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domingo, 22 de outubro de 2023

Mar sonâmbulo

 Sonâmbulo mar

Quando o teu feitiço me abraça

Quando os teus braços me beijam.

Sonâmbulo mar

Nos lábios de uma barcaça

Das mãos que aleijam

Os teus lábios de amar.

 

Sonâmbulo mar

Quando o vento

Me traz o teu sorriso

Quando me sento na tua boca

E perco o juízo

E você fica louca

E você se esconde no meu pensamento.

 

 

22/10/2023

sábado, 8 de abril de 2023

Mãos da poesia

 Poucos recordam o poeta

Após a sua morte.

Poucos saberão que o poeta morreu

No dia em que ele não foi comprar cigarros

Ou na noite que ele não apareceu

Perante Deus

Para beber o seu último shot de uísque

E fumar o seu último cigarro.

 

Muitos poucos não saberão

Que o poeta está morto

Nasceu morto

E morto irá morrer

Nas mãos da poesia

Poesia morta

Abstracta

De luzes endiabradas nos lábios da madrugada

E se o poeta sofre

Não deve sofrer

Porque um poeta morto

Morto não sofre

E morto irá morrer.

 

Não gosto de mortos.

Dos que partiram

E daqueles que irão partir

E daqueles que nunca chegaram a partir

Antes de fugir.

O poeta morre no dia em que deixar de ir comprar cigarros

E na noite

Perante Deus

Não beber o seu último shot de desejo.

 

O poeta não sofre.

Os mortos não sofrem.

Quem sofre são as palavras

São as flores

São as nuvens e os pássaros

E o mar

E os barcos que dormem no mar;

Todos eles sofrem…

O poeta

O poeta não sabe sofrer.

 

O poeta apenas sabe escrever

O poeta morre enquanto escreve

Enquanto desenha na alvorada

Palavras

Palavras de morrer

Que o poeta morto

Não se cansa de escrever

Não se cansa de sofrer…

Mas o poeta não sofre

Porque o poeta está morto

E os mortos

Todos os mortos

Não sofrem

Não sabem sofrer.

 

O poeta se cansa

Das palavras

Dos dias entre palavras

Dos poemas em banho-maria

Do dia

Toda a poesia

A que morreu

E a que vai morrer

Nas mãos de um homem

De um louco homem

De um poeta louco

Poeta homem

Que sofre e está morto

Dentro de um cubo de vidro

Quando nasce o dia

Quando morre o dia

E o poeta

Louco poeta

Da louca poesia…

Nada.

Ninguém perceberá que o poeta morreu às mãos da poesia.

 

 

Francisco

08/04/2023

sábado, 28 de janeiro de 2023

A dança dos loucos

 Dançam os loucos nas tuas mãos,

Sonham os loucos,

Em teu doce olhar,

 

Cantam,

Os loucos,

Aqueles que dançam,

Aqueles que choram,

Aqueles que amam o mar…

 

Pintam os loucos os teus lábios

De pinceladas nuvens de alegria,

Entre palavras,

Entre a poesia,

 

Em cada noite,

Em cada dia.

 

 

 

 

Alijó, 28/01/2023

Francisco Luís Fontinha

sábado, 10 de dezembro de 2022

A loucura de um doido pequeno cubo de vidro

 Todas as minhas noites

As pequenas noites que habitam em mim

São também elas

Um pequeno cubo de vidro

Sem janelas,

 

A noite é só minha

Saio à rua

E roubo todas as estrelas

Depois

Guardo-as,

 

E enquanto te escrevo

Semeio-as nos teus doces lábios de mel

Um dia

Um dia a noite será uma planície de vento

Em direcção ao mar,

 

E uma criança brincará na areia

Livre como os pássaros da minha aldeia

Mas enquanto houver noite

Este cubo de vidro só meu

Viverá na tua loucura,

 

Também eu

Louco

Puxando uma corda invisível

Desenhando beijos nas mãos da geada

E imaginando as tuas mãos nas minhas mãos – enquanto houver noite e geada.

 

 

 

 

 

Alijó, 10/12/2022

Francisco Luís Fontinha

sábado, 26 de novembro de 2022

Estátua de sono

 Escondo-me nos ossos frios do meu corpo

Que vivem entre silêncios e poeira.

As janelas que transporto desde a infância

Fecham-se na minha mão.

 

Escondo-me nestes pobres ossos

Que a noite bebe

Que eu bebo

Até que a morte nos separe.

 

Revolta-se a paixão dos meus pássaros em papel

Revoltam-se os pássaros tristes que a manhã esconde

Dentro da algibeira onde se esconde a insónia

Gritam

E revoltam-se

Erguem-se até às nuvens

Que transportam as pequenas gotículas que poisam na tua pele

A insónia traz as palavras encurraladas pela tempestade

E enquanto me escondo nos ossos frios do meu corpo

Invento as pedras onde me sento.

 

Neste rio morro

Neste rio lavo os meus ossos

E a minha vida é um aborto na penumbra da manhã.

Visto este casaco de chapa zincada

Que o secreto silêncio faz de mim um coitadinho

Um pobrezinho camuflado nas estrelas nocturnos do desejo.

 

Escondo-me das estrelas

Escondo-me da lua

Escondo-me da poesia

Que semeio ao meio-dia.

 

E sento-me nesta carícia desejada

Uma fome em carícia

Um pequeno cadáver deitado na lama.

 

Um dia

O amor vai ouvir as minhas palavras

Vai olhar os meus desenhos

E vai pensar o quão louco fui

Porque amei

Porque chorei

Porque morri

E me escondo nos ossos frios do meu corpo.

 

Tão triste

Quando me olho no espelho

E vejo no meu peito

A imagem do meu pai

E vejo no meu peito

O silêncio da minha mãe.

 

Tão tristes

As palavras de ninguém que escrevo na minha mão

Torno-me invisível

Transparente

E desapareço debaixo do luar.

 

Serei um vagabundo

Porque detesto ver televisão?

Serei um vagabundo

Porque detesto futebol?

 

Serei um vagabundo

Por gostar de ouvir poesia

Enquanto a noite se suicida dentro de mim?

 

E os meus ossos?

E enquanto bebo uísque

E fumo merdas

Escondo-me no frio e triste silêncio do meu corpo.

 

Converso com os peixes

Que desenhei em criança.

 

No meu casaco de chapa zincada

Telhado da sanzala onde brinco

As portas se fecham na penumbra dos cinzentos olhos

E este meu cadáver se despede do teu poema

Que dorme nos teus lábios.

 

Olho todos estes quadros

Olho-os e penso como destruí-los

Quero ser o assassino dos meus quadros

Quero ser o assassino de todos os meus papeis

De todas as minhas palavras.

 

Escondo-me nos ossos frios do meu corpo

Que vivem entre silêncios e poeira.

 

Levem-me.

 

Escondo-me nos ossos

Frios

Do meu corpo.

 

Escondo-me na sombra das árvores do meu jardim

Deixei de comer

Detesto comer

Prefiro ouvir poesia

Fumar

E beber.

 

Detesto comer.

 

Neste momento

Oiço o vento

Apenas me apetece comer poesia

Beber os uivos gritos do teu clitóris.

 

Os meus versos são uma merda

Os meus quadros

Merda são

No fundo

Um pedaço de esperma de merda do meu pai

Fecundou um óvulo de merda da minha mãe;

Assim, nasci eu.

 

O eterno artista de merda

Da merda

E da fome.

 

Roubaram-me a noite.

 

(Escondo-me nos ossos frios do meu corpo

Que vivem entre silêncios e poeira.

As janelas que transporto desde a infância

Fecham-se na minha mão)

 

Roubaram-me tudo.

 

Até as lágrimas me roubaram.

 

Se algum dia me visitarem

Tragam-me os retractos que deixei na minha secretária

Veleiro dos meus sonhos

Nos meus sonhos

Os teus sonhos.

 

Pequena manhã do meu inferno

Floresta que assombra o meu passado

E enquanto Deus me abandona

Uma flor de esperança sobe a calçada

Liberta-me

E oferece-me as espingardas que disparam beijos e sonhos.

 

Para que eu quero beijos e sonhos…

 

Sento-me e pego nestas brasas de silêncio

Ai se o meu filho estivesse junto a mim…

 

Enquanto morro.

 

Ele morto.

 

Poemas sem destino

Colmeias de abelhas dentro do meu quarto

Invento o inferno

Do inferno de escrever

No inferno que é viver

Ser louco

Entre loucos

Naquele esconderijo.

 

Um dia voarei sobre o teu corpo

Que se aproxima dos ventos imaginários da tua boca

Serei louco

Beijar-te

E cruzar os braços enquanto me morro em ti.

 

Que trazes na mão, pequena?

 

Trazes lágrimas

Ou sonhos?

 

E tudo arde

Enquanto toco com a minha mão

O Céu…

 

Este inferno

Destes meus pobres ossos

Enquanto me escondo

No meu corpo doente.

 

Bebo e fumo merdas

E penso em ti

Enquanto os meus ossos

São poemas

São palavras envenenadas das tristes noites de insónia.

 

E assim dorme a noite no meu peito.

 

Um milímetro quadrado da tua pele

Nos meus lábios…

 

Em mim

Uma pequena estátua de sono que te deseja.

 

 

 

 

 

Alijó, 26/11/2022

Francisco Luís Fontinha

quinta-feira, 24 de novembro de 2022

As loucas palavras

 A loucura

O louco que sou

Nesta loucura

 

As palavras

Loucas

As loucas palavras

Do velho louco

Quando o rio louco

É o único louco da noite

 

Uma árvore louca

Onde poisam pássaros loucos

E eu

O louco

Que escreve

Que fuma e bebe

No louco cansaço da noite

Abraça a louca árvore

E ouve as loucas palavras

Palavras loucas

Deste vosso louco

 

As palavras

As loucas madrugadas

A fome

E o louco pão

Na mão

Desta louca mão

Que pinta

O louco sorriso deste louco coração.

 

 

 

 

 

Alijó, 24/11/2022

(Francisco)

sábado, 19 de dezembro de 2020

O circo da loucura

 

Um louco será sempre um louco.

Cerram-se todas as janelas da poesia,

Morrem todos os pássaros da minha aldeia,

De tanto, o pouco,

Das flores donzelas que eu queria…

Antes do horário da ceia.

Caem sobre ti as loucas fotografias,

Escrevem-se as palavras sobre a ria,

Depois, vem a fantasia,

E, o amor e, a alegria.

Escrevo-te, meu amor,

Todas as tardes em beleza,

Sinto, sento-me, nas heteras mãos de Deus,

Sabes? O palhaço está doente,

A flor,

Tua doce boca, só, na clareira,

E, todas as sanzalas, e, todos os musseques,

Doentes

Como Deus nos apetece.

Esqueço,

Durmo nesta cama azada,

Entre um cobertor de pano

E, uma nova namorada.

Entre palavras parvas

Que assombram as minhas mãos;

Sabes, meu amor!

A vizinha está encharcada de veneno,

Trouxe a morte,

A vaidade…

E, escreveu seu nome,

Nas amplas matrizes de poder,

Olho-a,

Vejo-a,

E, loucamente te beijo,

E, loucamente,

Eu, este louco que te quer.

Um louco será sempre um louco,

No destino de viver.

 

 

Francisco Luís Fontinha, Alijó/19-12-2020

sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

A paixão dos mortos


Jazem na minha mão as palavras da saudade.
O mar alicerça-se no quadriculado caderno da madrugada,
Sílabas loucas,
Corações abandonados, numa esplanada de areia,
Esqueletos vadios,
Cansados de viver,
A luz traz as amoreiras em flor,
Mártir silêncio dos poemas adormecidos,
A paixão dos mortos,
Quando um barco se perde no Oceano,
O marinheiro afoga-se no poema,
Lê em voz alta, para todos ouvirem, os mandamentos das gaivotas,
E, sem regressar, procura o sexo na escuridão.
Salta da maré um pequeno veleiro adormecido,
De lágrimas nos olhos, grita pelas almas que partiram,
Ninguém o ouve; a luz.
Todas as manhãs, antes de acordar, o marinheiro chora pelos que partiram,
Ao longe, uma bandeira em demanda,
Sofre, grita,
Mas… não adianta.
Pelos vistos, os mortos não regressam nunca ao local de partida.
O corpo escurece,
Derrete nas pálidas madrugadas, quando do silêncio, uma criança brinca no convés do navio,
Todos os barcos, loucos,
Internados em Psiquiatria,
Enfermaria azul, cama vinte e cinco,
Drageias para todos os navios,
Não dormem,
Mas… sofrem.
Sofrem de quê?
Do silêncio,
Da solidão que provoca o silêncio.
O amor nasce entre os cortinados do camarote,
Na enfermaria, um dos barcos internado, grita pelo enfermeiro;
SOCORRO!
E, ninguém. Ninguém o ouve.
Apenas o comandante está autorizado nas visitas, poucos minutos, servem para acariciar-lhe as âncoras da tristeza,
QUERO SAIR DAQUI.
Todos o queremos.
Uns, mais, outros, menos.
Mas os barcos são teimosos, e, firmemente, alegremente, fogem…
E, só a paixão dos mortos consegue sobreviver ao destino.
Sofre. Grita.
Zurra nas amêndoas em flor, descendo socalcos,
Subindo rochedos,
E outros demais silêncios.
A loucura pertence aos pássaros,
E, aos barcos.
Torna-se na viagem mais inclinada do Universo,
Quando todos sabemos, que o mar, os pássaros e, os barcos,
Morrem.
Morrem nas clandestinas sanzalas do silêncio.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
24/01/2020

sexta-feira, 9 de agosto de 2019

Noite numa biblioteca suspensa na alvorada


Sabia que o teu corpo era porcelana madrugada.

Manuseio-o como se fosse uma sílaba engasgada no poema,

Com jeitinho,

Pinto-o, beijo-o,

Como se fosse uma pétala no jardim do silêncio;

Dois olhares cruzam-se na escuridão do desejo,

Um cigarro arde,

E recorda-se do beijo.

Oiço a tua voz silenciada na alvenaria,

Oiço os gemidos do luar suspensos nos cortinados da paixão,

Sou tão feliz, meu amor,

Tão feliz.

Não finjo,

Sinto-o dentro do peito,

Esta ressaca que me aprisiona aos teus braços,

Não finjo, meu amor,

Não finjo que somos donos do mar,

Não finjo que somos os únicos sobreviventes das tempestades da loucura…

E, no entanto,

Lá longe,

Um barco carregado de livros, aproxima-se,

E poiso nas tuas coxas.

São poemas, meu amor,

Poemas de amor.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

09/08/2019