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quarta-feira, 3 de abril de 2024

Matemática

Se eu juntar o Sol com a geada,

e subtrair a madrugada,

elevar ao quadrado o luar…

Fico com nada,

e tu, talvez fiques com o mar!

Calculando a primitiva do teu olhar

juntamente com a raiz quadrada,

eu continuo a ficar com nada,

e tu, novamente com o mar!

 

Assim não dá. 

 

Diferenciando o silêncio do teu sorriso

e ao mesmo tempo,

dividir o meu cansaço pela falta de juízo,

obtenho a probabilidade do vento…

 

Assim não dá.

 

Se juntar o Sol com a geada,

adicionando o mínimo múltiplo comum da madrugada,

integrando o luar…

Fico com três folhas de papel perdidas na calçada,

e tu, ficas com o mar!

 

 

(Francisco)

domingo, 17 de setembro de 2023

Código binário

 Escrevo no teu peito o postulado da equação de Deus, na revolta dos teus seios em direcção ao exército da insónia, recordo a primeira equação da equação de Deus, e como poderei esquecer, se a escrevi no teu seio esquerdo, e como poderei me esquecer da integral do desejo, depois de elevar a raiz cúbica da paixão, à decima quinta potência de Zeus, perceber que pouco ou nada restou, a não ser, que tudo, mas tudo mesmo, é apenas a unidade.

O uno.

O uno divisível, que mesmo dividido em milhões de pedacinhos, será sempre o uno, o homem, o filho de Deus.

Escrevo no teu peito e de alguma coisa me vou esquecer.

Esqueci o teu nome, quando o escrevi milhares de vezes no folheto do meu coração, esqueci os teus olhos, o teu cabelo, sem cabelo, do vento, ao vento, entre mim e as primeiras lágrimas da manhã

Depois, traçamos uma recta de (A) até (B), e da equação dessa recta multiplicamos a integral solucionada na tarde passada,

Pifou, o gajo.

Escrevo no teu peito, SOCORRO, como se estivesse a ser perseguido pela revolta das enxadas do nosso querido Douro,

Oiço-os, sinto-os, lá longe, muito longe

Todos aqueles que morreram no Douro.

Escrevo no teu peito o postulado da equação de Deus, percebo que é complexa, percebo que este meu pobre computador nunca conseguirá encontrar uma solução, a não ser…

Voar sobre o mar.

E morrer no mar.

Escrevo no teu peito a sinceridade da noite, que aos poucos se entranha nos ossos, como lâminas de geada, como saliva misturada com aparas de madeira, o lápis sobre a mesa, a folha movimenta-se, eu escrevo no teu peito, o lápis esconde-se na minha mão, e tu,

Dormes sobre mim.

Escrevo no teu peito a maré que regressa, do Deus que se afasta, e me persegue enquanto não lhe resolver a equação,

Pifou, o gajo.

Voar sobre o mar.

E morrer no mar.

Escrevo no teu peito o postulado da equação de Deus, na revolta dos teus seios em direcção ao exército da insónia, recordo a primeira equação da equação de Deus, e como poderei esquecer, se a escrevi no teu seio esquerdo, e como poderei me esquecer da integral do desejo, depois de elevar a raiz cúbica da paixão, à decima quinta potência de Zeus, perceber que pouco ou nada restou, a não ser, que tudo, mas tudo mesmo, é apenas uma sombra abraçada à unidade; somos apenas Zeros e Uns. Somos código binário.

 

 

17/09/2023

(Ficção)

domingo, 2 de julho de 2023

Trigésima quinta madrugada…

 Amo-te dentro desta esfera em silêncio

Junto a este caderno quadriculado…

Amo-te na imensidão dos dias

E das noites

E das noites…

Sem os dias,

 

Amo-te como se estivesse a resolver uma equação diferencial ordinária de segunda ordem

Que não me vai fazer feliz

Resolvê-la

E que a única pessoa aqui feliz…

É o professor Mário Abrantes

Por eu a revolver,

 

Amo-te enquanto a Terra dá voltas ao Sol

E roda sobre ela mesma

Amo-te sabendo que do outro lado da rua

Brinca o mar

O mar da minha infância,

 

Amo-te junto a este hipercubo

Que está abraçado à matriz transposta da paixão…

Enquanto um beijo meu…

Anda por aí…

Entre a montanha

E a filha da montanha

E o chão,

 

Amo-te à vigésima quinta hora

Enquanto uma louca locomotiva se faz à estrada

Rumo aos rabiscos das minhas folhas de papel…

Amo-te dentro deste complexo casaco de forças

Em perfeito equilíbrio

Em X

Em Y

E em Z,

 

Amo-te à trigésima quinta madrugada…

Sem dormir

Quando dentro desta esfera em silêncio

Me obrigam a calcular o seu volume…

Idade…

E o sexo,

 

Antes que a noite te roube de mim.

 

 

 

02/07/2023

Francisco

sábado, 10 de dezembro de 2022

Se eu não morrer

 Se eu não morrer

Ensinar-te-ei a escrever as primeiras palavras

As tuas primeiras equações

Gostas de equações

As mais simples

Às mais complexas

Equações trigonométricas

Equações de segundo grau

Equações diferenciais

 

Se eu não morrer

Levar-te-ei a ver o primeiro clarear da manhã

O teu primeiro luar

O primeiro pôr-do-sol

Se eu não morrer

Ler-te-ei o primeiro poema

Tantos poetas que tenho para te mostrar

Herberto

AL Berto

O'neill

Cesariny

Se eu não morrer

Ler-te-ei textos de Proust

Gogol

Ou de Luiz Pacheco

 

Se eu não morrer

Ensinar-te-ei a desenhar nos lábios da madrugada

A pintar o sono na geada

Se eu não morrer

Levar-te-ei a ver o mar

E os barcos da minha infância

E as mangueiras da minha infância

 

Se eu não morrer

Ler-te-ei os meus textos

Os meus poemas

Os meus livros

E mostrar-te-ei as minhas telas

 

Se eu não morrer

Mostrar-te-ei como se constroem pontes

Edifícios muito altos

 

Se eu não morrer

Oferecer-te-ei os teus primeiros livros

As tuas primeiras tintas

As primeiras telas

Se eu não morrer

Tirar-te-ei os teus primeiros retractos

E conhecerás as tuas primeiras cidades

Vilas

E aldeias

Se eu não morrer

Levar-te-ei ao Tejo

E a todos os rios do Planeta

Onde há um rio para olhar

 

Se eu não morrer

Ouvirás todo o tipo de música

E assistirás a todo o tipo de dança

Se eu não morrer

Levar-te-ei ao circo

Ao teatro

Cinema

 

Se eu não morrer

Farei tudo isso

Enquanto sentado numa cadeira em frente à Baía de Luanda

Espero que me levem

Que me levem para as sombreadas paisagens de prata

E me deixem brincar no telhado zincado de uma nobre cubata

 

Se eu não morrer.

 

 

 

 

 

Alijó, 10/12/2022

Francisco Luís Fontinha

quarta-feira, 14 de setembro de 2022

Complexa equação

 

(á minha mãe)

 

 

Quando regressa a tristeza,

Invento o sono sonâmbulo da madrugada,

Estendo a mão para o rio,

Ergo-me sobre a montanha,

Quando regressa a tristeza,

Desenho-te na vidraça da minha triste janela…

Como se fosses um pequenino pássaro

Em busca de liberdade,

 

Como se fosses a saudade

Da tristeza anunciada,

E caminho por esta estrada,

Só, muito só…

Como se fosses o sol

Das tardes de Verão,

Quando regressa a tristeza,

Invento lágrimas de luar,

 

Como se fosses uma árvore na alvorada

Com estrelas em silêncio

Em sombreado desenhar.

Quando regressa a tristeza,

Escrevo-te nesta pequena folha quadriculada…

Como se fosses uma complexa equação

Numa pedra sentada…

Sem perceberes que a matemática é paixão,

 

É beleza.

Quando regressa a tristeza,

Abraço-me, escondo-me neste quarto escuro,

Como se eu fosse a tua sombra…

Como se eu fosse a tua própria tristeza.

E quando regressa a tristeza,

Puxo de um cigarro…

À espera que a tristeza morra.

 

 

Alijó, 14/09/2022

Francisco Luís Fontinha

terça-feira, 30 de agosto de 2022

As sete esferas da saudade

 (de todos os meus professores, guardo saudade e amizade; mas o professor Mário Abrantes, conseguia aliar a arte ao cálculo, e as suas aulas eram um poço de cultura geral. Grande abraço, professor)

 

Tínhamos na mão

As sete esferas da saudade,

E sabíamos que dentro do cubo de vidro,

(a prisão das palavras)

Havia uma janela com fotografia para o mar.

Depois, acordávamos abraçados às sete espadas da liberdade

Que guardávamos dentro de um caderno quadriculado.

Víamos a nossa imagem no espelho da madrugada,

Quando nas frestas em gesso, um crucifixo sorria…

E dávamos conta que este sorriso pertencia

À criança mais feliz da aldeia.

As palavras chegavam-nos através da velha alvorada,

 

Enquanto sobre as mangueiras,

No distante quadrado, víamos as gaivotas em cio,

E não percebíamos o que era a paixão.

Escrevíamos.

Dançava-mos sobre os pequenos charcos

Que pela manhã acordavam e ainda transportavam no olhar

O desejo preguiçoso que só o poema consegue descrever.

Tínhamos na mão

As sete esferas da saudade,

E como crianças que éramos, das palavras

Inventávamos asas

Como inventam os pássaros antes de morrer,

 

E não sabíamos que os peixes,

Entre parêntesis sonâmbulos,

Resolviam equações complexas,

Que apenas o professor Mário Abrantes percebe,

E nós, apenas percebemos de desejo.

E nunca sabíamos se as sete esferas da saudade

Sabiam o que é o mar…

O que é o mar?

Perguntava-me um pedacinho de sombra

Quando descia o pôr-do-sol e junto a mim,

Sem o saber… um pedacinho de luz beijava-me,

E eu tinha medo do sono.

 

Acordava a manhã,

No quadro uma mistura e letras e números…

Quando perguntam o que era…

Eu…

Série de Taylor;

Como se isso interessasse para dois cubos apaixonados.

Não sei o que é a chuva!

Apenas recordo os longos lábios de cacimbo

Sobre os meus frágeis ombros,

E mesmo assim,

Um barco deitava-se no meu colo,

E das suas coxas, ouviam-se os apitos da solidão.

 

 

 

Alijó, 30/08/2022

Francisco Luís Fontinha

domingo, 21 de novembro de 2021

A equação de Deus

 

Era um sábado triste; ela tinha morrido.

Quando me perguntaram o que era a ausência e a saudade, respondi que ambas são uma equação matemática sem resolução.

Não gosto de conversar com psicólogos, respondi-lhe.

Aos poucos, a manhã levanta-se de um sono hibrido, parecendo um buraco nego esquecido no Universo. Entrei, sentei-me e, pedi um café. Enquanto saboreava o primeiro café de muitos, percebi que na TV falavam de uma imbecil qualquer, que eu desconhecia, por ignorância e, que tinha arrasado com um determinado vestido, numa determinada gala. Confesso; nada percebo de vestidos. Na percebo de galas.

Cansei-me da TV e apenas oiço rádio e tenho como companhia a TSF.

Era um sábado triste. Aos pouco percebi que todas as flores do meu jardim se preparavam para o passeio matinal de um sábado triste. Indiferente, puxei de um cigarro e sentei-me junto a elas. Comecei a desenhar no chão uns riscos estranhos, que só me lembro de os ter feito quando do falecimento do meu pai.

Esses riscos, esses desenhos, acompanham-me diariamente e, quando me perguntam o que é a ausência e a saudade, respondo que são uma equação matemática sem resolução; e claro, não gosto de conversar com psicólogos.

Despedia-se de mim o sono e todos os sonhos da minha infância. Estar vivo, era sem dúvida um presente de Deus; dizia-o a minha mãe, vezes sem conta e, acredito que ela tinha razão.

Imaginem, por hipótese, que Deus não é nada mais do que uma complexa equação matemática que vive, brinca e, dorme nas nossas mãos.

Imaginem, que essa mesma equação, um dia, vai ser descoberta e resolvida.

Parece que estou a ver essa equação, dormindo na minha secretária.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 21/11/2021

sábado, 16 de outubro de 2021

A equação do cansaço

 

Duzentos e seis ossos

Sentados na esplanada do sono,

Sob a álgebra da insónia,

Mesmo junto ao rio,

Um fio de sémen desenha a tempestade;

Rodas dentadas entrelaçam-se

E amam-se no espelho do luar.

Regressa, pela noite, o cansaço,

Traz com ele a ínfima equação do desejo

Que percorre as ruas da cidade,

Que acaricia com a sua mão

Os seios tempestuosos do silêncio.

Escreve-se o poema

Na tela argamassada do abraço,

Quando uma fina névoa de suor

Lhe percorre as coxas de aço.

O poeta solda uma pequena chapa de saliva

À boca do púbis,

E, todos os pássaros da aldeia

Dormem abraçados aos parafusos do gemido;

E o poeta cansado,

Desenha no corpo da amada sombra,

Uma língua de solidão,

Com janela para o abismo.

Transcreve para o jardim das pilas mortas

Todos os sonhos da infância,

E todos os brinquedos,

E todas as palavras,

Suicidam-se no hotel do sofrimento.

Eles morrem.

Elas, não morrem.

O luar deita-se nas coxas do poema

Como se fosse uma corda em nylon

Suspensa nos lábios da manhã;

Batem à porta e,

Trazem-lhe um punhado de fome,

E, trazem-lhe uma equação de cansaço.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 16/10/2021

quinta-feira, 30 de setembro de 2021

Equações de prazer

 

Calculo a raiz quadrada

Do desejo,

Obtenho a paixão,

Multiplico-a pela derivada

Do beijo,

Subtraio os versos da minha mão;

E, meu Deus,

Sem o saber,

Obtenho uma canção.

Entre calcular

E escrever,

Prefiro o pintar,

Prefiro acariciar a tua pele de equação tangente

À curva do teu corpo,

Sabendo que toda a gente,

Sabe desenhar;

E ela, sem o perceber,

Sente,

Sente o mar a correr.

Sente nos lábios o beijo,

Depois de verificar

Que a integral da insónia

É apenas a área sombreada do púbis,

Elevado ao quadrado,

Seno da luz amar

Que brinca dentro de um trapézio.

Escrevo no pavimento térreo

Das tuas coxas,

O eterno sonífero das manhãs ensonadas.

Passo as madrugadas

Inventando equações de prazer,

Quando desce do luar,

Sob o tecto do silêncio,

Pequenas quadriculas de saliva,

Correm para o mar.

E, enquanto oiço os teus gemidos,

Vejo um ponto esquecido no espaço tridimensional;

(seios;-beijos,coxas)

Eis as suas coordenadas.

Cerro os olhos,

Desligo os electrões que iluminam o meu cansaço…

E,

Percebo que és uma equação diferencial ordinária.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó. 30/09/2021

quinta-feira, 23 de setembro de 2021

O eterno enforcado

 

Vivia no púbis desejado

Do silêncio amanhecer,

Cresceu em mim e, partiu

Da vida que sempre quis ter.

Certo dia, recebeu um telegrama envergonhado,

Não trazia remetente,

E assim,

O eterno enforcado,

Desconhecia

Que o seu amante

Pretendia,

Um dia,

Lhe escrever.

Como alguém dizia;

- Cuidado, eterno enforcado,

Viver no púbis desejado,

Não é a mesma coisa

Que pertencer ao beijo amado.

E o pobre do eterno enforcado,

Cioso da vergonha alheia,

Sentou-se numa pedra de espuma

Pensando que ao longe, na aldeia,

Habitavam as coxas moribundas

Das janelas em cio;

Que vergonha, eterno enforcado,

Que vergonha!

Púbis e coxas há muitas na saliva do prazer,

Palavras de merda, como as minhas, acordam ao entardecer,

E sabendo que o vagabundo

Do eterno enforcado,

Viajou,

Correu mundo…

E não passa de um triste amado.

Deixou-se penhorar

Pelo prazer

Num dia de Verão,

Sentado, não sabendo ler,

Percebeu que as árvores em flor,

São coxas,

São púbis,

São canção

De embalar,

São versos de amor,

São sílabas de foder.

Dois mais dois

São quatro braços abraçados,

Duas pernas,

Alguns enforcados,

E vinte e cinco sombras a voar;

Sabes, eterno enforcado?

A vagina é uma fotografia para o mar,

É a raiz quadrada do prazer,

É cateto amanhecer,

É hipotenusa maldisposta,

E mais dois são seis,

Seis versos de embalar…

Seis versos sem resposta.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 23/09/2021

domingo, 12 de setembro de 2021

A cabeça azulada

 

Ouve-me

A cada sílaba suicidada

Na madrugada,

Senta-te

Em mim

Em cada rua ensanguentada,

Puxa pelas palavras assassinadas

Como puxas o cigarro enforcado

Na sombra das esplanadas.

Beija-me

Quando a sombra se traveste de dia

E,

Do dia travestido

Acorda o poema amarrotado

Pelo desejo

Vestido

Na mão de um drogado.

Escolhe o pecado

Vive-o

Como se ele fosse o amanhecer,

Senta-te

Escreve

E não te canses de viver.

Deus construiu o sono

Nocturno

Dos pássaros embriagados,

Não sei, nunca o saberei…

Porque Deus me obriga a habitar

Um cubículo sem janela

Para o mar

E, e sem cortinados.

Oiço-o enquanto conversa

Com a raiz quadrada do silêncio,

Multiplica-o pela derivada do desejo,

Eleva o resultado ao cubo,

E,

Nada; fico com nada.

Deus, não sabe matemática,

Não é poeta…

E,

E odeia-me desde que nasci.

Sou obrigado a mendigar

As palavras de amar,

As outras,

As palavras de desejar,

E, e depois,

Nasce o beijo,

Cresce na tua boca o poema beijar,

Como se a neblina

Descesse a encosta dos teus seios,

Logo pela manhã,

E Deus,

De cabeça azulada,

Escreve no meu quadriculado;

Amanhã,

Amanhã traz a enxada,

Cava a terra e,

E saberás que que zero é igual a um.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 12/09/2021

sexta-feira, 10 de setembro de 2021

Quando Deus construiu o número treze

Todos os dias chorávamos as lágrimas ensonadas da madrugada; talvez um dia, depois de acordar, escrevam as minhas memórias numa lápide quadriculada, feia e rabugenta. Quando olhava para as estrelas, quase ao regressar de ontem, observava o silêncio emagrecido do crepúsculo e, toneladas de pássaros voavam em direcção ao silêncio que habitava naquele casebre de aldeia, junto ao rio,

Vomitava palavras durante o desfile de barcos e carros de brincar, sabia

Depois do rio,

Nada, desde que abracei aquela velha árvore, enquanto uma enxada preguiçosa laborava nos socalcos em xisto que alguém, muito importante, desenhou na alvorada.

Sabia que havia um túnel de vento e que o meu corpo era testado aerodinamicamente, como se eu fosse um corpo suspenso no amanhecer,

Provavelmente, eles mentem-me

Não o sabia, desculpe o meu silêncio.

Deus enganou-se quando me estavam a fabricar, queixava-se ele todas as manhãs ao acordar. Perdeu a cabeça e, um certo dia, ao final da tarde, em frente a um espelho de néon, deu-se conta

Uma pedra!

E atirou-a contra o túnel de vento.

Sabia que depois do rio, Deus tinha construído um corpo emagrecido pela poesia, que os pássaros que viviam na sua mão, meia dúzia deles, eram apenas desejos desejados dos beijos ejaculados na boca do prazer,

Gemia,

Gritava-lhe

Olha os pássaros.

E matou todos os pássaros.

Detesto-os, segredava-lhe ele quando abria a janela e, num sufoco de espuma, alguém lhe trazia o mar e, do mar, aparecia a mulher mais bela da montanha do desejo,

Desejava-a,

Até que

Todos morreram de fome. Naquela tarde de Outono, quando da vindima, percebeu que apenas sabia porque Deus o tinha construído; apenas para sofrer, pensava ela, e de tanto sofrer, partiu como partem as gaivotas antes da tempestade.

Tinha a esperança de encontrar um número que fosse primo do vizinho e filho do empregado da esplanada, em frente à sua sombra.

Na algibeira transportava o número treze, só, sem mais ninguém e, um certo dia

Evaporou-se na neblina.

 

Toque as cornetas

Que Deus vai construir

O número treze.

 

Deus, que também se engana

Construiu o número trinta e um,

Deitou-se ao terceiro dia

E, morreu incinerado nas mãos do vizinho

Do trigésimo quinto andar

Antes do sótão.

 

Porque me dizes que amanhã é sábado?

Porque amanhã é sábado.

Porque amanhã nascerá o número quatorze

Cesariana

Coisa simples

Coisa de nada.

 

Coisa de loucos,

Dirás tu.

 

Toque as cornetas

Que Deus vais construir

O número treze.

 

E, quando demos conta

Deus em vez de fabricar o número treze,

Não

Enganou-se

E, apareceu-nos a raiz quadrada

De seiscentos e vinte e cinco; merda.

 

Onde está o treze, pá?

 

Tanto faz, responde-nos Deus.

Tanto faz…

 

E, olha!

 

Olha?

Preciso do treze,

Vai à merda, diz-me Deus.

Vai à merda.

(e antes de se retirar, Deus diz-me:

Calcula a raiz quadrada de seiscentos e vinte cinco

Subtrai-lhe doze e ficas com o treze,

Burro de merda).

 

Ainda bem que Deus sabe matemática.

Ainda bem; um dia.

 

Toque as cornetas

Que Deus vai construir

O número treze.

 

 

Ao cair a tarde, ela, depois da visita ao jardim, quando entra em casa, depois de subir treze degraus, percebeu que ele transportava na algibeira a medalha com o número treze e, acreditem, nem eu nem a minha mãe

Percebemos porque trazia ele a medalha com o número treze, mas

Acredito que foi Deus que lha deu, um qualquer dia, em Luanda.

As certezas são poucas, o corpo embebido em sombras de granito e, na lápide

Eterna saudade de seu filho.

Uma carta de despedida, nem isso teve coragem de deixar em cima da mesa-de-cabeceira.

Fez amor com o desejo, puxa de um cigarro, vai à janela e,

Foda-se.

Esqueci-me da medalha com o número treze dentro do livro de AL Berto.

Desenhava o poema, abria as pernas e,

Voava, voava, voava até que morreu de sono.

Tristeza, esta, queixava-se quando acabava de fazer amor.

Sempre o desejo. Maldito desejo este, transportar uma triste medalha com o número treze.

Até breve, meu filho.

Até, meu pai. Até.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 10/09/2021