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quinta-feira, 2 de novembro de 2023

Jardim sem estátuas

 Chego a casa

A casa está fria

A casa não tem gente

Chego a casa e apenas fotografias

Pequenos insectos

Velharias e livros,

Nada mais dentro desta casa.

 

Chego a casa

A casa está fria

A casa não tem gente

Chego a casa e apenas sombras

Memórias de outros tempos

Esqueletos invisíveis

Ossos,

Nada mais dentro desta casa.

 

Chego a casa

A casa está fria

A casa não tem gente

Como chocolate

E conto o número de pulsações por minuto

Dos ramos desta árvore a bater na janela

Supostamente superior às cento e vinte pulsações por minuto do meu coração

Esquecido neste jardim sem estátuas,

Nada mais dentro desta casa.

 

 

02/11/2023

segunda-feira, 2 de janeiro de 2023

A vida

 Todas as paredes

As paredes de uma sala

São tristes

São feias

São sós,

 

Juntamente com as paredes de uma sala

Habitam outras paredes

Com cor

Sem cor

Mas todas elas

Tal como as paredes de uma sala

São tristes

São feias

E são sós,

 

Depois suspendem na parede de uma sala

Que é triste

Parede de uma sala que está só

E é extremamente feia

Um quadro

Um quadro sem nome

Um pedaço de tela

Aprisionado entre quatro ripas em madeira

Um caixão?

Não

Um caixilho

O caixão serve para transportar corpos

Ossos

Chagas invisíveis

O caixilho aprisiona um pedaço de tela

Um pedaço de tela sem nome

Feio

Muito feio

E triste

Muito triste,

 

E de que serve dar um nome a um pedaço de tela

Aprisionado dentro de quatro ripas?

Caixilho?

Sim

O caixilho

E qualquer que seja o nome do quadro

Que está suspenso na parede da sala

Parede da sala que é feia

Que é fria

E triste

Será sempre um pedaço de tela

Dentro de quatro ripas

Também tristes

Também sós,

 

A casa que tem paredes frias

E tristes

E sós

Que nas paredes da sala

Frias

E tristes

E sós

Têm no peito um pedaço de tela

Também ela triste

Também ela só

Também ela fria

E uma janela

E triste

E fria,

 

Em frente à janela

Uma árvore

Triste

Uma árvore fria

Durante o dia

Poisam sobre a árvore

Pássaros tristes

Frios

E sós

Durante a noite

Sem que ninguém consiga ver

Poisa a lua

E as estrelas,

 

A casa triste

Feia

E só

Tem lágrimas

Tristes

Feias

E sós

E tal como o pedaço de tela

Aprisionado dentro de quatro ripas

Não tem nome

Nem fome

Mas tem lágrimas

Tem um pedaço de tela

Tela muito fria

Muito triste

E só,

 

E quando a luz se extingue na mão das estrelas

Este pedaço de tela

Aprisionado dentro de quatro ripas

Tristes

E sós

Também se extingue

E este pedaço de tela

Não fala

Não come

Não bebe

Ou fuma

E este pedaço de tela é apenas um pedaço de tela

Sem nome

Triste

Muito triste

E muito só,

 

E este caixão

(perdão, este caixilho)

É o único abraço que este pedaço de tela

Muito só

Muito fria

E triste

Tem,

 

Quem mias de que um triste e só caixilho

Para abraçar um pedaço de tela

Tela muito fria

Tela muito feia

Tela muto triste…

 

E tal como o caixilho que abraça uma tela

Uma tela fria

E triste

Uma tela só

Apenas uma mãe

Abraça o seu filho

Seu filho muito triste

Seu filho só

Muito só

E às vezes

Uma mãe

Pega em todos os pedacinhos do seu filho

Aqueles pedacinhos que jazem no pavimento da loucura

Coloca-os sobre a mesinha-de-cabeceira

E aos poucos

Aos poucos devolve-o à vida,

 

Não sou um pedacinho de tela

Deram-me um nome

Não tenho um caixilho que me abrace

Mas tive uma mãe

Mãe que pegou em todos os meus pedacinhos

Os colocou sobre a mesinha-de-cabeceira

E devolveu-me à vida

Tal como o fez pela primeira vez.

 

 

 

 

 

Alijó, 02/01/2023

Francisco Luís Fontinha

domingo, 27 de novembro de 2022

Quadro sem nome

 Uma casa

Sem casa

A minha mão na tua mão

Um quadro sem nome

Que arde nesta fogueira em brasa,

 

Um nome

Sem corpo

O meu corpo

Entre as cerejas do teu olhar

Uma casa que morre,

 

Na casa sem morar

Uma casa

Sem casa

Um poema sem palavras

Nas palavras de amar,

 

Uma casa

Sem casa

Doente

Envenenada

Com tudo e com nada,

 

Uma casa contente

Uma casa

Sem casa

Uma casa revoltada

Nesta casa sem gente.

 

 

 

 

Alijó, 27/11/2022

Francisco Luís Fontinha

terça-feira, 25 de outubro de 2022

Casa

 

Esta casa

Nesta casa infestada

De livros

De nada

À casa

Esta casa vadia

Que chora

Que sorria

Desta casa

Sem casa

Chove

Quando o sol dorme

Dos livros

Infestada

A minha casa

E parece uma lápide de luz

Ai esta casa

Onde poisam os meus ossos

Seus grandes ossos

Que nesta casa viveram e morreram

 

 

25/10/2022

Francisco Luís Fontinha

quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

O beijo é uma fotografia

 

Uma casa cansada despede-se da saudade.

Todas as portas e,

Todas as janelas,

Dormem docemente na umbria da tarde.

O beijo louco das árvores,

Quando o louco amor,

Desce a calçada,

Quando a boca, da casa, beija a tarde em despedida.

E essa mesma casa,

Cansada,

Dorme docemente na tua mão.

Sabes, amor? Todas as flores do teu jardim e,

Todas as árvores do teu jardim,

Alimentam-me quando o sono desaparece na alvorada,

Uma pomba, voa entre pedaços de papel,

Até à claridade do dia,

Uma casa,

O amor da casa pelo pobre jardineiro,

Uma carta escrita entre parênteses e,

Fica sempre aquém um simples ponto final.

O rio foge das suas margens,

Os peixes agradecem todos os rochedos que encontram,

Todos os dias,

Ao meio-dia.

O café encerrado,

A esplanada entre pontas de cigarro e,

Lâmpadas de néon…

Tristes, como a aldeia dos chocolates.

Sabes, amor?

O beijo é uma fotografia,

Como a casa,

Cansada da saudade.

 

 

Francisco Luís Fontinha, Alijó 31/12/2020

sábado, 21 de março de 2020

A laranja assassina


Conheci a puta de uma laranja assassina.
O gesto de coçar os testículos,
Quando o Rossio entre orgasmos e gemidos,
Traz o cansaço,
Os berros,
E, os cubículos.
O restaurante, encerrado.
As putas em delírio,
Sem clientes,
Passam fome,
Deveras,
Quando a aldeia acorda.
E eu, aqui sentado,
Fumando cigarros de haxixe, toco clarinete,
Bombo,
Punhetas a grilos,
E, afins.
Se te podes revoltar, revolta-te,
Come tremoços,
Mija contra os postes de electricidade,
Vem-te,
Vai-te,
E fode-te,
Ao pequeno almoço.
As laranjas assassinas,
Na marmita do tesão,
O foda-se,
Então?
Ai Senhor,
As putas em delírio,
O cansaço delas,
Nas mãos calejadas do centro de massa…
A equação do caralho,
Lacrimejado,
Entre paredes,
E dias de desassossego.
Por isso não esqueço,
A maldade,
O sumo da laranja,
Quando assassina o sexo.
Morre o tesão;
Fodam, fodam, que agora é de graça,
E não digam a ninguém,
Contra os rochedos,
Marchar, marchar…
E, depois,
Não se esqueçam de encerrar a janela,
A fechadura,
Porque às vezes, parece,
Mas não o é,
Sempre, às escuras.
Faltou a luz,
Esqueci-me de pagar a electricidade,
Foda-se,
Vou mijar contra o poste,
E se não gostarem,
Acabou.
Fim.
Fodi-me.
Fui assassinado por uma laranja.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
21/03/2020

quinta-feira, 17 de outubro de 2019

A casa


Sabes, meu amor,

Esta casa tornou-se gélida, inabitável, e deixei de ouvir vozes.

Esta casa parece o abismo,

Antes de nascer o sol.

Ontem habita nesta casa o Sol,

Hoje,

Habitam sombras, pedras e rosas envenenadas.

Esta casa, meu amor,

Mais parece um esqueleto sentado na penumbra…

Não abro as janelas.

Não.

Não quero ver a luz.

Sabes, meu amor,

Esta casa parece o inferno.

E eu que não sei o que é o inferno;

Se existe, não existe…

Ou é apenas um mito.

Esta casa perdeu a alegria.

Esta casa não é uma casa normal.

(também não sei o significado de casa normal)

Nesta casa deixe propositadamente morrer as plantas.

Estão de castigo.

Como os pássaros do meu jardim…

Nem esses me vêm visitar.

Voaram para outro jardim.

Assim,

Meu amor,

Esta casa parece um auspício em cima de uma montanha de lágrimas.

 

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

17/10/2019

domingo, 29 de julho de 2018

Nesta casa


Nesta casa não conheço a tua pessoa,

Nesta casa despede-se a paixão das estrelas sem nome…

Como um relógio abandonado,

 

Nesta casa deixou de haver alegria,

E todas as janelas se transformaram em grandes,

Revoltadas,

Cinzentas,

 

Nesta casa habita a saudade,

Da tua pessoa,

 

Em cada final de tarde,

 

Nesta casa não conheço a tua pessoa,

Apenas sombras de papel suspensas nas paredes,

E um sorriso submerso na minha infância…

 

Em cada dia,

 

Em cada tristeza.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 29/07/18

quarta-feira, 28 de junho de 2017

A casa


A casa desocupada e infestada de bichos marinhos,

Os ninhos do meu quintal estão recheados de pergaminhos,

Palavras soltas,

Palavras mortas,

Vivas palavras rompendo a madrugada,

Sem nada,

O infeliz meu corpo deitado na casa desocupada,

Escrevo no chão,

Minha mão estremece a cada sílaba adormecida,

Vomito poesia sobre a janela envidraçada,

E imagino a louca Calçada…

Ajuda, não ajuda,

O eléctrico dorme na minha cama esganiçada,

O comboio para Cais do Sodré engasga-se em Alcântara Mar,

E o sonâmbulo adormecido descarrilha ao passar pela minha sombra,

Uma tragédia, meu amor,

A casa,

Desocupada e infestada,

De livros,

Quadros,

Esqueletos…

E restos de ossos,

Poeira,

Alvorada fora até ao nascer do Sol,

Bebedeira, o esqueleto cambaleia…

Saltita,

E volta a adormecer no meu peito,

Nada me resta,

Nada tenho para te oferecer, meu amor,

A não ser, a não ser… algumas velhas flores,

Pedres,

Envelhecidas como nós.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 28 de Junho de 2017

sexta-feira, 20 de março de 2015

O sono


Esta casa em alvorada sinfonia
o som das palavras contra os cubos de xisto
que habitam as montanhas da insónia
o sono
em suspenso
GREVE
hoje
em alvorada sinfonia
esta casa
velha
desabitada
triste e cansada...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 20 de Março de 2015

sábado, 27 de dezembro de 2014

Esta terra... que amo


Nunca percebi porque choravam os pássaros da minha terra,
nunca entendi porque em determinados momentos...
se abraçavam as árvores da minha terra,

desenhava o sol na velha parede da casa que me recebeu,
havia frestas de engano e vidros partidos,
lá fora o frio parecia um rochedo intransponível,
tão alto como a montanha da saudade,
nunca percebi porque era tão fria a minha terra,
esta...
que amo,
mas é tão fria... meu amor...!



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 27 de Dezembro de 2014

domingo, 31 de agosto de 2014

O trapezista dos silêncios...


Esta casa que não cessa de chorar,
estas janelas com bocas de inferno e línguas de fogo...
para me atormentarem,
me enganam,
me sufocam,
alimentam-me as mãos depois do jantar,
e me tocam,
saciando a sede do rochedo sobre o telhado da saudade,
salpicando de sangue o meu corpo de pano...
esta casa que vi enlouquecer,
onde cresci,
onde morri... morri de sofrer,

Esta casa de engano,
estes livros mortos, cansados de viver,
esta casa com paredes de vidro e tecto de colmo...
o circo,
o circo regressa à minha terra,
eu, o palhaço das palavras,
o trapezista dos silêncios...
o que tem esta casa?
que me acorrenta ao soalho emagrecido pelo veneno do sofrimento,
esta casa... esta casa não existe, e eu, o palhaço das palavras...
olho esta casa de frestas e donzelas e crucifixos falsificados,
que o circo transporta nos finados...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 31 de Agosto de 2014

domingo, 4 de maio de 2014

casa da paixão


esta casa sem mãos
esta casa com paredes de papel
esta casa sem janelas
porta de entrada
sem música
ou... palavras,

esta casa disfarçada de corpo
o teu corpo vestido de granito
esta casa
este grito,

esta casa sem amor
nem luz
nem... nem flores
esta casa vadia
escondida nas árvores do quintal imaginário
coitada desta casa apaixonada
que sofre
que vive...
esta casa
uma casa embrulhada em poesia
esta casa sem paixão...
esta casa... uma casa sem coração.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 4 de Maio de 2014

terça-feira, 4 de março de 2014

A casa sou eu

foto de: A&M ART and Photos

Uma casa,
pensava que o teu corpo se ausentava das tardes de Primavera,
uma casa em ruínas cansada das ruas sem saída,
uma casa em solidão, uma casa acorrentada a esqueletos de insónia,
uma casa em desejo, que o desejo se perdeu...
pensa eu,
uma casa só, triste, uma casa que se entranhava nas frestas da madrugada,
uma casa de sorriso cor-de-rosa com flores de papel,
e mesmo assim, tínhamos uma varanda com acesso às estrelas,
sentávamos-nos sobre a mesa granítica da paixão...
e sonhávamos... e, e dormíamos pensava eu,
(pensava que o teu corpo se ausentava das tardes de Primavera),

E esta casa sou eu,
um corpo flutuante no Oceano do sofrimento, pinto nos teus olhos... pinto a dor,
e desenho no teu corpo, um outro corpo, um corpo com fatias de xisto para te encobrir as pálpebras dos nocturnos sótãos como melódicas sandálias de prata,
uma casa em forma de homem, uma casa, eu,
pensava,
acreditava que a cidade era linda quando acordava a noite,
descia a calçada, corria em direcção a Cais do Sodré, e via o meu corpo, o meu corpo em formato de casa, desabitada, límpida... com braços entrelaçados no luar,
com corredores mais longos do que a própria morte,
uma casa, esta casa, a casa que sobejou da tempestade,
sentada,
à mesa dispersa nos confinados corações de espuma...
a casa que o meu corpo construiu nas ardósia manhãs que o Inverno levou...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 4 de Março de 2014