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sábado, 8 de julho de 2023

Nos braços da ausência, voava

 

Voava dentro daquele espaço curvilíneo,

Nas paredes,

Construídas de vidro invisível,

Escondiam-se janelas,

Voava dentro daquele espaço,

De mão atadas,

De pernas atadas…

E sentia-me…

E sentia-me tão feliz,

 

Às vezes,

Às vezes vendia o cansaço

A troco de nada,

E voava,

Voava,

E só regressava…

Pela madrugada,

 

Voava dentro daquele espaço

Nauseabundo,

Infestado de pulgas,

Percevejos

Abelhas…

E agulhas mortas,

 

E voava…

Dançando sobre o vento,

Despia-me,

Vestia-me…

E quando acordava…

Agradecia a Deus…

Por estar vivo,

 

E eu voava,

Voava…

Nos braços da ausência.

 

 

 

08/07/2023

Francisco

sábado, 16 de abril de 2022

Felicidade

 

Quando percebes que em cada pedacinho de silêncio

Habita uma imagem de saudade.

Que em cada movimento do bater de asas de um pássaro

Existe um rio em pequenos círculos

Às voltas de uma montanha.

Quando percebes que o som das sombras e cheiros

São na verdade o prazer de estar vivo.

E quando o Vale do tua e seu rio

Se alicerçam ao teu peito,

Isso é, felicidade.

Isso é poesia.

Isso é… tudo.

 

 

Alijó, 16/04/2022

Francisco Luís Fontinha

sexta-feira, 8 de abril de 2016

a partida


ela partiu numa manhã de neblina

levava na bagagem a solidão dos dias e das noites acorrentada à minha mão

olhou-me pela última vez

(alguma vez te disseram que tens o coiso grande?)

Disse-me adeus

E quando alguém nos diz adeus é para sempre

Aos poucos desapareceu na neblina

Sentei-me num banco de pedra

Cruzei os braços

Puxei de um cigarro na esperança que alguém me oferecesse lume…

Pequei num livro que ela me tinha oferecido no dos outros encontros furtivos

Sempre em esconderijos

E vi o mar deitado a meus pés

Que mais eu poderia querer?

neblina

sentado

um livro

e uma ausência programada

a falsa partida

o dia mais feliz da minha vida

saltava

dançava de alegria

esta finalmente livre…

e foi a manhã mais linda de Lisboa

num qualquer Novembro cinzento e escuro

as gaivotas poisaram sobre mim

transeuntes sorriam-me e eu sorria-lhes

a felicidade era tanta que tinha medo de ser mentira

felizmente

não o era

tinha-me libertado da menina mimada

 

 

Francisco Luís Fontinha

sexta-feira, 8 de Abril de 2016

sábado, 15 de setembro de 2012

amor cinzento

este amor cinzento
afogado na garganta do deserto
este amor
doente
sem vento
que corre magoado dentro dos cortinados da noite
insensato homem de xisto com um coração de vulcão
este amor fino e doente e cinzento
como uma tempestade de granizo
e um ferro de insónia na mão
à procura de um olhar aberto
no ventre doente dos cortinados da noite

há ovos sem juízo
recheados com chocolate e pedaços de mel
este amor
ausente
lentamente
mergulhado em dor
e finíssimos beijos de papel
em suor amor flor...

estes lábios filhos do amor cinzento
este mar ausente
no lamento
das noites mergulhadas no sono do desejo
fio de beijo
na janela sem vidros para a felicidade

(levantava-me silenciosamente
e via os barcos de algibeira em algibeira
de boca em boca
de mesa em mesa
as garrafas da vodka suspensas no tecto que o púbis da dor engolia
os ciúmes
os fósforos silenciosamente
comprometidos com os alpendres do amor cinzento)

e eu era feliz...

hoje
meia dúzia de palavras burburinham nos restos da maré
e nos meus olhos os óculos escuros da morte
perdidos na planície do amor cinzento

e eu era feliz.

(poema não revisto)

quinta-feira, 5 de julho de 2012

Podia ter sido uma rua da cidade de Luanda

Podia ser feliz
ou um barco
sem vela
podia ter sido uma rua da cidade de Luanda
entupida no lixo deambulante sobre a noite
podia ter sido o mar
o amor
o eterno veneno
a dor
podia
podia ter sido uma abelha misturada com a chuva
ou a paixão do silêncio

ai se eu fosse as amêndoas da tarde
em forma de poema
sobre a morte acidental

podia ser feliz
ou um livro de poesia
adormecido na prateleira da insónia
(podia ter emprego e dinheiro e assim já me conheciam
e assim
e assim já me cumprimentavam...)
podia ter sido o capim
e as mangueiras
e os triciclos de madeira

mas quis deus
que eu fosse um caixote
com paredes de vidro made in China
com coração de árvore
quis ele
quis deus

(podia ter emprego e dinheiro e assim já me conheciam
e assim
e assim já me cumprimentavam...)

que eu falasse como os pássaros
e gritasse como as nuvens
e desenhasse nas paredes da infância
a morte simplesmente bela
toda nua
à janela
quis ele
quis ele que eu fosse um poema sem palavras.

sábado, 28 de abril de 2012

Sem nada

Nas paredes curvilíneas da memória
poiso os meus braços de prata
acaricio pacificamente
os meus lábios de incenso
e as pinceladas do meu rosto
vagueiam livremente no vidro transparente
de linho amanhecer
antes do pequeno-almoço

oiço a tua voz misturada
nas acácias do fim de tarde
oiço-te enquanto me olho nas paredes curvilíneas da memória
sem palavras sem estória

sem nada

poiso os meus braços de prata
acaricio pacificamente
os meus lábios de incenso
e nas pinceladas do meu rosto
acorda a madrugada
cresce uma rua sem saída
suspensa numa cidade imaginária
com muitas portas e janelas
e calçadas
e velhos que se esqueceram de acordar
e fingem orgasmos pulmonares
e constroem a felicidade
num vão de escada
sem nada
com barcos mergulhados
em oceanos testiculares

sem nada

de mão dada
às paredes curvilíneas da memória
os meus braços de prata
pacificamente acariciados
felizes
contentes
tal como os velhinhos
num vão de escada

sem nada...