Mostrar mensagens com a etiqueta o amor. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta o amor. Mostrar todas as mensagens

domingo, 8 de setembro de 2013

Aqui não há nada

foto de: A&M ART and Photos

Aqui não há nada,
pensava eu,
aqui vive-se acreditando nos lençóis de insónia que durante a noite acordam das madrugadas incolores, os corpos vagueiam como pedras caindo do terceiro andar, depois uma fina chuva de sorrisos cai nas esplanadas cinzentas das avenidas ainda incógnitas, ainda virgens como árvores por descobrir no quintal lá de casa, abriam-se a janelas, abriam-se as portas e
pensava eu
aqui não há nada,
Depois diziam-me que as coisas iam melhorar, diziam-me que amanhã o sol acordaria dentro de mim, e eu, chateado
(acorda o caralho... porque só vejo calhaus e ferros em aço pedindo migalhas de pão)
chateado ouvia-os no varandim da casa amarela escrevendo frases de revolta na sombra dos lábios inchados pelos pequenos morcegos de negras asas em cartolina, e diziam-me que amanhã
Amanhã tudo será diferente,
(o caralho que será)
Amanhã como hoje, amanhã como ontem, amanhã como há vinte e cinco anos, as palmeiras, os semáforos avariados, as tuas coxas magricelas parecendo esteios de xisto mergulhadas em ocas palavras em desejo, amanhã, amanhã e ontem, e hoje, e amanhã as tuas mesmas coxas de ontem, iguais nada em ti mudou, nada... nem a cor dos olhos, da pele, do púbis, tudo igual, porra
(muda, amanhã, o caralho...)
Amanhã,
Muda, muda de coxas, muda de seios, muda a cor à pele de marinheiro poisando os cotovelos na escotilha do submarino que há dentro de ti, muda, alimenta-te de mim, alimenta-te dos pedaços de rosa que deixaste meus no interior de um livro, ainda existe?
Existes tu, coxas magricelas, leves, invisíveis quando o sol levanta voo e alicerça-se no teu peito doirado, chovia em ti, molhavas-te para te esconderes em mim, e de mim, e o amor és isto
(uma merda escrita num papel e outra merda descrevendo círculos numa branca tela, virgem, fina, magricelas, igual às tuas lâminas coxas)
Amanhã...
Existes em mim?
Claro que não, claro que n ã o...
Nunca
(muda, amanhã, o caralho...)
Porque aqui, aqui não há nada.

(Não revisto – Ficção)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 8 de Setembro de 2013