeceira da cama, os teus cabelos soltos pelo imenso areal, a areia branca, silenciosa, e quando acordavas
Olá sisudo,
E quando acordavas, se ele fosse o teu próprio filho, feliz, descendente do Sol, filho da nuvem cinzenta e da gotícula número mil quinhentos e vinte e três, gostava de ti, nua, sobre o teclado em tons de negro, descia sobre ti a tempestade, o ciúme, descia sobre ti o medo, e tu, rosa bravia, caminhas desordenadamente junto ao desejo, tu vestida de desejo, e sentia-te nas minhas mãos antes de entrarmos mar adentro, o teu silencioso piano, o teu invisível teclado ténue...
Olá sisudo
Ténue como os teus dedos, ténue como os teus soltos cabelos escrevendo poemas sobre as rochas desassossegadas das palavras abelha que voavam debaixo dos velhos plátanos, deitada, tu, tu não propriamente, deitado o teu corpo, eu, eu fumava desalmadamente para não te ver, porque quando te via, eu, eu desejava-te loucamente como versos brincando numa calçada de Lisboa, ouvia, ouvíamos-te os sussurros sonhos,
Sisudo,
E a noite entrava nos teus mamilos cor de chocolate, uma borboleta poisava como se de uma folha de papel se tratasse, e sabíamos que não era uma folha de papel qualquer, e sabíamos que a noite não era uma noite qualquer, e sabíamos que o teu piano dançava no corredor entre o teu quarto e a casa de banho, e a borboleta que não era borboleta, mas apenas a imagem reflectida num espelho de uma folha de papel, a mesma
Sisudo,
A mesma folha de papel onde escondias as notas musicais, a mesma onde escondias o meus lábios e me proibias de te beijar, e era nessa mesma folha de papel onde guardavas as minhas mãos, para que eu, para que eu não te acariciasse o teu copo sonolento com sabor a melódicos sons e a poéticos suspiros, e os teus lábios acabavam, já de madrugada, por morderem-me o meu pescoço e o meu peito,
Sisudo eu, sisudo eu,
E fumava desalmadamente para não te morder os lábios e os teus seios poisados sobre o teclado sombreado de um piano, de um piano, que nunca ninguém viu, que ninguém sabe a idade, nome, ou a localidade onde habita, mas sinto-o, mas sinto-te na minha cama debaixo dos meus lençóis...

(não revisto – Ficção)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó

quinta-feira, 1 de agosto de 2013

Lágrimas?

foto de: A&M ART and Photos

O comboio sonolento deserta e foge dos carris lençóis de água que embrulham as mãos das locomotivas embriagadas, algumas tombadas como crianças depois de descer a tempestade sobre os telhados de vidro que cobrem os cobertores da inocência,
Farto-me de mim, farto-me deles, delas, farto-me das palavras e dos pequenos grandes voos de areia sobre as árvores invisíveis,
Farto-me do silêncio disfarçado de sofrimento, farto-me deste (sofrimento) quando se veste de insónia e rompe noite adentro, deita-se sobre mim, como se eu fosse um corpo prostituto, camuflado, como se eu fosse uma personagem sem nome, idade desconhecida, uma personagem sofrida, comestível, comiam-me se eu deixasse..., e os palhaços de porcelana sombreados na janela das estações com paragem obrigatória, bebíamos vodka pensando que eram melódicas palavras abraçadas a poéticos lábios de sémen,
O comestível comboio com rodas de algodão...
Nascia o poema, o amor, a paixão, nascia o corpo, o teu corpo vagão carruagem correndo léguas de searas com espantalhos vestidos de palheiro solitário, choravas, choravam, gritavam, gritavas, gemias, gemiam... e acabavam sempre por regressar ao Tejo, rio acima, comíamos a ponte de aço, fumávamos os cigarros com sabor a dunas de areia esbranquiçada, alimentávamos-nos de suor e carícias desenhadas pelas mãos calejadas dos homens e das mulheres filhas e filhos, dos socalcos, olhando, brincando, sei lá... o rio que só termina na cidade com pronúncia do norte,
O comestível comboio com rodas de algodão..., e silêncios de medo,
E
Amanhã não saberás o meu nome, levantar-te-ás, vais à janela e vais perceber que o rio, o rio sou eu..., eu, e
Lágrimas?
E os barcos, sim, também sou os barcos, de papel, de esferovite... os barcos em madeira, eu, levantar-te-ás... olharás os meus olhos
E
(não te conheço)
E lágrimas, e nada, e escuridão dentro das algibeiras dos anzóis comestíveis... e eu? Eu, eu e lágrimas, e tréguas, de silêncios, de medos, de janelas encerradas e de esplanadas como vodka derramada sobre o teu corpo de amêndoa,
Amar-me-ás?
(não te conheço)
Não,
Não sei se...
E
Amanhã não saberás o meu nome, levantar-te-ás, vais à janela e vais perceber que o rio, o rio sou eu..., eu, e
Lágrimas?
Navegáveis mãos as milhas nos teus seios de madrugada, cabelos embebidos no vento da paixão, zangado, eu? Navegáveis mãos, preciosos palheiros guardando as sementes do teu púbis que o triste pôr-do-sol inventa nas tuas coxas, e
Quem és, tu, mulher de tecido marinho?
E
(não te conheço)
Amar-me-ás? Nunca o saberei..., (como se eu fosse uma personagem sem nome, idade desconhecida, uma personagem sofrida, comestível, comiam-me se eu deixasse..., e os palhaços de porcelana sombreados na janela das estações com paragem obrigatória, bebíamos vodka pensando que eram melódicas palavras abraçadas a poéticos lábios de sémen),
E apenas sou um barco, e apenas sou um rio... um rio sem nome, idade... com paragem obrigatória, bebíamos vodka pensando que eram melódicas palavras abraçadas a poéticos lábios de sémen, Amanhã não saberás o meu nome, levantar-te-ás, vais à janela e vais perceber que o rio, o rio sou eu..., eu, e
Lágrimas?

(não revisto – ficção)
@Francisco Luís Fontinha

Vivendo inventando corações de vidro

foto de: A&M ART and Photos

Vivia inventando vida numa rocha de míseros metros quadrados
sentava-me sem encontrar espaço para poisar a cabeça
entrelaçava as mãos
pegava na caneta...

vivia inventando amigos e amigas namorados e namoradas
vivia dizia ele
como um vagabundo de vela ao vento
mergulhando em marés de vidro
descendo às profundezas das palavras
vivia amando inventando o amor
e a paixão
vivia inventando a vida
e rochas
de míseros metros quadrados
sem janelas
sem telhados

vivia eu percebendo que era outro eu
e rochas
e a paixão dos borrões de tinta sisuda semeada sobre o tabuleiro das sementes
vivia-se inventando o amor gélido das tardes de Domingo...
e rochas
quadrados espaços como os olhos da neblina
sobrevoando as sandálias do menino envenenado pela saudade...
e pelas gaivotas de papel.

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó

quarta-feira, 31 de julho de 2013

A pianista

Foto de: A&M ART and Photos

O silêncio, vestido, o silêncio das palavras mergulhadas nas ínfimas gotículas de insónia, um olhar, uma cena construída nas cavernas da montanha adormecida, o poema redefine-se, vive, e parte em direcção ao mar..., os olhos fixam-se na parede húmida da escuridão, o silêncio absorve a musicalidade de um piano de cauda, as mãos finas e longas, entrelaçam-se e distribuem-se no teclado negro com sorrisos brancos, a pianista sorri, e tem nos olhos a alvorada das notas musicais, a pianista é como um livro na mão do poeta, manuseada, folheada... e acariciada, a pianista em lágrimas de desejo, voa sobre o palco inventado com um pequeno banco em madeira, há aplausos, há beijos nos lábios da pianista, e o poeta sussurra-lhe ao ouvido
Desejo-te como és, de mãos finas e longas perdidas nas manhãs de Primavera,
Ao ouvido (Amo-te?) amará o poeta a pianista misteriosa? Estará o poeta louco? E a pianista... será uma árvore com olhos verdes? Azuis? Descoloridos? Emagrecidos...
Como? Como serão os olhos da pianista?
Desejo-te (Amo-te) sussurra-lhe o poeta em duodécimos sons das palavras com sabor a gotículas de suor, o corpo permanece sentado e o piano, e o piano toca-se e masturba-se nas mãos da pianista, há um espelho, há pássaros, há...
Mendigos pássaros, loucos, loucos silêncios, vestidos, os silêncios das palavras mergulhadas em ti, nas ínfimas gotículas de insónia, não dormes, sonhas? Pensas num corpo sobre o teu, imune, vagueando como mórbidas Sereias no fundo do mar, sentindo, tu, entre o piano e o cortinado de fumo, os cigarros movem-se como carnívoras plantas em vasos de porcelana, desejas o desejo e tens medo de desejar,
Há,
Há pássaros em ti, voando, brincando, há pássaros nos teus cabelos de ébano cristalino, a tua boca, a tua doce boca, silencia-se na minha, permanece imóvel, ausente... e dorme, dorme como uma criança depois do almoço, da tua doce boca os lábios peregrinos começando as desvairadas lâmpadas de néon...,
Medo de desejares, medo de amares, há uma janela com vidros de pólen estacionada junto ao teu piano, ama-lo? Pareces cansada, triste, desiludida..., como eu, o poeta prisioneiro nas mãos da pianista, como eu, o poeta estátua, imóvel, nu, tu, numa cama embrulhada em livros e discos de vinil, uma cama camuflada no sofrimento da cidade, há
Como mórbidas Sereias no fundo do mar, sentindo, tu, entre o piano e o cortinado de fumo, os cigarros movem-se como carnívoras plantas em vasos de porcelana, desejas o desejo e tens medo de desejar, há em ti de mim... coisas desconhecidas, palavras não ditas, por escrever, doidas, doidas como os sons que das tuas mãos vomitam melodias de madrugada menina, vaidosa, alegre, como tu, menina, menina dos mimos, menina...
Há,
Há pássaros e pianos, há árvores e gaivotas, há poetas e livros,
Diz-me tu, o que escolherias?
Diz-me tu, como são os teus lábios quando sentes o invisível desejo do piano vagabundo descer a calçada em direcção ao rio,
Diz-me, diz-me tu..., menina do piano com graníticas pautas de oiro...

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó

Ausente sisudo

foto de: A&M ART and Photos

Sisudo complexado como um piano
triste
velho
desafinado,

Eu um transeunte indefinido correndo calçadas
bebendo palavras
eu
como tu
mergulhando em lençóis de prazer,

Sisudo tu...
sisudo eu?

Foges
escondes-te nas amarras rochas de arroz
cerras os lábios
e colocas em volta do coração uma corrente de aço...
uma âncora de sofrimento embebida em sílabas
foges
sisudo tu...
sisudo?

Inventas-te inventando-me nas paredes da tua solidão
pareces um barco com asas de gaivota
uma menina saltando à corda junto às amoreiras em flor...
… sisudo eu
carrancudo perdido como pedra de ruela
varanda com vista para o Oceano petroleiro da vida...
inventando tu o amor
foges
escondes-te das flores e da miudinha chuva sobre a madrugada...
foges
sisudo tu...
sisudo?

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó

Perfeito (diz ela)

foto de: A&M ART and Photos

Ossos vestidos de desejo adormecido
canções do mar
perdidamente sós sobre os pilares invisíveis da alvorada
e os teus olhos mergulhados em palavras papel...
e os teus olhos correndo a calçada das desgraçadas pedras de solidão
tristes
cansadas
ossos os teus e os meus
amargurados como pincéis embebidos em beijos de amar...
sonhos teus entre os sorrisos navegar
ossos vestidos de desejo
desejando-te na escuridão noite do prazer...

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó

terça-feira, 30 de julho de 2013

Nua voando sobre os lençóis da alvorada

foto de: A&M ART and Photos

imagino-te sentada numa rocha, nua, cansada, despida... imagino-te, nua, triste, alegre, vadia... correndo sobre o mar, imagino-te, Mulher do mar, veneno, palavras não escritas, nas mendigas folhas de papel, imagino-te, nua... nua voando sobre os lençóis da alvorada, um anjo com asas de vidro e lábios de cristal, a preciosa mulher do mar, a mulher do verdadeiro amar..., como as árvores de porcelana vagueando sobre os cabelos nocturnos da alvorada, saciando o teu desejo, construindo em ti os prazeres infinitos das equações diferenciais,
Triplas integrais correndo sobre o rio agoniado,
Sentávamos-nos um sobre o outro, brincávamos como artistas plásticos desenhando corpos invisíveis nas clarabóias do imaginário sofrimento, gemias, uivos e pingos de suor como pássaros vaiados nas manifestações do amor,
Equações dos mamilos heterogéneos como sílabas de cansaço, teus braços nos meus braços, teus lábios nos meus lábios..., tu dentro de mim, assim, uma rocha recheada de sémen, uma lâmina de luar deitado na varanda virada para o rio, ao longe, o petroleiro esquecido procurando anzóis envenenados e pequenas migalhas de ferrugem, saciar-me de ti como tu sem dizes,
Existo, e sou mulher,
O que é ser feliz?
Imagino-te sentada sobre mim, imagino-te em trapézios de mãos entrelaçadas, fugindo, correndo, escondendo-se..., imagino-te, assim, nua, em mim, imagino-te sendo o mar vestido de gaivotas com sorriso encarnado, o pôr-do-sol, ou...
Existo, e sou mulher, existo e preciso de prazer, de ser acariciada, e amada, simplesmente como são as flores, e as abelhas, e os poemas esquecidos sobre a mesa-de-cabeceira, escritos para ti, poemas, palavras embriagadas, estonteantes, palavras mendigas, vagabundeando a cidade amaldiçoada, imagino-te amada, mal amada, imagino-te só... enrolada no travesseiro, embrulhada nos lençóis de seda com nuvens verdejantes, triplas integrais correndo sobre o rio agoniado, barcos e barcaças e velhos cacilheiros, vomitando, agoniados, frases de paixão adormecida, peixes comendo algas, as tuas algas, e tu, sobre mim
Nua, recheada de sémen e incenso, em tridimensionais desenhos, cubos olho-te e de nua nada tens, olho-te e de integral... apenas o símbolo, escorrendo da tua boca como saliva, como ninguém,
Existo, e sou mulher,
O que é ser feliz?
E lábios de cristal, a preciosa mulher do mar, a mulher do verdadeiro amar..., como as árvores de porcelana vagueando sobre os cabelos nocturnos da alvorada, saciando o teu desejo, construindo em ti os prazeres infinitos das equações diferenciais,
Triplas integrais correndo sobre o rio agoniado, vogais suicidadas no mural da felicidade, vejo-te e sinto-te, dentro de mim, nua, apenas em esqueleto de desejo como melódicas canções de amor, imagino-te, imagino-te... imagino-te,
Chorando, rindo, sonhando, imagino-te..., imagino-te sentada numa rocha, nua, cansada, despida... imagino-te, nua, triste, alegre, vadia... correndo sobre o mar...
Nua, dentro de mim, cambaleando como tempestades de areia...

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó

segunda-feira, 29 de julho de 2013

Mulher do mar

foto de: A&M ART and Photos

Cortas em fatias douradas a triste madrugada
corre em ti sonâmbula um rio nas linhas de aço do amanhecer
cortas as nuvens silvestres percebendo-se nelas as cansadas manhãs de solidão...
carnívoras palavras alimentam-se de ti
e em ti
comestíveis poemas sobre as velhas searas adormecidas,

Entranhas-te no meu peito fumegante em cinzas invisíveis dos cigarros vegetais
amar-te-ei como o mar que engole silêncios de velhos barcos enferrujados
inscritos em ti os últimos desejos da noite com sabor a ébano das montanhas de espuma
entranhas-te como a água salgada nas rochas da solidão...
e em ti
de ti... o sabor da tua língua procurando os milímetros quadrados dos meus braços,

Saborear-te ensanguentada de gemidos uivos e pequenas gotículas de suor
o odor embriagado dos teus seios que sobejaram das tempestades de areia
os vómitos das pequenas árvores abandonadas
sobre o oceano desencanto navegável...
não esqueço os desenhos em prata
que dos teus mamilos voam sobre a cidade do amor...

Desenhar-te como um rio vagabundo
indomável como eu correndo sobre as calçadas de granito sapateado...
sou como tu eu nu
invisível saborear-te em pedaços papel amarrotado com chocolate
desencanto desenhar-te não percorrendo com os meus dedos
o corpo teu que tu inventaste para mim...

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó

Palavras do ser

foto de: A&M ART and Photos

O corpo viciado em pequenos pedaços de espuma, mergulha, flutua..., o corpo sensível e volátil, voa, voa livremente sobre as acácias em flor, o corpo viciado em poema, disfarçado de personagem imaginária, o corpo vivo, do prazer, ao sonho, como um livro, um livro recheado com palavras, desenhos... um livro teu corpo de ler,

Define paixão!
Define… definição
Corpo
Coração,

Define amor!
Define… definição
Corpo
Canção,

Define madrugada!
Define… definição
Criança
Zangada,

Define flor!
Define… definição
Mulher
Dor,

Define prazer!
Define… definição
Sexo
Escrever.

O corpo mergulha, transpira, vive, vive como uma sílaba embebida numa simples folha em papel de parede, o espelho, a vida, o corpo que é o teu, simples, complexidade, circular, cúbico, os teus olhos, mergulhas, és esfinge, és literatura, espuma, mar, o corpo teu que voa, que tem asas, tua, minha, deles... destruída, a paisagem, tua, como uma janela despedaçada, húmida, partida, forçada..., tua, Tua..., um corpo e uma parede, nua, mergulha, cintila, e as pálpebras ao rubro, o desejo percorre as mandíbulas da rua,
Nua, tu, tua, o corpo, o teu, aquele que alimenta os espelhos, aquele que acompanha a Primavera, aquele que embrulha os tristes lençóis de seda, aquele teu corpo de ler, invisível, como as palavras nele, como as palavras nele escritas, desenhadas, premeditadas...
O corpo, o teu belo corpo em cerâmica e pintado com os dedos finos às lâminas da mão do prazer, uivos, gritos, gemidos, pedras partidos vidros, o corpo, teu corpo de ser...
Escrever,
Sexo?
Quando a mulher existe, quando a mulher se transforma em pedra anelar, em Lua, luar..., em planeta, foguetão, em astronauta, quando o corpo da mulher submerge até ao infinito cubo silêncio dos pássaros vadios, rebeldes, como tu, em teu corpo, simples, de palavras, as palavras do ser...

(não Revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó

domingo, 28 de julho de 2013

Não estou em casa, hoje...

foto de: A&M ART and Photos

Esquilos, nozes em vozes, mamilos denegridos, absortos, lábios lânguidos, corpos absolutamente sós, como eles, e como nós, os vizinhos quando lhe batiam à porta em maciça madeira, ele, ainda embriagado pela poesia não escrita, escondia-se, fazia-se... morria, não percebendo depois, que tudo era a fingir, acordava, voltava a dormir, deixou de sorrir, deixou de viver, não queria passear-se pelas cansadas margens de um doente rio, vivia-se, e ia-se vivendo, não sabendo, nunca, o horário penumbro das amendoeiras em flor,
Descia-se,
Subia-se,
E chorava-se,
Esquilos vaidosos roendo nozes de brincar, fantasia, histórias ao almoçar, sobre uma pequena mesa, de pedra, no quintal, uma árvore e um pássaro, preto, bico amarelo,
Melro?
Melro, talvez, porque não?
Inchados, os pilares de areia que seguram as amarras das tristes varandas com murchas flores, ao longe, a praia, o silêncio, o corredio de machimbombos vomitando sonhos adormecidos entre o Baleizão e o Mussulo, batiam-me à maciça madeira porta, eu, eu escondia-me, ou simplesmente berrava
Não estou em casa, hoje,
E eles, elas, acreditavam..., tão parvos, e continuava fingindo dormir, quando na verdade, eu, eu estava morto, desde criança, morri, recordo-me vagamente, tinha alguns poucos, não muitos, seis anos de vida, lembro-me como se fosse hoje, era Setembro, brevemente começavam as vindimas
O que são vindimas, pai?
É o apanhar das uvas...
Uvas, o que vão uvas, pai?
Não percebia que as videiras
Pai, sim filho, o que são videiras?
Não percebia que as videiras davam uvas, que existiam cachos, e lembro-me como se fosse hoje, era Setembro, quase, quase começavam as vindimas, e lembro-me, morri, depois, embrulharam-me num lençol de água salgada, permaneci assim cerca de vinte e oito dias, era Outubro, caiam as folhas das árvores, e eu, eu perguntava-me porque caiam as folhas das árvores,
O que são vindimas, pai?
É o apanhar das uvas...
Uvas, o que vão uvas, pai?
Não percebia que as videiras
Pai, sim filho, o que são videiras?
E pela primeira e última vez, eu, eu tive vergonha de perguntar ao meu pai
Pai, porque caem as folhas das árvores?
Eu tive vergonha de perguntar ao meu pai se esta terra era para sempre ou apenas para eu brincar, e começaram as chuvas, e o frio, a geada e a neve, e eu, eu morto, fui ficando, fui ficando... embrulhado num lençol de água salgada.

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó

no incenso partilhar...

foto de: A&M ART and Photos

imagino-a sonolenta
como as gaivotas de Agosto
partilho
não partilho
como o cacimbo das tuas mãos
quando mergulhadas no incenso partilhar...

… e partilhei

imagino-a sentada sobre o sorriso pôr-do-sol
como palmeira envenenada
partilho
não partilho
como a chuva miudinha sobre a terra queimada

… partilhei
e amei

quem sou imaginando-a sonolenta
aos espelhos verticais das cidades encantadas
partilho
não partilho
desejos e marés das velhas madrugadas

… e partilhei
e amei

as mãos tuas partilhadas.

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó

Um silêncio de espuma com sabor a areia branca

foto de: Francisco Luís Fontinha

Um silêncio de espuma com sabor a areia branca, o mar, as gaivotas poisadas em mastros invisíveis, brincando, correndo, sentado, inventando..., sonhando com um ferrugento triciclo com assento em madeira, pobre, apodrecida, um silêncio de espuma, saltitando os círculos da infância, com sabor a areia branca,
Mentiras descendo a calçada, abraços, como velhos guindastes de aço, perdidos entre a cidade dos vidros, mentiras, correndo, dançando, brincando como as crianças, que somos, ontem, que fomos, hoje, doces, vaidades imperfeitas, de espuma, os olhos brilhando entre mim e a minha pobre sombra, a criança, eu, imagino papagaios em papel descendo a calçada
As mentiras?
Também, como eles, chegando até mim, cansados, fartos de me ver pendurado na nuvem número cinco do primeiro andar esquerdo, as escadas, muitas, cansadas, assobiavam como quando eu imaginava acariciar-te a pele de luminosidade sonsa, insossa, acabada de transcrever as últimas palavras de ti, o teclado preso nas minhas mãos, o papel prendia-se-me nos dedos, e eu
Nada fazia, em vez de tentar libertar-me..., sonhava beijar-te debaixo das acácias em flor, e eu, nada, fértil, as palavras deambulando sobre a velhíssima máquina de escrever, o teu corpo transpirava de prazer, a fita prendia-se nos teus seios, brotava pingos de tinta, o preto e o vermelho, misturavam-se nas janelas do palheiro de Carvalhais, ouvíamos um som esquisito, tonto, como as pedras descendo violentamente a montanha do Adeus, eu, eu desejava-te no meio de toda aquela canalhada porcaria de velharias, máquina de escrever sobre o teu peito, o zurrar da Singer comendo pedaços de tecido, os livros, esses, chorando como crianças, que fomos e que éramos, um dia seremos como os cacos cerâmicos que brincam na nossa sala de jantar, um dia, um dia
Tu e eu,
Seremos os espelhos desprovidos de quaisquer imagem nocturna, o preto e o vermelho, sobre o teu corpo, a fita desenrolada da máquina de escrever, o teclado, esse, mais pezorro do que as tuas coxas de rosa perfumada, deixavas o papel entalado na ranhura, batíamos as teclas como se estivéssemos a destruir a espessa e dura casca da amêndoa encontrada no sótão da casa que tínhamos inventado dentro de nós,
Tu e eu?
Nunca,
Tu e eu, dentro do silêncio de espuma com sabor a areia branca, o mar, as gaivotas poisadas em mastros invisíveis, brincando, correndo, sentado, inventando..., sonhando com um ferrugento triciclo com assento em madeira, pobre, apodrecida, um silêncio de espuma, saltitando os círculos da infância, com sabor a areia branca, eu, a criança brincando com a máquina de escrever que mais tarde, muitos anos depois, me foi oferecida, o teclado teus seios rangiam durante a ténue luz do quarto nu embebido no divã com a colcha azul com flores em sorrisos doirado, o papel, na ranhura, amarrotado, como hoje, a pele do teu corpo, deitado, sobre uma das prateleiras da biblioteca, estás misturada em três partes de ti e uma de livro, pareces o inferno quando corríamos calçada abaixo, quando o teclado de ti escrevia palavras lindas, como imagens a preto-e-branco, sempre, sempre antes de acordar o pôr-do-sol...
Tu, e, eu,
Nunca.

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

… e ardes dos livros envenenados...

foto de: A&M ART and Photos

... e ardes como pedaços de papel sobrevoando a poeira madrugada dos livros envenenados...
o putrefacto poema vagueia como infinitos gemidos suspensos na árvore do desejo
dormem como cadeiras vazias as lâmpadas húmidas do corpo teu mergulhado em sons melódicos
ardes como os beijos
que nascem nos lábios do amanhecer,

Amor mergulhado em silêncio poeira que a insónia deixa nas flores com esqueleto de pedra...
uma mão traiçoeira sobe cuidadosamente os degraus da manhã de porcelana
… e ardes
como invisíveis sílabas na lareira da fome
ou de uma janela o cansaço viver como cordas de nylon em pingos de sémen,

Oiço-te na sonolenta despedida do calendário de parede
e ardes...
como pequenas palavras em suor teus seios de ébano
percebo o teu olhar entre as cinzas da lareira nocturna...
nas flores com esqueleto de pedra encarnada,

… e ardes
dos livros envenenados...

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó