sábado, 3 de dezembro de 2011


59,4 x 84,1 (desenho de Luís Fontinha)

59,4 x 84,1 (desenho de Luís Fontinha)

O mar e o desejo de amar

O sol os rios e as estrelas
O mar e o desejo de amar
O céu cansado das minhas preces
E desiludido com as minhas palavras

O sol os rios e as estrelas
E o teu corpo pregado ao silêncio do prazer
O mar e o desejo de amar
Na minha mão antes de adormecer.

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

O beijo do girassol

Entre mim
E o silêncio
E o muro de cimento armado
Esconde-se o beijo do girassol
Desce até à sapata
E quando toca na terra evapora-se nas sílabas da tarde

As horas de um velho relógio de pulso
Cansam-se e começam a abrandar a marcha
Até se imobilizarem nas encruzilhadas da vida
E o tempo na mão de deus
Olha-o
Olha-me

E cerram-se os cortinados da tarde
E da janela o cheiro intenso a solidão
Que poisa nos lábios de pombas amestradas…
Os palhaços saltam o muro de cimento armado
E acariciam o beijo do girassol
Entre mim e o silêncio

59,4 x 84,1 (desenho de Luís Fontinha)

Desenhos de Luís Fontinha

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011


84,1 x 59,4 (desenho de Luís Fontinha)

Um país que se afunda

Há um país que se afunda
De nome Portugal
Há um povo corcunda
De tanto imposto
Com desgosto
De ler no jornal
Que o país Portugal
Poderá chegar ao natal
Mas não passará de agosto
Há um país que se afunda
De nome Portugal
Há um povo corcunda
Nas mãos de uma EU desgovernada
Incompetente
E contente
Há um povo corcunda
No Portugal que se afunda
Sem culpa de nada…

quarta-feira, 30 de novembro de 2011


59,4 x 84,1 (desenho de Luís Fontinha)

59,4 x 84,1 (desenho de Luís Fontinha)

59,4 x 84,1 (desenho de Luís Fontinha)

59,4 x 84,1 (desenho de Luís Fontinha)

Pergaminhos do desejo

Uma cidade extingue-se no orgasmo da fome
Nas ruas as árvores gemem
E um rio cansado de viver
E de correr para o mar
Esconde-se entre os pergaminhos do desejo
Deixo de existir

Evaporo-me no orgasmo da fome
Tal como a cidade
E o rio
E o desejo
Há silêncios sobre a mesa ao jantar
Quando o mar engole o rio

Deixo de existir
Deixo de caminhar
Deixo de viver

Uma cidade extingue-se no orgasmo da fome
Nas ruas as árvores gemem
E um rio cansado de viver
E de correr para o mar
Deixo de existir
Deixo de caminhar
Deixo de viver

E a cidade arde quando acorda a noite.

Urgente – Procuro Trabalho

Procuro trabalho em qualquer área, zona do país ou estrangeiro.

Dados Pessoais:
- Estado Civil: Solteiro;
- Nacionalidade: Portuguesa;
- Idade: 45 anos;
- Naturalidade: Luanda/Angola;
- Carta de Condução;

Formação:
1989/1990 – Técnico de Desenho de Construção Civil; CICOPN
Curso de Formação Profissional

Habilitações Literárias:
- 12º Ano de Escolaridade, 1º curso via de ensino;
- Frequência Universitária (Engenharia Mecânica);
- Acção de Formação Teórico-Prático ao Método dos Elementos Finitos;
- Curso de Iniciação ao Matlab;

Experiência Profissional:
- 1990- 2000 – Desenhador de Construção Civil (AutoCad):
- 2001-2004 – Empregado de Escritório (António Luís Magalhães & Sobrinhos, LDA);
- 2004-2010 – Desenhador de Construção Civil;

Experiência Profissional Adicional:
- Conhecimentos de Cálculo de Estruturas (Programa Cype);
- Conhecimentos do Programa de Elementos Finitos (Ansys);
- Conhecimentos de Fortran;
- Experiência em hardware;


59,4 x 84,1 (desenho de Luís Fontinha)
Cansei-me de enviar currículos e por razões políticas o meu nome ser vetado. Cansei-me de escrever, cansei-me de desenhar ou pintar e cansei-me de ler.
Não me interessa enviar mais currículos, não me interessa escrever, pintar ou ler, aceito trabalho em qualquer área, mesmo se necessário a vender droga.

terça-feira, 29 de novembro de 2011


59,4 x 84,1 (desenho de Luís Fontinha)

59,4 x 84,1 (desenho de Luís Fontinha)

59,4 x 84,1 (desenho de Luís Fontinha)

Que cidade esta

Que cidade esta
Em suspiro dentro de mim
Que cidade esta
Sem se importar que eu durma no jardim,

Que cidade esta
Onde nas ruas uma voz é escuridão
Que cidade esta
Esta cidade do meu coração.

Que cidade tem um rio
Que bela cidade tem o vento
E gaivotas, e uma rosa amarela,

Tem gente apressada
Tem crianças em sofrimento…
Donzelas de calçada,

E veleiros com frio.
Que cidade esta
Que cidade tão bela.
As RATAZANAS proíbem-me de TRABALHAR, acorrentam-me os braços e as pernas, mas esqueceram-se do mais importante; cortarem-me a cabeça…
E eu não quero ser artista, e eu não quero ser escritor e eu não quero ser poeta, só quero TRABALHAR e pagar impostos.

59,4 x 84,1 (desenho de Luís Fontinha)

Taquiões

(Ao amigo Necas Grifo)

Procuro taquiões
Na palma da minha mão
E talvez não estejam nelas (mãos)
Talvez habitem numa casca de banana
Em sorrisos de donzelas
Putas e belas
Ai que cena!
Ai que cena a tua mão pertencer a ontem
Quando ainda chovia dentro do teu silêncio
Ontem
Conversei com electrões
Conversei com a tua mão deserta
Não…
Não estou louco
Doente mental
Tenho de tudo um pouco
Ilusão
Sonhos de sonhar
E putas e belas
Elas
Queridas donzelas…
Escondem-se no corredor do infinito
E deixam a porta aberta
Transparente
E esperam
A chegada de taquiões.


Luís Fontinha
Alijó, 8 de Agosto de 2010

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

A miúfa

A miúfa pendurada nos meus olhos quando ao meu lado direito um plátano pregava um sermão aos transeuntes, cansado de os ver apressados pela rua parecendo bengalas suspensas na dentadura postiça do meu vizinho, sabes que horas são, si lá, não sabes, nem sei que dia é hoje quanto mais que horas são, o meu vizinho puxa de um cigarro, enrola-o na língua, mistura-o com a saliva e de labareda em punho, a luz da sala acesa, o fumo engasga-se junto às panelas que na cozinha esperam pela chegada da Silvina, e a Silvina nos terrenos com a focinheira na terra, as cabras sobem e atravessam os muros da tapada, a terra dispersa engole o cansaço da velhice, e no telhado a brancura da neve, as pernas empobrecidas e das mãos calejadas da enxada o sorriso da erva em banhos de imersão, o palheiro, o canastro entupido de milho até à porta de entrada, na eira três galinhas e um porco passeiam-se junto ao mar, Belém, Cascais,
- O Tejo preso a uma âncora, e o Tejo não foge, o Tejo quietinho no cantinho esquerdo da eira, o neto brinca com pequenas pedras, e de vez em quando, de vez em quando atira-as contra o areal de milho, perde o olhar dentro no feijão estacionado entre o milho,
E Cascais, Belém, Cais de Sodré, e putas, e a Silvina já noite, pelo meio da sombra carrega à cabeça erva em gemidos solitários, os coelhos com fome, as cabras à sua frente de lanterna na cabeça, o caminho misturado de cascalho e tojos, e foda-se,
- Piquei-me,
E na cozinha as panelas esperam a Silvina, descarrega a erva como se fosse uma burra de carga, no quarto o marido espetado no tecto à espera que lhe mudem a fralda, o cheiro a merda, a merda da vida, a vida a esfumar-se pela claridade da candeia, o cheiro intenso do azeite encosta-se nas paredes do corredor, e pensa,
- Que saudades de ir ao terreiro, baixar as calcinhas até aos tornozelos, e mijar docemente como uma semente de malmequer, o frio intenso no rabo, e do quarto uma voz gritante,
Silvina, estou cheio de merda.

(texto de ficção)

59,4 x 84,1 (desenho de Luís Fontinha)

Lábios em desejo

Constrói-se o poema erótico
Dentro da fogueira do púbis
E nas palavras que não consigo escrever
(porque sou mais estúpido que uma porta e insensível)
Essas
As palavras que saltitam nos lábios em desejo
Nascem dois malmequeres com cabeça de abobora

Juntando à minha cabeça de abobora
Perfaz três cabeças de abobora
E um poema erótico
E um púbis que se evapora
Nas árvores estacionadas junto ao mar
Pergunto-me – E Agora?
(e porque sou mais estúpido que uma porta e insensível)

Cerros os olhos
E em pedacinhos a minha cabeça de abobora
Voa nos lábios acinzentados de gaivotas enjoadas
O resto do meu corpo em migalhas de pão
(e porque sou mais estúpido que uma porta e insensível)
Um candeeiro junto ao Tejo olha-me
Como se eu fosse um mendigo à procura de abrigo…

59,4 x 84,1 (desenho de Luís Fontinha)

59,4 x 84,1 (desenho de Luís Fontinha)

Tenho três cabeças, quatro pernas e cinco braços

Tenho três cabeças, quatro pernas e cinco braços, vivo dentro de uma rosa e às vezes pintam-me de encarnado, tenho a madrugada dentro de mim, e sou o dono legítimo das nuvens, legado em testamento pelo sol; sou muito rico. E sou o proprietário do luar.
Vivo em jardins emprestados, e sou alimentado pelo olhar dos apaixonados, tenho três cabeças, quatro pernas e cinco braços, oiço música clássica e às vezes alicerço-me nos lábios de uma gaivota, ela sem asas, não voa, nunca voou, ela não três cabeças, ela não quatro pernas, ela não cinco braços, ela, ela apenas possui olhos de mar e deita-se no pôr-do-sol.
Eu cinco braços e nunca voei, e ele pergunta-se, e eu pergunto-me,
- como será voar!
E ele pergunta-se como será voar, ser o dono da manhã quando a tarde começa a acordar, e das três cabeças às vezes pintadas de encarnado apenas dois olhos, um par de lábios e quatro narizes, e eu pergunto-me, e ele pergunta-se,
- porquê?
E eu pergunto-me,
- porquê a ela?
Vivo dentro de uma rosa e às vezes pintam-me de encarnado, tenho a madrugada dentro de mim, e sou o dono legítimo das nuvens, sou o menino dos sonhos que perdeu-se junto à praia, e a praia ficou lá, a areia finíssima ficou lá, o esqueleto veio, eu fiquei lá, ele ficou lá, e pergunto-me, ele pergunta-se,
- porquê? Porquê a ela?
Ninguém. E ninguém. Ninguém me responde porquê, e se ao menos o silêncio me explicasse porquê, se ao menos o silêncio lhe explicasse porquê ela, mas ninguém, e ninguém junto às árvores, e as árvores com os pezinhos enterrados na areia, muitos braços, mas como eu, mas como ele, não sabem voar, e alguém pergunta,
- porquê?
Se ao menos o meu corpo de tungsténio… e o meu corpo não tungsténio, o meu corpo frágil que vive dentro de uma rosa, tenho três cabeças, quatro pernas e cinco braços, e pergunto-me, e ele pergunta-se,
- porquê ela?

(texto de ficção)

domingo, 27 de novembro de 2011


59,4 x 84,1 (desenho de Luís Fontinha)

59,4 x 84,1 (desenho de Luís Fontinha)

59,4 x 84,1 (desenho de Luís Fontinha)

Os poemas da noite

Retiro do teu corpo
As palavras com que construo os poemas da noite
Pinto os teus desejos
E desenho os teus gemidos
Na tela dos lençóis de seda
Onde poisas o silêncio dos teus lábios

E guardas religiosamente
As nuvens da manhã
Que são as tuas mãos…
Retiro do teu corpo
As palavras com que construo os poemas da noite
E quando grito Amo-te à janela virada para o mar…

O teu corpo mistura-se no meu
Os teus desejos
E os teus gemidos
Na tela dos lençóis de seda
Saem da janela virada para o mar
E transformas-te em maré