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quinta-feira, 5 de abril de 2012

Do not cover


E eu cobri-o com o linho lençol das páginas de um livro, retirei todas as palavras e semeei-as nas entranhas da terra, chovia agrestemente nas mãos esbranquiçadas da fome que alimentavam a madrugada, e eu cobri-o
- De que me servem os livros, de que me serve o dia e a noite e os círculos suspensos no infinito da geometria desvairada dos olhos, de que me serve a janela virada para o mar se eu, se eu não consigo ultrapassar a janela e abraçar o mar,
E eu cobri-o com o linho lençol das páginas de um livro, ele desarrumado na tempestade longínqua da cidade, perdido dentro da montanha antes de nascer o sol, De que me servem os livros, o dia e a noite, a trigonometria em paixões avassaladoras nas flores da primavera e uma mulher tropeça numa pétala, Tão lindas as rosas, e os crisântemos tão lindos nos cravos de abril e de todos os meses do ano,
- Vendem-se corpos em fatias de pão, ouvem-se nas claraboias do silêncio os gemidos de um menino deixado estacionado num vão de escada, ele chora e procura o cão de infância,
Qual infância Pergunto-lhe antes de lhe poisar a mão sobre o linho lençol das páginas de um livro, A infância que se transformou em noite?, e tudo, Tudo estórias que ouvi da boca de um louco,
Do not cover, sabendo eu que a janela que me separa do dia nunca mais se abrirá, como as rosas depois de morrerem, ou, ou como a lua nas mãos da Cinderela, Qual infância questionava-se a boca do louco entre as grades imaginárias da enfermaria, e hoje tenho um medicamento novo e adormeço suavemente como as garças pintadas na paisagem, as grades de aço travestem os meus olhos verdes de papel de embrulho, um cachucho saltita no avental do rapazinho sem sonhos, e sei que na algibeira esconde religiosamente um cordel e um pião de madeira, e sobre o soalho transporta os pesadíssimos socos,
- É fodido ser pobre e não ter sonhos…,
Mais fodio é morrer antes de nascer Da boca do louco as palavras que semeei nas entranhas da terra, e hoje crescem poemas mortos, esqueletos sem sílabas, ruas sem saída, miséria, fome, alegria…
Somos todos felizes neste país!!!!!
- É fodido ser pobre e não ter sonhos…,
Quando o linho lençol de um livro desaparece na neblina da insónia, quando os olhos do rapazinho e os lábios do menino são sequestrados pela maré, quando todo o mar finge não ser mar, e a terra engole todas as palavras e todos os sonhos…
(que louco vai cobrir um radiador a óleo?)

(texto de ficção não revisto)