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sexta-feira, 25 de novembro de 2022

Os pequenos lençóis do sono

 Este homem que vos escreve

Com um braço de sono no coração

E daquele livro em construção

As muralhas da cidade

Em círculos de insónia.

 

A fogueira esconde-se na algibeira dos sonhos

Junto à janela

Amo-te enquanto os teus pedacinhos de mel

Dormem sobre o meu peito

Onde juntamente com os teus pedacinhos de mel

Uma espada rouba-me a tua voz.

 

Não durmo enquanto a lua não acordar

Não durmo enquanto dos cortinados dos meus sonhos

Os pássaros da madrugada subirem a montanha

E procurarem-me em vão

Como se eu fosse uma sombra de pedra

Sem perceber porque morrem as abelhas.

 

O meu corpo parece um pequeno silêncio de espuma

Na secreta lápide onde escondo as nuvens

E nesta mão

Este homem que vos escreve

Dorme nos lábios da cidade.

(dos pequenos lençóis do sono)

 

 

 

 

 

Alijó, 25/11/2022

(Francisco)

terça-feira, 18 de outubro de 2022

Castelo da alvorada

 Não tenho castelo,

Não tenho jardim no meu castelo,

Não tenho a lua,

Não tenho aquele rio que partiu,

Não tenho janelas,

 

Portão…

Não tenho árvores no jardim do meu castelo,

Não tenho o mar,

Maré nas tuas coxas,

Não tenho os seios do teu castelo,

 

Não tenho os lábios da manhã,

Não tenho fortuna,

Não tenho o silêncio nocturno da solidão…

Não tenho castelo,

Mas tenho a tua mão,

 

Não tenho os pássaros,

Não tenho as nuvens,

Não tenho castelo,

Não tenho a chuva,

Nem tenho o vento,

 

Não tenho a madrugada.

Não tenho a luz,

Não tenho palavras,

Não tenho castelo…

Mas tenho a alvorada.

 

 

 

Alijó, 18/10/2022

Francisco Luís Fontinha

domingo, 16 de outubro de 2022

Os pássaros também choram

 Desta árvore onde me sento, não vejo o mar. Nesta árvore onde durmo e sonho, não vejo o mar. Nesta árvore onde poiso as minhas mãos frias e amarguradas, vejo o mar.

Serão os meus olhos as janelas com fotografia para as infinitas tardes de Primavera? Sentado neste cadeirão, enquanto pela janela chegam a mim as palavras que nunca te direi, desisto de olhar-te, desisto de mentir-te; um dia, qualquer dia, perceberás que os pássaros também choram.

Que as árvores também choram. Que tu choravas enquanto eu desenhava em mim todas as lágrimas dos longínquos coqueiros, que tu choravas enquanto eu semeava palavras nas tuas chagas.

Os pássaros também choram. As flores, ao contrário dos pássaros, dançam, brincam, erguem-se até às nuvens; os pássaros choram, as flores, as flores que tinhas sobre o peito, não choravam, mas… voavam.

Voavam como voam hoje as tristes equações do sono, voavam como voam hoje todas as manhãs sem poesia, do corpo, do teu corpo, lanço sobre ele o poema em cio, vagueio e não choro, levanto-me do chão, poiso a minha mão sobre os teus seios de amanhecer, e acreditando que os meus poemas são as delícias do teu olhar, olhava-o, colocava-lhe a mão sobre o débil peito e, cansei-me de desenhar palavras nas tuas mãos. Seria melhor teres voado…

Desta árvore, observo-te. Lanço sobre ti o silêncio, lanço sobre ti a espada do sonho e, não, não digas que os pássaros não choram, porque os pássaros, como tu, também choram, também brincam, também morrem.

E morrem de quê, meu amor?

De alegria, minha querida, morrem de alegria.

Como os poemas que te escrevo.

Como os poemas que te escrevo e guardo-os dentro da algibeira da insónia, e acredita que morrem de alegria; e nas suas asas transportava uma manhã de Primavera.

Quanto tempo, doutor?

Duas semanas, duas semanas,

Duas semanas poisado sobre esta árvore à espera de que os pássaros chorem, à espera de que esta mesma árvore, também ela, chore

De tristeza?

Não minha querida, de alegria.

Um dia a casa despediu-se dele. Enquanto voava pelo corredor, olhava todos os objectos, e ambos sabíamos que nunca mais os olhava; e ambos sabíamos que o jardim que se despedia dele, um dia, hoje, é apenas terreno agreste, é apenas pó.

E voaram, meu amor.

Os pássaros também choram?

E as árvores, e as casas, e este rio que te olha, e este mar que te banha quando a maré entra pela janela e um orgasmo de palavras se abraça ao teu olhar. Depois, tivemos a visita das sobejantes árvores onde podíamos ver as lindas manhãs de Primavera, como se a Primavera naquela tarde fosse uma pedra mágica.

E depois, minha querida?

As tardes de ninguém,

Ouviam-se-lhe as gargalhadas em despedida, mas o sono levou-a para os infinitos murmúrios da solidão, e dizem que hoje vagueia pelas ruas da cidade em busca de pincelados sorrisos.

Não sei, meu amor…

De tristeza?

Não minha querida, de alegria.

E nunca percebemos porque choram os pássaros; os pássaros da minha vida.

Alegria, meu amor?

E só quando as fotografias estão em silêncio é que percebemos que os pássaros, as árvores, os poemas, choram…

E os barcos, meu amor?

Esses, brincam nas minhas mãos…

 

 

Alijó, 16/10/2022

Francisco Luís Fontinha

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2022

Nuvem granítica da saudade

 

Às vezes, o sol parece uma nuvem escura,

Fria,

Às vezes, o sol parece um sonho,

Um jardim florido.

Às vezes, as palavras parecem uma tempestade,

Um dia estupidamente feio.

Às vezes, o mar é uma ilha,

Outras,

Um corpo cansado,

Às vezes, o sol parece uma fogueira,

Ou um poema recheado de nadas.

Às vezes, eu sou o sol,

Outras,

Sou a nuvem granítica da saudade…

Às vezes, temos o sol pincelado de noite.

Às vezes, temos a noite pincelada de sol…

Às vezes, o sol parece uma nuvem escura,

Fria e cinzenta.

Às vezes, o sol é um pássaro,

Uma flor esquecida na avenida.

Às vezes, temos o sol,

Às vezes, o sol tem-nos a nós.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 21/02/2022

sexta-feira, 3 de maio de 2019

A morte


A morte.

A tempestade dos cadáveres poéticos,

Quando do espelho, ao anoitecer, a mão do poeta sufoca o próprio poeta.

O comboio alimenta a morte,

O poema,

O texto.

O corpo do poeta evapora-se nos lábios de uma rosa,

Voa,

E chora ao anoitecer.

A morte.

A fragrância das palavras deitadas sobre a mesa,

Um candeeiro a petróleo vomita lágrimas de luz,

Escrevo,

Apago o que anteriormente escrevi,

Porque não faz sentido,

Porque a morte é parva, estúpida e ignorante…

A faca,

O pescoço alicerçado à lâmina,

O frio do aço que escorrega debaixo das mangueiras,

E nos braços, junto aos pulsos, a cratera do desespero,

Sem perceber o significado do sonho!

As nuvens suspensas na madrugada,

De hoje,

De ontem…

E de amanhã.

A morte,

A sagrada morte num corpo sofrido, silenciado pela sombra…

Nos teus braços.

Adormecer.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

03/05/2019

terça-feira, 23 de julho de 2013

Não me fazes sentido

foto de: A&M ART and Photos

Não me fazes sentido
ouvir-te mergulhada em palavras não ditas
quando o divã das tardes perdidas navega na seara da insónia
ouvir-te ou não ouvir-te... voando como cigarras debaixo das nuvens cinzentas
não me fazes sentido
porque os livros morrem nas encostas dos teus olhos navegáveis,

Os barcos tuas mãos com velas em desejo
descendo cuidadosamente os trilhos da calçada Portuguesa... o cais
e as distintas amarras que o nylon transforma em pedaços de aço
em beijos
os barcos salgados das páginas amarrotadas tua pele...
folheio-as e preciso de ancorar no teus seios com janelas para o mar,

Não me fazes recordar as montanhas cobertas de neve
não vejo os navios das tuas pálpebras brincando nas areias brancas
que as tuas coxas escondiam como serpentes embalsamadas...
não
não o quero porque sou um peixe invisível com asas de perdão
e carapaça escorregadia à deriva sobre os teus cabelos de vento...

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

sábado, 20 de julho de 2013

Bailarino, tu!

foto de: A&M ART and Photos

Projecto-me tridimensionalmente no muro onde poisas, todas as noites, os cotovelos, seguras a tua doce cabeça com as pequeníssimas mãos de menina apaixonada, olho-te como se fosses uma imagem prateada tingida com pedaços de azuis cerejas que numa tela simplesmente mergulhada na noite desgovernada, ela, absorve-te, alimenta-se de ti como as abelhas do feminino pólen com sabor a masculino desejo, e depois de saber que és uma imagem prateada tingida..., os pedaços de azuis cerejas borbulham-se-te com cobertores suspensos numa janela dançarina, bailarina eu?
Bailarino, tu!
E de ti como as abelhas, desisto das parvas palavras que finges ler, como fingias as noites dos cortinados de Lisboa, baixavam-se as tímidas persianas do amor também ele..., tímido?
Bailarino, bailarino sem profissão conhecida, artista sem arte, Tímido, eu? Que me dera ser como tu, uma triste alga dentro do rio sonolento das varandas com gradeamentos enferrujados, tristemente, eles, dentro de ti, às sílabas farto eu escrever, Tímida ela?
Perdia-se-lhe os mínimos sons da sua voz nas pétalas doiradas das rosas transeuntes das ruas prostituindo-se como reles bancos de jardim, onde todos se sentam, e eles... apenas estão lá, não pelo prazer, apenas estão lá porque os obrigam a estar, porque se não fosse dessa forma...
Tímidos?
Os corpos reluziam como gaivotas, e das ripas em madeira dos teus ombros, as alegres asas de porcelana, meu amor, Tímida? Quando sei que o teu corpo é incenso que arde num prato de cobre, música alimenta-se em ti, e os versos
Bailarino, tu!
E de ti como as abelhas, desisto das parvas palavras que finges ler, como fingias as noites dos cortinados de Lisboa, baixavam-se as tímidas persianas do amor também ele..., tímido?
Versos no cardápio ao preço de vinte e cinco euros a dose, aprece muito, isenção de IVA, e com a oferta de uma bebida branca...
Bailarino tímido, eu, ou tu?
Tenho uma vida cúbica, tenho sonhos quadrados e sofro em círculo, sou um perfil geométrico, alimento-me de senos e cossenos, fumos tangentes hiperbólicas, e faço o amor com as equações diferencias..., afinal, quem sou eu? Um pedinte matemático? Um bailarino/Bailarina, Tímida? Um hipercubo com braços de esperma descendo escadas de cinzentos soníferos com orifícios a imitar as janelas de luar?
Bailarino, tu?
És um triste, és uma integral tripla sobrevoando o momento fletor dos teus livres seios na viga do desejo... oiço-te gemer, a musicalidade da tua boca é uma pauta com sons débeis, difíceis de engolir, fáceis de mastigar..., textos, palavras, livros bolorentos entre vacas e carneiros no centeio do tio Joaquim, vivíamos como dois palhaços embriagados pelos sorrisos das marés envergonhadas dos longínquos mares que descobrimos nunca terem existido..., e o vento
E o vento vai desalicerçar a tua singela estrutura de bailarina rodando em redor do teu centro de massa cuspindo momentos angulares como fazem as nuvens antes de adormecerem nos teus braços...
Ainda acreditas, que, eu, Bailarino... Tímido?

(ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

sexta-feira, 21 de junho de 2013

O colorido poema tridimensional submerso sobre a falsa areia

foto: A&M ART and Photos

Praia, mar, sol... poesia, corpo, poético entre os raios coloridos do nocturno desejo, o colorido poema fantasiado de arraial círculo que em noites de Verão rompem na aldeia como lâmpadas sobre o tecto silêncio da pele saboreada pelas sombras de mim,
Louco, ele, ela, as coisas compostas e as não compostas,
O colorido poema tridimensional submerso sobre a falsa areia, as conchas de plasticina alicerçam-se aos tentáculos da solidão, há uma mulher em fuga, esconde-se debaixo da palmeira do largo S. João, ouvem-se ainda réstias de migalhas que sobejam da boca dos pássaros esfomeados, transformados em lenços de papel, da algibeira, a mulher em fuga, guarda uma chave, e não sabe, e nunca conseguirá saber... que porta se abrirá...
De entra, poderá ser uma porta de saída, dizem-me que todas as portas servem para entrarmos, e sairmos, ou para alguns se suicidarem, conforme o meu vizinho do rés-do-chão direito, coisas tão simples, que nós, às vezes, os vizinhos, complicamos, com a amizade, me despeço de ti até sempre, e nunca
Nunca mais apareceu junto aos arbustos onde existia um granítico banco com escotilha para o Tejo, livrai-nos senhor destes abutres esganiçados pela carne apodrecida, esperando as árvores tombarem, ainda vivas, correndo pelos corredores da insónia,
Tenho a fome do prazer entre palavras e cristais líquidos, transparentes como a pele escaldante da musa inspiradora, sobre o sofá, de livro na mão e ouvido encostado à parede de gesso, do outro lado, dois corpos transpiram, desejam-se, e ouvem-se os gemidos do cansaço, um, dentro do outro, como o cimento cola a suspender azulejos brancos numa parede enferrujada de um velho cacilheiro, havíamos de descobrir o silêncio enquanto fazíamos amor
Foram as suas últimas palavras antes de descobrir que a caixa em madeira onde dormia, não era um quarto a sério como o da prima Augusta, mas sim, e só, a caixa de fósforos do tio Augusto, coincidência, hoje percebemos que nas equações diferenciais existem beijos disfarçados de loucos corpos, tórridos, de loucas, sebentas com capa de cabedal, e o amor, fazíamos-lo junto às prateleiras que hoje, quase todas, vazias, mortas, e nunca mais senti durante a noite aqueles passos trôpegos sobre o meu tecto, e nunca mais ouvi o telintar dos talheres esquecidos dentro de pratos em falsa porcelana, faiança milagrosa que serviu para sobrevivermos durante alguns meses, e nunca mais, senti, o clique... do interruptor da sala de jantar,
E assim, deixamos de ouvir o raiar da noite,
E quando se enfureciam, elas, entravam-nos pela janela como se fazia nas ruas antes de acordar o Verão, puxávamos os lençóis da neblina e começávamos a sonhar com poesia dissimulada em corpos tórridos...
Sem nuvens,
E assim, deixamos de ouvir o raiar da noite, sem nuvens, como dizíamos, azulejos brancos numa parede enferrujada de um velho cacilheiro, havíamos de descobrir o silêncio enquanto fazíamos amor...

(ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Indomáveis dos desejos escondidos

Nunca percebi o que eles queriam, mas nunca mais a nossa vida pacata foi a mesma, nunca mais tivemos noites com estrelas, e nunca mais vimos a lua
Com olhos de papel e boca de jasmim quando os últimos pedaços de tarde sobem a calçada e da Calçada galgam os muros vestidos de amarelo, pareciam moscardos complexos nas mãos de homens apaixonados, eles e eles, e elas e elas com eles,
E nunca mais vimos a lua transparente nas paredes indomáveis dos desejos escondidos
O que quero ser quando for grande?
Gostava de ser uma abelha sem colmeia, ou, ou uma roda dentada sem veios de aço ou correias transmissíveis, livre, voando como as nuvens quando o vento as leva para lá da janela do sótão e das traseiras do velhíssimo edifício de arame as escadas que levitam como os corpos das almas depois de despregadas dos telhados de vidro, às vezes, gostava
Dos desejos escondidos nas flores de areia que tu guardavas nas algibeiras de tecido aos quadradinhos como as grades das prisões, ou como as calças de um pescador quando saboreia docemente o seu cachimbo de algodão, e outras vezes
Gostava
Que as árvores carrancudas, sisudas, e de poucas falas, brincassem comigo, conversassem comigo, e no entanto, abraço-me a elas, e elas
E outras vezes, gostava, que o jantar fosse uma pintura numa tela com muitos beijos de acrílico e bocas de pastel e lábios de chocolate pincelados ao de leve com o bâton vendido pelo cigano da rua do Alecrim Doirado, gostava, e elas acreditavam que do céu vinham as notas de vinte euros que eu lhes dava (   )

(texto de ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha
Alijó

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Maré de Outubro


Oiço-te as palavras amargas
saltitando dentro de um cubo gelatinoso
ao vidro vêm as sílabas dos suspiros da manhã
às páginas em pétalas adormecidas
é no cansaço da vida que acorda a maré de Outubro
e os pilares de aço que sustentam as arcadas imaginárias dos barcos
dormem
tombam nos jardins cobertos de nuvens

peço às gaivotas que me deixem caminhar sobre o manto vertical de espuma
em cristais de iodo e sorrisos de silício

papeis dispersos nas ruas desenhadas nos lábios da cidade
em compasso
dormem
tombam nos jardins cobertos de nuvens

as tuas mãos de Primavera.

(poema não revisto)

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Nuvens de vidro


Uma nuvem de vidro
em lábios amores
à procura de palavras
e tenras flores

uma nuvem sem sentido
de vidro cansado e triste
às palavras sem sorriso
na maré que resiste

uma nuvem de vidro
à janela da madrugada
em lábios amores
amores de nada.

segunda-feira, 23 de julho de 2012

O esqueleto da nuvem de prata

O esqueleto da nuvem de prata
e lágrimas de papel
nos olhos
uns Ray Ban
que lhe davam um certo ar de ajeitado
fazendo-o parecer um esqueleto verdadeiro
de finíssimas famílias
e no entanto
não passava de uma nuvem de prata
com poeira de ossos
e lentes BL...
vivia num mundo inventado

e amava loucamente uma pedra
onde se sentava a olhar o rio
onde passeavam os barcos
e poisavam as gaivotas

e amava loucamente uma árvore
uma árvore de verdade
com coração de verdade
e amor de verdade

e lágrimas de papel.

quinta-feira, 5 de abril de 2012

Nuvens de porcelana

Hoje aprendi o que significa pompoar e em que consiste o pompoarismo, na ponta dos dedinhos finíssimas gotas de orvalho despedem-se da maré, lá fora, dentro de ti um silêncio no corredor da morte, vejo no teu peito a ingrime manhã ensanguentada de desejo,
- “Contrair e relaxar os músculos ao redor da vagina Explica a doutora…”,
O desejo enlouquece a Marilú que sentada numa cadeira segue religiosamente os cinco passos, exercícios simples que qualquer mão percebe quando toda a noite vive no infinito mausoléu da miséria, um corpo embalsamado sorri quando passo descalço em direção ao rio,
- “Contrair e relaxar os músculos ao redor…”, ao redor da madrugada quando procuras debaixo da cama os ossos que sobejaram da minha partida, hoje aprendi que a lua masturba-se em frente ao espelho do sol, hoje, hoje uns dizem que os subsídios de férias e de natal são histórias do passado, outros, outros que não, e enquanto a lua finge orgasmos de cristal, o povo fodido, o povo fodido…
As ratazanas que durante a noite deambulavam pelas casernas infestadas de fumo de haxixe, ao pequeno-almoço um copo de lata recheado de vodka e erva dos jardins de Belém, e o corpo em fio-de-prumo na formatura das oito horas tombava como as árvores no outono quando se despedem dos filhos,
- “Com o Ben-wa (bolinhas) ”,
Que coisa mais estranha minha filha Pijama com Bolinhas encarnadas, nuvens de porcelana e mendigos a exercitarem o pompoarismo, E o que diria o teu pai de tudo isto? Que sou feliz mãe, muito feliz…
Desisto Não nasci para pompoar nem para o pompoarismo,
STOP.

(texto não revisto)

segunda-feira, 2 de abril de 2012

A esplanada das horas

A purpurina manhã desce sobre a cidade melancólica, erguem-se as árvores e os pássaros e sentados na esplanada das horas, uma miúda gira, e sentados na esplanada das horas rompem entre candeeiros e luzes domesticadas as sandálias da infância, assobiam os calções à penumbra sombra que há em ti,
- Uma miúda gira solta a cabeça e desenha um beijo nas nuvens, E deixou-me adormecido até hoje, distante até hoje, olhas as mesas e as cadeiras sobre o pavimento alcatifado quando os dias se evaporam nas entranhas das tuas mãos, e depois, e depois sou apenas uma pomba desvairada à procura da primavera,
Já fui barco, já fui um edifício em ruinas, e a miúda gira, e já fui sombra com asas na ardósia da tarde, e a miúda gira semeia sorrisos no espelho da alma, e já dancei sobre uma mesa estacionada num bar sem nome sem gente sem palavras, e quando acordei estava nos braços da insónia, flutuava nos ais e uis da ponte que liga as duas margens, acordava com vómitos e vinha até mim o cheiro do mar,
- E depois vi esvaecer-se a porta, a janela, a parede, e depois à procura da primavera a pomba desvairada, visto-me de finíssimos fios de vidro e oiço da tua boca que me amas enquanto sobes as escadas até à montanha, sou feliz assim dizias-me tu quando poisavas a cabeça sobre o meu peito, e sempre soube que não eras feliz, sempre soube que te escondias das mangueiras e dos papagaios de papel, esqueci as sandálias da infância, e hoje vivo dentro da chuva,
(sou feliz assim dizia-me ele)
E não era.

(texto de ficção não revisto)

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Rio vadio

As nuvens adoram-me
Desejam-me
As nuvens que poisam na minha cabeça
E me cobrem
E me escondem debaixo dos candeeiros da manhã
Desejam-me
E cobrem-me
As nuvens pintadas de negro
Junto a um rio descolorido
Sem estrelas
Sem dezembro para sonhar
As nuvens que poisam na minha cabeça

E me escutam
E me olham
E desejam

Sem dezembro para sonhar
Tenho as nuvens negras
Junto a um rio descolorido
Vadio
Sonâmbulo amarrotado nos canaviais
Me cobrem e olham e desejam e se fundem nas minhas mãos

As nuvens que poisam na minha cabeça.